Depois de audiência pública realizada na quinta-feira (19), a prefeitura de Porto Alegre está trabalhando nos últimos ajustes do projeto de plano diretor exclusivo para o Centro Histórico, que será enviado para votação na Câmara de Vereadores. Uma das principais novidades propostas é o fim do limite de altura para prédios de algumas regiões do Centro, o que daria abertura para a construção de arranha-céus. Simulações apresentadas na transmissão online do debate demonstram a possibilidade de prédios de 30 metros a 200 metros.
O prédio mais alto de Porto Alegre tem quase a metade disso: o Edifício Santa Cruz, na Rua dos Andradas, possui 107 metros de altura e 34 pavimentos. As últimas revisões do Plano Diretor reduziram para 33 metros a altura máxima dos imóveis na região.
O secretário municipal do Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade, Germano Bremm, destaca que, mesmo sem altura máxima, será exigido que os empreendimentos atendam a critérios pré-definidos de insolação, iluminação, ventilação e paisagem, criando espécies de bacias visuais para respeitar o patrimônio cultural do Centro.
Ele sustenta que hoje existem softwares que permitem garantir a qualidade da habitabilidade, sem precisar engessar a legislação.
— O urbanismo foi evoluindo ao longo dos anos. O que lá atrás se imaginava como um padrão adequado para a população conviver, se fixava na legislação: determinado padrão de altura, recuo, entre outros. Hoje, a evolução tecnológica permite que se atenda a esses padrões de outra forma: questões de insolação, de ventilação, são mais possíveis de serem verificadas em outros formatos — explica, acrescentando:
— Assim, a gente inverte essa lógica de preestabelecer um padrão legal, de limite de altura, para trazer algo mais concreto de monitoramento e avaliação.
Segundo o secretário, vão ser criados gabaritos por quarteirões, e não é toda quadra que vai poder abrigar arranha-céus. Algumas simulações já foram feitas pela própria secretaria entre o Mercado Público e a região da rodoviária. O projeto prevê, ainda, a isenção do pagamento para construir além do limite já definido para cada terreno (valor da compra de solo criado) nos primeiros três anos nessa área, junto às avenidas Mauá, Júlio de Castilhos e Voluntários da Pátria.
— Quem caminha pelo Centro consegue identificar essa área com maior necessidade de reabitação. A gente fez essas simulações e identificou como a área mais adequada para essa transformação — diz Bremm.
O secretário nega que já exista em tramitação, hoje, algum projeto de empreendedor para viabilizar algum arranha-céu nessa região.
Objetivo é requalificar a região
O chamado Programa de Reabilitação do Centro Histórico tem como objetivo atrair novos investimentos da construção civil para requalificar a região. Com o potencial construtivo do Centro em zero hoje, seriam liberados 1,180 milhão de metros quadrados nesse mecanismo que determina quanto se pode construir em cada terreno.
Com o programa, o número de moradores no Centro poderá dobrar e passar dos atuais 45 mil para quase 90 mil. Questionado por GZH, Bremm garantiu que diagnósticos realizados pela prefeitura provam haver infraestrutura de água, esgoto e mobilidade para receber esse acréscimo de população. Com relação a esse último tópico, ele explica:
— Tu tendo um local onde tem comércio, serviço, moradia, consegue criar ciclo em que as pessoas residem perto de onde trabalham. Esse problema (da mobilidade) se resolve.
Para o presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil no Estado (IAB-RS), Rafael Passos, faltou apresentar estudos mais aprofundados para garantir que haja infraestrutura.
— A grande maioria das contrapartidas propostas não trata dos impactos estruturais que um adensamento desse tamanho vai gerar — diz.
— Nós não estamos diante de um programa, mas de um projeto de aumento da oferta de potencial construtivo. Se queremos estimular, se queremos que algumas áreas do Centro sejam de fato mais adensadas, precisamos utilizar instrumentos que já estão no Plano Diretor — acrescenta.
Ele é contra a retirada da altura máxima dos edifícios do Plano Diretor, que “pode gerar surpresas”, e teme que a medida possa reduzir as condições de habitabilidade (insolação, iluminação e ventilação), fazendo com que os moradores que resistiram no Centro acabem saindo — o contrário do que pretende a prefeitura.
Já Ricardo Ruschel, arquiteto e vice-presidente da Associação Brasileira dos Escritórios de Arquitetura (Asbea-RS), não vê problema em haver arranha-céus no centro de Porto Alegre:
— Pode ter eventualmente algum local, como a prefeitura deu de exemplo, perto da rodoviária, onde não tem nada muito perto, uma coisa mais icônica. Tipo o plano diretor em Barcelona, que tem altura máxima de edifícios, mas em dois pontos no porto há prédios superaltos.
Mas o que é mais importante nesse projeto, grifa ele, é uma qualificação do desenho urbano do Centro Histórico, especificamente na proposta em que o prédio mais alto do quarteirão passaria a delimitar a altura dos demais.
— Muitos quarteirões têm, hoje, prédios com altura muito superior ao que se permite (construídos antes do Plano Diretor). Existe a proposta de que quem quiser empreender possa compatibilizar essa altura, a volumetria, com a volumetria existente — explica.
Entenda o que está em debate:
- O Programa de Reabilitação do Centro Histórico pretende atrair novos investimentos da construção civil para requalificar a região.
- Não haverá mais limite de altura para as edificações, desde que atendidos os critérios de paisagem, habitabilidade (insolação, iluminação e ventilação) e sem comprometer o patrimônio cultural do Centro. Simulações feitas demonstram a possibilidade de prédios de 30 metros a 200 metros de altura.
- Serão liberados 1,180 milhão de metros quadrados em potencial construtivo (o quanto se pode construir em cada terreno). Hoje, o estoque de potencial construtivo no Centro é zero.
- O projeto prevê a isenção do pagamento para construir além do limite preestabelecido para cada terreno (valor da compra de solo criado) nos primeiros três anos, na área junto às avenidas Mauá, Júlio de Castilhos e Voluntários da Pátria.
- Há previsão de arrecadação de cerca de R$ 1,2 bilhão em recursos pela compra de solo criado (pagamento para construir além do preestabelecido no terreno).
- Os recursos pela compra do solo criado poderão ser transformados em contrapartidas para melhorar praças e espaços públicos no Centro.
- Quem investir no Centro Histórico poderá ter direito a comprar potencial construtivo em regiões mais valorizadas, onde não há mais estoque de potencial construtivo.
- Para participar do programa, é preciso atender a pelo menos quatro das seguintes condicionantes:
Qualificação do passeio na frente do imóvel;
Qualificação das fachadas com frente para a via pública;
Adoção do uso misto (residencial e não residencial);
Atendimento da demanda habitacional prioritária;
Ações sustentáveis em edificações;
Requalificação ou restauração do patrimônio histórico;
Utilização de cobertura verde tipo rooftop, com priorização de acesso público;
Ações em segurança pública nas edificações.