Os reiterados pedidos do prefeito Sebastião Melo para que a CEEE Equatorial instale geradores de energia em estações de bombeamento do Departamento Municipal de Água e Esgoto (Dmae) em momentos de crise não têm previsão regulatória nem contratual. A informação é da Agência Estadual de Regulação dos Serviços Públicos Delegados do Rio Grande do Sul (Agergs), instituição autônoma que fiscaliza a atuação e o cumprimento contratual da CEEE Equatorial.
Além de afirmar que a atribuição de instalar geradores inexiste, a Agergs destacou que, tratando-se de serviços essenciais, é recomendável que cada órgão público avalie providenciar os seus equipamentos de geração de energia para manter os serviços operantes em momentos de desabastecimento elétrico.
Melo tem afirmado que a iniciativa seria uma solução para os períodos de queda de luz prolongada, sobretudo após temporais, como ocorreu na última terça-feira (2). Quando o fornecimento da CEEE Equatorial é interrompido em regiões das casas de bombas do Dmae, a água tratada deixa de ser impulsionada para os imóveis da cidade.
Por consequência, ficam desabastecidos principalmente os bairros mais altos da Capital. As estruturas do município que fazem a drenagem das vias públicas também ficam sem puxar a água da chuva, o que contribui com alagamentos.
“Não há na regulação ou no contrato de concessão a obrigatoriedade de as concessionárias de energia elétrica atenderem a qualquer unidade consumidora com dispositivos geradores de energia, seja ela de serviço essencial ou não. Não havendo previsão regulatória ou contratual, recomenda-se que o usuário avalie, visto sua necessidade e importância do serviço, a utilização de grupos geradores como forma e abastecimento de energia elétrica em situações de falta da concessionária”, afirma a Agergs, em nota.
A Aneel diz que é obrigação da concessionária prestar o serviço adequado, mas reforça: "Sobre o relacionamento das distribuidoras com os órgãos que prestam serviços essenciais, não existem dispositivos contratuais que tratem dessas questões. A atribuição de contratar e instalar geradores de energia fica a cargo do consumidor ".
Exemplo de serviço essencial que dispõe de estrutura para se manter operante durante interrupções no fornecimento da CEEE Equatorial é o Grupo Hospitalar Conceição (GHC). A rede de saúde tem 19 geradores próprios, todos movidos a diesel. Eles têm capacidade para manter em funcionamento os equipamentos das áreas vitais dos hospitais do GHC, como os blocos cirúrgicos, emergências e UTI. A autonomia varia entre 14 horas e 46 horas. Já o Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA) dispõe de 17 geradores de emergência, todos próprios, com capacidade para cobrir "100% das áreas críticas por tempo indeterminado". Eles são reabastecidos conforme a necessidade, informa o HCPA.
Dmae vai alugar equipamentos por três meses
O diretor-geral do Dmae, Maurício Loss, reconheceu que não é atribuição legal das concessionárias de energia instalar geradores. Para o período de verão, com o objetivo de não repetir a falta d'água concomitante à de luz, Loss afirmou que será feita a contratação por 90 dias de seis geradores e três transformadores. O custo será de R$ 2,1 milhões. As estruturas serão instaladas na Estação de Tratamento de Água (ETA) Belém Novo, onde ficam três equipamentos fundamentais: um de captação de água no Guaíba e tratamento e dois sistemas de bombeamento (Boa Vista e Restinga).
Loss descartou a hipótese de o Dmae ter essas estruturas de forma permanente, seja via locação ou aquisição em definitivo. Para justificar isso, recorreu à grandiosidade do aparato: somente as estações de bombeamento de águas pluviais (EBAPs), que escoam a água da chuva, somam 23 instalações. E mais 87 estações de bombeamento de água tratada (EBATs).
