Após registrar queda brusca em 2020 e tímida melhora em 2021, período que coincide com o momento mais grave da pandemia de covid-19 no Brasil, o movimento de passageiros no Aeroporto Internacional Salgado Filho teve crescimento de 37% em 2022 em relação ao ano anterior. Por um lado, o número é um sinal de recuperação e otimismo para o setor, impulsionado especialmente pelo turismo.
Do outro lado, no entanto, o número de passageiros no Salgado Filho ainda está 20,6% abaixo do nível pré-pandemia.
Em 2018, primeiro ano de concessão da empresa alemã Fraport, 8,29 milhões de passageiros passaram pelo aeroporto da Capital. Em 2019, o fluxo se manteve praticamente estável, com 8,31 milhões de viajantes.
Já em 2020, o movimento no terminal despencou para 3,4 milhões de passageiros. Para se ter dimensão do impacto, em abril daquele ano, logo após a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarar a pandemia, apenas 29.228 pessoas viajaram de avião pelo Salgado Filho.
A reação do setor começou a despontar em 2021, quando 4,8 milhões de pessoas usaram o Salgado Filho para viajar. Finalmente, em 2022, o montante chegou a 6,6 milhões de passageiros.
— Esse movimento é de praticamente todos os aeroportos brasileiros, por duas razões. A primeira é a mudança de hábito. A aviação de dias úteis era muito baseada nas viagens de negócios, e isso perdeu efeito com as novas tecnologias e novos hábitos, com as reuniões online mais frequentes. O segundo fator é que, desde 2021, temos uma pressão muito forte sobre o preço dos combustíveis, que está sendo transferido para as passagens — analisa o economista e professor Gustavo de Moraes, da Escola de Negócios da PUCRS.
Segundo o especialista, a situação é mais grave para as empresas aéreas, que operam com prejuízo, do que para as concessionárias de aeroportos, que têm contratos com o governo federal, como a Fraport.
A redução do número de passageiros se reflete na redução da oferta de voos no Salgado Filho. Em 2019, o terminal recebeu 77.709 chegadas e partidas domésticas e internacionais. Já em 2022, foram 66.402 chegadas e partidas. A redução é de 14,5%.
Apesar disso, do ponto de vista das concessionárias de aeroportos, o economista da PUCRS observa que a redução de passageiros pode ter sido compensada pelo transporte de cargas, que se manteve em alta durante a pandemia:
— As concessionárias de aeroportos acabaram sendo aliviadas com o transporte de cargas. Isso já tinha sido verificado na pandemia, praticamente houve uma troca de passageiros por cargas.
Compensação
Alegando prejuízos causados pela pandemia, a Fraport solicitou e obteve um reequilíbrio contratual que totalizou R$ 323,58 milhões para os anos de 2020, 2021 e 2022. Nos três casos, o reequilíbrio foi autorizado pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac).
Em 2020, a indenização foi de R$ 119,4 milhões, por meio da compensação das outorgas fixa e variáveis, mais o reajuste tarifário de 15%. Em 2021, o reequilíbrio foi calculado em R$ 118,1 milhões, via compensação das outorgas fixa e variáveis. E, em 2022, o valor ficou em R$ 86 milhões, por meio da compensação das outorgas fixa e variáveis, mais o reajuste de 10% para taxas de embarque e conexão.
Em nota, a Fraport informou que está analisando se irá pedir recomposição financeira também neste ano. A concessionária afirma que a expectativa é atingir entre 2023 e 2024 os índices de movimentação de passageiros pré-pandemia. A empresa alemã ressalta que "as obras previstas em contrato de concessão já foram entregues, inclusive, antes do prazo".
Demanda
O economista Gustavo de Moraes afirma que a retomada plena dos voos para o nível pré-pandemia depende da recuperação econômica do Brasil. Para 2023 e 2024, as perspectivas econômicas “não são boas”, ressalta o professor.
Se o cenário não é animador, existe, do outro lado, a percepção de que a melhora da economia serviria como estímulo ao turismo, aumentando a demanda por viagens de avião. Além disso, há regiões do país ligadas ao agronegócio, como o Centro-Oeste, que demonstram ascensão econômica e devem demandar cada vez mais voos.
Uma das possíveis soluções apontadas pelo economista para impulsionar o setor é reduzir o ICMS especificamente para o querosene de aviação, combustível utilizado pelos aviões. A diminuição do tributo, entretanto, dependeria de uma avaliação política e econômica dos governos estaduais, que teriam de abrir mão de receita para adotar a medida.
O economista cita o exemplo de São Paulo, onde o governador Tarcísio de Freitas reduziu a alíquota do imposto estadual para o querosene de aviação de 13,3% para 12%.
— Esse custo pode ser tratado através da redução de impostos para o setor, que consome um combustível específico. Isso poderia aliviar a planilha de custo das empresas. Mas não traz perspectiva de redução do preço das passagens — explica o professor.
Sobre a ideia aventada pelo ministro de Portos e Aeroportos, Márcio França, de lançar um programa federal com passagens a R$ 200 como forma de incentivar o setor, o economista opina que a medida até beneficiaria a aviação, mas tornaria o governo alvo de pressão para conceder igual benefício a outros segmentos da economia.
— Ao final, se constituiria como transferência de subsídio. Se esse setor receber esse tipo de subsídio, talvez o governo não tenha caixa para socorrer outros setores. É uma proposta bastante delicada. Precisamos encontrar novas soluções.
Por enquanto, não se sabe quando o governo federal irá lançar o programa "Voa Brasil". Em março, o ministro da Casa Civil, Rui Costa, declarou que a ideia é de "refinar" e fazer um "anúncio adequado" do projeto.