O sorriso fino e enigmático é o mesmo em toda a obra de Silvia Marcon, mas um fica embaixo de bigode, outro é realçado por batom vermelho e o mais recente é tapado por uma máscara cirúrgica.
Intervenção mais conhecida da artista urbana porto-alegrense, as Mona Lisas de mosaico se espalham por Porto Alegre desde 2014. O número exato nem ela sabe, mas deve passar de uma centena de versões exóticas afixadas em muros e paredes, feitas com pequenos fragmentos de azulejos, cerâmica, vidro e espelho.
Silvia é nascida e criada na Capital. Começou a desenvolver suas habilidades bem pequena, na escolinha de artes que existia nos fundos do Theatro São Pedro. A mãe era servidora pública estadual e fez o possível para incentivá-la desde os quatro anos de idade.
Chegou a fazer vestibular para Artes Plásticas, mas acabou se formando em Publicidade. Foi administradora e professora de escola de inglês, e fez cinco anos do curso de Arquitetura na Universidade Federal do RS (UFRGS), o que a aproximou do urbanismo. Especializou-se em mosaico em Milão e em Verona, na Itália, e passou a se dedicar exclusivamente à arte.
— Eu me encontrei no mosaico. E não estava mais conseguindo administrar esse trabalho de escritório, cansei do ambiente corporativo — relata.
Silvia teve sua primeira experiência de intervenção urbana no Bueiro com Arte, na Cidade Baixa. Como o próprio nome do projeto sugere, artistas e moradores convidados decoravam bueiros e bocas de lobo de Porto Alegre.
A ideia das Mona Lisas veio a seguir, quando foi convidada a ministrar uma oficina de mosaico urbano. Viu nas releituras da mais famosa tela de Leonardo da Vinci uma oportunidade para demonstrar a técnica, e os próprios alunos revelaram a pluralidade à que a obra se submetia.
— Vimos que se podia trabalhar com a diversidade, ter essa proposta de que todo mundo é igual, mas cada uma pode ser do seu jeito — recorda Silvia.
Surgiram daí Monas brancas, negras, verdes, azuis, loiras, morenas, ruivas, gatas, diabas e que abordam de religião à música — ao exemplo da Virgem Lisa na Avenida Osvaldo Aranha e da Mona Bowie na Salgado Filho. Um Mona Lisa trans de quatro metros por três (as originais têm 40x30cm) foi encaminhada ao Museu de Arte Contemporânea do RS (MACRS). E as obras não ficaram restritas a Porto Alegre. Também foram para Curitiba, Pelotas, Rio de Janeiro, São Paulo e até Paris e Buenos Aires.
Silvia fixa suas Monas na lateral de edifícios, prédios abandonados e lugares públicos. O próprio muro do Museu de Porto Alegre Joaquim Felizardo, por exemplo, acabou servindo de cavalete:
— Eu fiz ali por conta, ninguém me convidou e nunca nem sequer se falou sobre o assunto. Mas, pelo jeito, gostaram, porque está lá até hoje.
Mas Silvia está se mudando para São Paulo até o final do mês. Ela acredita que na capital paulista há mais oportunidades para o artista, mais valorização por parte de empresas e do poder público. Cita, como exemplo, o fato de ver da sua nova casa cinco laterais de prédio grafitadas, sendo que da sua janela, em Porto Alegre, não vê arte urbana alguma.
— Ainda temos uma cidade bem cinza — lamenta.