A Veppo Cia Limitada, empresa responsável pela gestão da rodoviária de Porto Alegre, é alvo de inquérito civil do Ministério Público do Trabalho (MPT) por atraso no pagamento de salário dos empregados. O problema se soma a outras pendências da empresa com o Daer.
A apuração ocorre no momento em que o governo estadual, poder regulador das rodoviárias gaúchas, prepara o lançamento, no final de abril, do edital que irá escolher o novo gestor do terminal de Porto Alegre pelos próximos 25 anos.
A investigação sobre “atraso ou não ocorrência do pagamento” de salários foi instaurada pelo MPT em 21 de setembro de 2020. A procuradora responsável, Patrícia de Mello Sanfelici Fleischmann, informou que foi expedida notificação à empresa para que se manifeste. Ela afirmou que a intenção é dar “a maior agilidade possível ao inquérito”, mas ponderou que qualquer medida deve ser precedida de comprovações de eventuais irregularidades. Acrescentou, por fim, que não iria comentar detalhes da apuração.
A Veppo confirmou que há atrasos, mas assegurou que são pontuais e objeto de esforços da empresa para breves acertos. Os salários de fevereiro estão todos quitados, mas uma parte da folha, dos funcionários de remuneração mais elevada, terminou de ser paga no início de abril, o que chegou a causar cerca de 30 dias de pendência. Agora, os contracheques de março estão em atraso de alguns dias, considerando que o quinto dia útil do mês seguinte, limite para o pagamento da folha, foi alcançado no último 8 de abril.
Os cerca de 200 empregados da Veppo, em geral, atuam em setores administrativos e técnicos da rodoviária, como venda de passagens, tesouraria e setores de manutenção, entre outros.
— A empresa teve grande preocupação desde o início em manter os empregos, apesar da queda extraordinária de 85% do número de passageiros de um dia para o outro, em função da pandemia — pondera Giovanni Luigi, diretor de Operações da Veppo.
Ele destaca que a redução brusca verificada a partir de março de 2020 incidiu em uma base de clientes que já vinha em decadência “há mais de 10 anos”. As perdas nas rodoviárias são atribuídas a fatores diversos, incluindo a mudança de perfil na sociedade, que está viajando mais de carro particular e de avião. Mais recentemente, também surgiu a concorrência de setores não regulamentados que fazem viagens informais, como o BlaBlaCar e o Buser.
Além da questão salarial, o recolhimento de FGTS dos trabalhadores da Veppo estaria sem ser realizado desde meados de 2020.
— A seu tempo, dentro dos programas que o governo federal tem, a empresa garantirá os direitos dos trabalhadores. A grande prioridade é manter empregos e salários — afirmou Luigi.
Em um acordo coletivo firmado entre a Veppo e o Sindicato dos Trabalhadores Rodoviários Intermunicipais, Interestaduais, Turismo e Fretamento do RS (Sindirodosul), foram estabelecidas condições para a redução de jornada e de salário dos funcionários, suspensão temporária de contratos de trabalho (lay off) e condições diferenciadas para as rescisões, com possibilidade de parcelamento das indenizações em cinco vezes, a primeira delas vencendo em “até 40 dias da data de demissão”.
Neste acordo, assinado em março de 2021, é citado que os deslocamentos e a arrecadação sofreram queda de 70%. Na pandemia, o setor teve de se adaptar a restrições e normas de distanciamento social. Uma delas foi a venda de bilhetes de viagem somente para as poltronas ao lado da janela.
As informações são mais escassas sobre um segundo inquérito civil do MPT cujo objetivo é apurar eventual inobservância de normas para evitar propagação do coronavírus. A investigação foi instaurada em 6 de abril de 2021 e está em fase inicial. Procurador do caso, Rogério Uzun diz que nenhuma outra informação pode ser prestada no momento.
— Somos considerados exemplares no controle. Poucos meses atrás, estiveram aqui representantes do Daer, do Ministério Público e de outros órgãos. Eles caminharam por toda a rodoviária, fizeram um relatório e não apontaram nenhuma questão que estivéssemos descumprindo. Desconheço totalmente essa questão (inquérito do MPT), não fomos informados — diz Luigi.
A reportagem contatou, por telefone e mensagens, o presidente do Sindirodosul, Irineu Miritz Silva, mas não houve retorno até o fechamento desta reportagem.
Pendências no Daer
A Veppo Cia Limitada detém dois contratos com o Departamento Autônomo de Estradas de Rodagem (Daer), órgão que representa o governo estadual na concessão dos serviços de terminais rodoviários.
Um dos termos refere-se à administração do imóvel da rodoviária, que é propriedade do Estado, afirmou o Daer, em nota. Neste item, o departamento informa que a Veppo soma dívida de aluguel, de abril de 2019 a fevereiro de 2020, de aproximadamente R$ 2,5 milhões. Hoje, em razão da pandemia, a cobrança de locação está suspensa.
O outro contrato entre Veppo e Daer versa sobre a prestação de serviços rodoviários, com previsão de recolhimento de taxas de manutenção de fiscalização. O Daer diz que há atraso nos pagamentos desde 2019, alcançando pendência de cerca de R$ 4 milhões. Neste caso, o departamento disse que a Veppo está em processo de inscrição em dívida ativa.
— Existem pendências nossas, e existem pendências do Daer também. Se fizermos um encontro de contas, o valor (da dívida) é menor do que esse porque a a empresa tem créditos — assegura Giovanni Luigi, diretor de Operações da Veppo.
Os citados "créditos" teriam origem nas cotas condominiais das lojas da rodoviária que estão desocupadas, cujos valores não foram recolhidos pelo proprietário do imóvel, o Estado.
Nova concessão
O governo estadual anunciou nesta segunda-feira (12) que o edital de concessão da rodoviária de Porto Alegre será lançado até o final de abril. Depois de publicado, o planejamento indica que o leilão será realizado em prazo de 90 dias, na Central de Licitações do Estado (Celic). Vencerá quem oferecer ao Estado o maior pagamento de outorga para assumir o terminal.
— O valor mínimo de outorga é baixo, quase simbólico (R$ 868,8 mil). Nosso interesse não é arrecadar, mas atrair o maior número de interessados que possam atender aos investimentos. Todos que transitam na rodoviária têm noção de que é preciso melhorar —diz Leonardo Busatto, secretário de Parcerias Estratégicas.
O novo gestor irá atuar no terminal por 25 anos, tendo a obrigação de investir R$ 77,8 milhões na qualificação e modernização da estrutura e mais R$ 10 milhões no entorno, em intervenções de drenagem, mobilidade, segurança, acesso ao trensurb e cobertura na área de embarque dos táxis.
Caso seja concretizada com a assinatura de novo contrato, a licitação irá regularizar a situação da rodoviária, já que a atual concessão é “precária”. Busatto informou que não há óbice para que a própria Veppo participe da concorrência.
— Achamos inoportuna a licitação agora. Vai ser feita em cima de quais dados? Como projetar o equilíbrio econômico-financeiro, o fluxo de caixa e uma série de outros itens? Projetar isso com quais números de passageiros? No entanto, se a licitação vier a ocorrer, iremos participar — diz Giovanni Luigi, diretor de Operações da Veppo.