Ronaldo Ventura Machado, 52 anos, transborda energia. O jardineiro chega cedo ao Hospital São Lucas da PUCRS e, antes das 7h, inicia a saga de distribuir “bom dia” a colegas e visitantes do complexo localizado na zona leste de Porto Alegre. Com a chegada da pandemia, notou uma receptividade menos calorosa, reflexo da angústia diante do aumento nos casos de coronavírus.
Inquieto, decidiu contribuir no combate à covid-19 pelas ferramentas que lhe são possíveis: preparou o solo de um canteiro em frente à entrada principal do hospital, e hoje mostra, com orgulho, girassóis com quase dois metros de altura.
— É uma energia positiva para este momento tão difícil. Pensei no girassol porque ele simboliza a vida. E a gente lida com vidas aqui — explica.
O espaço começou a ser gerido pelo jardineiro há pouco mais de 50 dias. No período, regou a terra, dispondo as sementes com o distanciamento para colorir toda a área ao lado da rampa e dos degraus de acesso. Em sua maioria de poucas flores, as árvores no entorno do prédio mantêm um verde uniforme, quebrado pelo amarelo dos girassóis.
Orgulhoso por fazer parte da equipe há três anos, Ronaldo se emociona ao afirmar que, quando chega ao trabalho, deixa pra trás qualquer frustração. Morador de Esteio, na Região Metropolitana, percorre no trem o caminho até a Capital diariamente, com um bom humor fora do comum, segundo os colegas.
— Ele é uma pessoa muito especial para todo mundo. Deixa o dia da gente mais feliz. Plantar os girassóis é a forma que ele encontrou de dar bom dia para as pessoas com quem não consegue se comunicar — afirma Danusa Malta, coordenadora de hotelaria do hospital.
O jardineiro reafirma o que foi dito pela gestora, e complementa a tese sobre o impacto de uma saudação diária afetuosa.
— Sempre, sempre mesmo, procuro dar bom dia. Mas bom dia não tem nada a ver com o tempo, se está chovendo, se tem vento. Pode estar um temporal lá fora, mas se tu disser que o dia vai ser bom, vai ser bom, é o pensamento positivo — diz.
Enquanto aguardava atendimento, Idianês Hoffmann Leal, 52 anos, observava as flores. Sentada em um dos bancos do pátio, parece ter ouvido Ronaldo explicar sua motivação, de levar mais energia às pessoas. E elogia a iniciativa:
— Fantástica a ideia. O girassol é o símbolo da energia, ele sempre busca a luz. E em frente ao hospital, assim, ficou muito bacana.
Na manhã desta terça-feira (16), Ronaldo foi entrevistado no programa Gaúcha Hoje, da Rádio Gaúcha. Se disse feliz por ser o porta-voz de notícias boas, “em meio a tanta notícia ruim”. Além de agradecer a liberdade de poder inovar no paisagismo da instituição, lembrou do trabalho dos profissionais da saúde “no mundo inteiro”. Não esqueceu, contudo, do quadro que atua a seu lado, homenageados em sua intervenção.
— Da direção ao pessoal da limpeza, técnicos e enfermeiros, médicos, o administrativo, meus gestores, e os pacientes... Plantei pra todos. É para todos. Pode vir aqui que vai sair com uma energia positiva — garante.
Técnica em enfermagem no hospital, Jeane Marques, 54 anos, desviou o caminho para fazer uma foto em frente aos girassóis. Claramente desgastada com a rotina intensa de cuidados, viu nas flores amarelas, esperança.
— Esperança e vida. Para todos nós, para familiares, pacientes, colegas. O amarelo representa o sol, essa energia é muito boa — conclui a profissional de saúde.
Por um momento, Ronaldo some da visão de quem observa o seu jardim. Aparece correndo com uma mangueira nas mãos e não deixa uma das plantas sequer sem água. Observa o sol que expande as pétalas e finaliza com uma metáfora que tem tudo a ver com seu dia a dia:
— Se plantar uma semente boa, vai colher frutos bons. É o que eu fiz aqui.
Ouça a entrevista ao Gaúcha Hoje