Contrariados com a aprovação de um projeto que desobriga a instalação de portas giratórias em bancos de Porto Alegre, bancários e trabalhadores de instituições financeiras intensificaram, nas últimas semanas, a pressão sobre o prefeito Sebastião Melo (MDB) e a base governista na Câmara Municipal. Os sindicalistas argumentam que a mudança fragiliza a segurança dos trabalhadores e da população e pedem o veto ao projeto, que foi aprovado pelos vereadores em dezembro de 2022.
Melo tem prazo até o dia 20 de março para decidir sobre o texto e pode vetar, sancionar ou silenciar sobre o assunto. Neste último cenário, a proposta voltaria à Câmara para promulgação.
A desobrigação de portas giratórias é de autoria do vereador Ramiro Rosário (PSDB), aliado de Melo. O texto modifica uma lei municipal de 1994, que impôs a existência de "porta eletrônica de segurança individualizada" nas agências da Capital.
Rosário ressalta que a proposta desobriga as portas giratórias somente para as agências em que não existe movimento e manuseio de dinheiro em espécie e nos espaços de autoatendimento (caixas eletrônicos), o que exclui as unidades bancárias mais tradicionais.
— As agências que têm cofres continuarão tendo as portas giratórias — assegura o vereador.
Rosário argumenta que o projeto é uma forma de desburocratizar a abertura de novas agências focadas no relacionamento com os clientes, que não lidam diretamente com dinheiro físico. O vereador tucano diz que a instalação de portas giratórias "envolve custo" para os empreendedores, e considera que o mecanismo de controle de entrada de clientes "não impede que o assalto aconteça".
— Hoje as instituições financeiras oferecem muito mais produtos no portfólio do que a guarda do dinheiro e poupança. Temos instituições com foco na parte imobiliária, compra e venda de ações, inclusive educação financeira — exemplifica Rosário.
Segundo o vereador, Melo sinalizou, em reunião com a base na última segunda-feira (27), a intenção de sancionar o projeto.
Divergência
Nas últimas semanas, o Sindicato dos Bancários de Porto Alegre e Região (SindBancários) e a Federação dos Trabalhadores e Trabalhadoras em Instituições Financeiras (Fetrafi-RS) estão com campanha nas ruas para pressionar os vereadores que votaram a favor do projeto a voltarem atrás. Durante um encontro com os sindicalistas, antes do Carnaval, Melo teria sinalizado que poderia vetar o texto, desde que houvesse um pedido de sua base neste sentido.
O SindBancários afirma que, da forma como foi aprovada, a proposta permite que as portas giratórias deixem de ser obrigatórias em todas as agências, inclusive naquelas que manuseiam dinheiro em espécie. O entendimento é baseado em trecho do projeto dizendo que "a obrigatoriedade não se aplica se houver plano de segurança aprovado pela Polícia Federal".
— A porta giratória não é exigida pela Polícia Federal. Hoje o que obriga as portas giratórias é a lei municipal. Essa retirada favorece o banqueiro, que vai ter redução de custo — afirma Priscila Aguirres, diretora do SindBancários e da Fetrafi-RS.
Nos últimos dias, os sindicalistas conversaram com os vereadores Alexandre Bobadra (PL), Mauro Pinheiro (PL), Márcio Bins Ely (PDT) e Mônica Leal (PP), da base de Melo, além de Karen Santos (PSOL), que é contra o projeto.
Mais debate
Titular da 1ª Delegacia de Polícia de Repressão a Roubos (1ªDR) do Departamento Estadual de Investigação Criminal (Deic), o delegado João Paulo de Abreu não aprova nem desaprova a manutenção da porta giratória, mas afirma que é necessário ampliar o debate sobre o tema.
— Os fatos mais recentes envolvendo roubos (mostram que) esse sistema de segurança não foi determinante para evitar que o (crime) ocorresse. Mas evitar um crime é a soma de vários fatores, sistema de segurança eletrônico e físico. É uma soma de mecanismos de segurança que sempre vão contribuir — pondera Abreu.
Nos últimos anos, a tendência no Rio Grande do Sul é de redução abrupta de roubos e furtos a bancos. Em 2022, o Estado teve o menor número de assaltos a instituições financeiras desde 2012, primeiro ano da série histórica.
No ano passado, conforme a Secretaria da Segurança Pública, foram 30 ataques a bancos no RS. O recuo chega a 89,54% na comparação com o recorde de 287 ataques, registrados em 2015.
Febraban diz que mudança favorece consumidor
Em nota enviada à reportagem, a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) avaliou que o projeto aprovado pela Câmara Municipal de Porto Alegre "está em coerência com mudanças já adotadas nas leis de vários municípios do país, em favor da comodidade do consumidor".
A Febraban pondera que, diferente do formato tradicional, as unidades de negócio são "um novo modelo de estabelecimento bancário caracterizado por não possuir o cofre, o caixa e tesouraria". Nestes locais, os clientes fazem investimentos, empréstimos e formalizam contratos, por exemplo.
A federação considera que a instalação de porta giratória "onde não há necessidade" acaba impactando no atendimento ao consumidor. A entidade que representa os bancos brasileiros diz ainda que, do ponto de vista da segurança, "existem equipamentos muito mais modernos" do que as portas giratórias.
Leia a nota na íntegra:
Atualmente, existem unidades bancárias de negócios que não se confundem com as tradicionais agências de atendimento. A unidade de negócio é um novo modelo de estabelecimento bancário caracterizado por não possuir o cofre, o caixa e tesouraria e trata-se de local aonde o cliente vai para fazer consultas de investimentos, empréstimos imobiliários e para micro e pequenas empresas, formalização de contratos, dentre outros. Desta maneira, se equipara a qualquer outro estabelecimento comercial aberto ao público.
A Lei Federal 7.102/83, que estabelece as normas de segurança para estabelecimentos financeiros, não prevê a obrigatoriedade de itens de segurança nas unidades de negócio, justamente por não possuírem guarda ou movimentação de numerário. Já nas agências tradicionais, os itens de segurança são definidos em um plano de segurança, aprovado pela Polícia Federal, o qual pode ou não trazer a instalação de portas de segurança, uma vez que se trata de item facultativo.
Instalar uma porta giratória onde não há necessidade terá impacto no atendimento ao consumidor, em especial para os portadores de marcapasso, pessoas com dificuldades de locomoção e os idosos. Além disso, em relação à segurança, existem equipamentos muito mais modernos, como monitoramento por sistemas de filmagem, alarmes e sensores.
A medida está em coerência com mudanças já adotadas nas leis de vários municípios do país, em favor da comodidade do consumidor. O pleito visa atender o novo perfil do cliente, que busca, e encontra, segurança, praticidade e rapidez nos meios eletrônicos dos bancos.
Cada vez mais os brasileiros vêm utilizando as agências bancárias como ponto de atendimento e fechamento de negócios, migrando as operações transacionais para os meios digitais, para sua conveniência. De acordo com a última edição da Pesquisa Febraban de Tecnologia Bancária, 70% de 119,5 bilhões de operações feitas no país ocorrem em meios digitais (internet banking e mobile banking). Apenas 3% são feitas em agências.