— Queremos mostrar a complexidade que é tocar a indústria Dmae. A população nos cobra por não termos geradores. Estamos falando de locar para uma ETA (Belém Novo), mas existem mais cinco em Porto Alegre. Temos motores imensos, de 10 metros quadrados. Seria uma babilônia de dinheiro e maquinário para usar uma ou duas vezes por ano. O gerador precisaria de manutenção, ligar uma vez por semana, trocar o óleo diesel. Acaba se tornando tecnicamente e financeiramente inviável. Teria de ser repassado para a conta do consumidor e oneraria demais — argumentou Loss.
Ele avalia que o melhor caminho será buscar junto à CEEE Equatorial a instalação das linhas de transmissão de energia de mão dupla em todas as unidades. Com isso, quando uma cai, a outra pode ser acionada para a retomada do abastecimento. Obras de adaptação são necessárias para concretizar a medida. Além disso, a intenção é discutir com a concessionária um atendimento mais célere às demandas, com a avaliação do destacamento de equipes de dedicação exclusiva ao Dmae nas emergências.
Penalização
A Agergs informou que, para os períodos de queda de abastecimento de energia, a regulação feita pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) define limites para a interrupção do serviço para cada unidade consumidora.
A Agergs diz que, em Porto Alegre, nas áreas urbanas, os limitadores de ocasiões “ficam em torno de três interrupções por mês”. Existe também um máximo temporal para a queda do serviço, que varia de quatro a sete horas no mês, somando todas as ocorrências do período.
A concessionária tem o dever de “compensar o consumidor” caso viole um dos dois referenciais. A compensação deve ser abatida na fatura, no segundo mês após a apuração das interrupções.
“Nos últimos 12 meses, a CEEE-D (Equatorial) gastou mais de R$ 8,2 milhões em compensações aos consumidores de Porto Alegre”, informou a Agergs.
Em entrevista ao programa Gaúcha Atualidade, da Rádio Gaúcha, a presidente da Agergs, Luciana Luso de Carvalho, afirmou que nos últimos dois anos a agência aplicou multas no valor de R$ 51 milhões à CEEE Equatorial. Esse montante foi contestado na Aneel e ainda não foi pago.
— Nosso papel em relação à energia consiste na fiscalização da prestação de serviço adequada ao usuário. Atualmente, estamos intensificando nossas atividades de fiscalização e realizando reuniões regulares com a CEEE Equatorial para avaliar os avanços na qualidade do serviço. No entanto, a Agergs constatou que as melhorias implementadas até o momento não são consideradas suficientes — declarou Luciana.
Agergs cobra ação mais ágil
A Agergs, ao receber reclamações de usuários e de órgãos públicos sobre a atuação da CEEE Equatorial na retomada do abastecimento, chamou a direção da concessionária para reunião na quinta-feira (4). Foi recomendado que a empresa adote providências quanto a podas de galhos próximas da rede, substituição de postes e busque dar atenção de forma mais ágil ao Dmae.
“A Agergs cobrou da distribuidora um posicionamento sobre as interrupções ocorridas na virada do ano no Litoral Norte e o atendimento ao Dmae. Na reunião, também foi tratada a atenção que a distribuidora deve dar aos eventos climáticos. A Agergs ressaltou a necessidade de manutenção da vegetação sob as redes, a fim de evitar toque nos fios e desligamentos, visto que foi ponto de fragilidade destacado no relatório de fiscalização emitido pela agência à CEEE (Equatorial) em dezembro de 2023. Também foram abordadas as condições de muitos postes de madeira em situação precária, vistos na inspeção de campo em todos os municípios visitados. Na inspeção (realizada desde dezembro), foram avaliadas redes em 51 municípios da área de concessão da CEEE (Equatorial), sendo 29 na região sul e outros 22 municípios na região metropolitana e litoral norte”, afirmou, em nota, a Agergs.
A agência ainda destacou que, dado o caráter de serviço essencial de fornecimento de água, “seria importante” a concessionária atender o Dmae com mais de um alimentador de energia, o que agilizaria as manobras para a retomada do serviço.