O bairro Rubem Berta, o mais populoso de Porto Alegre — com cerca de 87 mil habitantes, segundo o IBGE — completou 36 anos neste domingo (30) com uma festa que ocupou parte da avenida Adelino Ferreira Jardim.
A festa na zona norte teve início às 9h, com o café da manhã solidário entregue às pessoas em situação de rua. Até parte da noite, reunindo milhares de pessoas, o evento promoveu shows de mais de 20 nomes do bairro — de gêneros como rap, samba, pagode e gospel —, culminando com uma apresentação da escola de samba Imperatriz Dona Leopoldina.
Além dos shows, pela avenida eram realizados cortes de cabelo, oficinas de grafite, atendimentos de saúde, distribuição de livros, bancas de artesanato e comércio local, brechó solidário, brinquedos infláveis e, entre outras atrações, a distribuição de bolo à tarde. Pela manhã, houve até uma batalha de coreografias do TikTok entre as crianças.
Também foram lecionadas aulas de skate, com uma mini rampa montada na avenida. Aliás, era comum ver jovens circulando com skates ao redor do evento.
O tempo era favorável: um domingo ensolarado, com temperaturas que se aproximavam dos 30° C. Muitos moradores trouxeram sua cadeira de praia e se postaram à sombra para curtir a festa. Um clima de confraternização tomou conta da localidade.
Assistência jurídica
Realizada por líderes comunitários, entidades e centros culturais, a festa também promoveu assistência jurídica nas áreas trabalhista e civil — era possível, por exemplo, fazer o título de eleitor. Segundo Maria Clara Viegas, moradora do bairro e uma das organizadoras da festa, o evento visava não só garantir lazer e cultura, mas também direitos básicos aos moradores.
— Querendo ou não, certos direitos e acessos nos são negligenciados — diz Maria. — A gente tem que lutar pela autoconfiança da comunidade. Principalmente, pela vida da juventude, cuja maioria aqui é negra. Quando temos acesso a outras expectativas e oportunidades, mostramos que nem só de violência vive um bairro.
A violência é um problema costumeiramente mencionado entre os problemas do bairro, que se estendem em questões sociais e de infraestrutura. Para a educadora popular Catarina Machado, 44 anos — sendo 28 de Rubem Berta —, era um dia para comemorar tudo de bom que a comunidade tem, até para a população enfrentar o sistema violento.
Ela atua no Espaço Sociocultural Marlon e Marcelinho, que promove atividades de cultura e educação na comunidade. O nome do projeto homenageia dois adolescentes que foram vítimas da violência, sendo que Marcelinho era seu filho.
— O dia de hoje simboliza nossa força de existir e resistir na periferia, em lugar que tem poucos recursos — explica Catarina. — Não queremos olhar só para as coisas negativas, mas sim para o protagonismo dos nossos jovens, para a força da economia solidária e de nossa força comunitária.
Espírito de fraternidade
Jean Andrade, 40 anos, é o presidente da Alvo Cultural, associação que realiza projetos culturais por meio do hip hop e skate. Morador do Rubem Berta desde a infância, ele vê a festa como uma retomada na autoestima da comunidade.
— Para que as pessoas abracem e tenham um espírito de fraternidade no bairro. Com autoestima, o povo pode reivindicar as políticas públicas que faltam por aqui. Para que a comunidade se una para essas questões para cobrar os orgãos públicos — argumenta.
Maria Clara corrobora:
— É um momento de um dia, mas que para muita gente vai durar muito mais.
Um exemplo do otimismo que a festa propicia pode ser visto em Irlan Ferreira Gonçalves, 61 anos, mais conhecido como Guinho. Ele tem um bar na avenida há 17 anos, onde toca pagode e samba, além de charme dos anos 1980. Toda a função do bolo e de cantar parabéns para o Rubem Berta é gratificante para Guinho.
— Aquela palavra forte: gratidão. Hoje está bom, amanhã pode ser ruim, mas a gente não pode focar só no negativo. Amanhã pode ser sempre melhor. E se hoje está bom, amanhã pode ser melhor ainda — reflete.