A história de Porto Alegre com o skate tem mais de meio século. O esporte começou a ser praticado de maneira amadora nas ruas e lombas da cidade. No início dos anos 1970, por exemplo, sequer existiam pistas ou equipamentos à disposição dos skatistas. Nos primórdios, inclusive havia por aqui uma relação direta dessa modalidade com o surfe.
O engenheiro civil Marco Antônio Saraiva Collares Machado, 68 anos, recorda bem dos primeiros passos do skate na Capital. Ele vive desde 1981 em Torres, no Litoral Norte, e mantém relação afetiva com a pista do Parque Marinha do Brasil, inaugurada em dezembro de 1978.
— Na época, o pessoal que morava e estudava em Porto Alegre surfava nas praias. Quando voltava para a cidade dava vontade de dar continuidade através do skate. Mas não existiam lojinhas, então a gente pegava patins, tirava as rodinhas e pregava em uma madeira — relata, dizendo que o tio José Luiz Collares Machado participou da criação da pista do Marinha.
Eram tempos pioneiros. Ladeiras e locais como o Beco do Salso, na parte alta da Avenida Cristiano Fischer, viravam pontos de encontro para os praticantes. Em bandos, jovens desafiavam as leis da gravidade e desciam em cima dos skates adaptados em alta velocidade. Era tudo emoção, vento no rosto e inúmeros acidentes com fraturas.
Em 1979, foi realizado o 1° Campeonato de Skate Minuano Limão de Porto Alegre. A disputa ocorreu exatamente na lomba do Beco do Salso com duas provas, sendo que uma delas (a de slalom) era desviando de cones no asfalto. O torneio também teve parte disputada no Parque da Redenção, inclusive com uma das provas sendo de estilo livre (freestyle), hoje chamada street.
Além de ter um familiar envolvido na construção da primeira pista de Porto Alegre, Marco Antônio Saraiva Collares Machado, que fraturou duas vezes o perônio no período em que praticava o esporte, chegou a desenvolver seu trabalho de conclusão de curso sobre pistas de skate. No mesmo ano de 1979, foi um dos fundadores da Federação Gaúcha de Surfe e Skate.
— Nossa ideia era fazer o surfe organizado na praia e o skate na cidade. Para desenvolver um esporte é preciso das competições — acredita.
Questionado sobre o que contribuiu para tornar Porto Alegre a capital do skate no RS, Machado compartilha sentimentos pessoais.
— Eu descrevo isso como o prazer de deslizar em um skate. É se sentir livre e desenvolver as manobras — diz o ex-skatista.
Na época, o pessoal que morava e estudava em Porto Alegre surfava nas praias. Quando voltava para a cidade dava vontade de dar continuidade através do skate. Mas não existiam lojinhas, então a gente pegava patins, tirava as rodinhas e pregava em uma madeira.
MARCO ANTÔNIO SARAIVA COLLARES MACHADO
Ex-skatista
Dessa maneira, a pista do Marinha auxiliou na popularização do esporte em Porto Alegre. A Praça da Matriz, no Centro Histórico, foi o local escolhido para a prática durante os anos 1990. Em 2001, surgiu a pista de skate da Praça do IAPI, na Zona Norte. Aos poucos, a própria sociedade começou a deixar de lado o preconceito em relação aos skatistas. Eram os novos tempos.
Atualmente, locais como a Praça México e a Praça da Matriz são muito utilizados para a prática. Há espaços até na Restinga, mas a quebra de paradigma ocorreu com a criação da maior pista da América Latina, situada no trecho 3 da Orla. Ela possui cinco formatos diferentes em 6,2 mil metros quadrados e reúne milhares de praticantes aos finais de semana.
Aos 41 anos, o skatista Cezar Simonetto Dal Pozzolo, conhecido como Cezar Gordo, representa o presente da modalidade na Capital. Ele começou a andar de skate com sete anos de idade nas ruas do bairro Bom Fim. No ano 2000, profissionalizou-se. Foi campeão brasileiro do esporte e participou do processo de construção da pista do IAPI.
Conforme o skatista, não havia pistas no passado, mas os esportistas adaptavam espaços como quadras de futebol para a prática. E os obstáculos eram construídos pelos próprios praticantes.
— O que fez o esporte se difundir foi a criação da pista do IAPI. E também os picos de skate espalhados pela cidade — menciona Cezar Gordo, que também atua como empreendedor no meio.
Para o artista visual Rodrigo Guerra Nallem, 49, integrante da Associação dos Skatistas do Parque Marinha do Brasil (Skama), a semente foi plantada com a implementação da pista do próprio Marinha. Segundo diz, a capital gaúcha sempre foi um expoente de skatistas.
— Tudo o que acontece hoje foi muito batalhado principalmente na década de 1990. Foi a época onde menos se tinha dinheiro e mais se tinha amor pelo skate — afirma, dizendo que não chama o skate de esporte, mas sim de cultura.
Tudo o que acontece hoje foi muito batalhado principalmente na década de 1990. Foi a época onde menos se tinha dinheiro e mais se tinha amor pelo skate.
RODRIGO GUERRA NALLEM
Skatista
Além da pista do Marinha e da resistência dos anos 1990, outro ponto que destaca foi a inclusão do skate na Olimpíada de Tóquio em 2021. Algo inimaginável de acontecer há algumas décadas, quando o esporte sofria preconceitos.
— Muito mais as Olimpíadas precisam do skate e do surfe, do que propriamente o skate precisa dos Jogos Olímpicos. Sempre teve skate na rua ou em qualquer outro lugar — reflete.
O presidente da Federação Gaúcha de Skate (FGSKT), Régis Lannig, 44, cita que a cidade sempre foi uma referência nacional e até mundial por lançar grandes talentos, como Luan de Oliveira.
— A construção de espaços públicos para a prática de skate é um grande fator para o aumento no número de adeptos. Sem dúvida nenhuma, nos últimos três anos, a pista da Orla vem contribuindo bastante — avalia, estimando em mais de 20 mil o número de praticantes na Capital.
Confirmando a vocação como capital do skate no RS, Porto Alegre deverá sediar a etapa de Porto Alegre do STU National 2024, que ocorre desta sexta-feira (12) até domingo (14), exatamente na pista da Orla. Porém, a organização ainda avalia a situação e pode haver alguma alteração na programação em função das condições climáticas.