No prefácio do livro que inspirou o publicitário Leo Prestes, os autores de Store Front: A Face em Desaparecimento de Nova York (em tradução livre) contam que passaram oito anos fotografando fachadas curiosas da metrópole norte-americana. Embora todas estivessem há décadas naqueles endereços, quando o livro foi enfim publicado, em 2008, mais de um terço delas havia desaparecido.
Portanto, foi sem pressa, mas com certa urgência que Leo subiu em sua bicicleta e, em longos passeios, começou a fazer o mesmo por Porto Alegre, cidade onde nasceu e vive. Os passeios são sempre aos finais de semana por vielas desconhecidas que seguido acabam em pneu furado. A primeira publicação do perfil @letreirosfachadas, no Instagram, é de 2012. Também são aceitas colaborações de outras cidades.
– Em Porto Alegre, há diversas regiões que tinham uma vocação e ou ela mudou, ou simplesmente deixou de existir. É o caso das pequenas indústrias do 4º Distrito ou do comércio de rua de determinados bairros. Acredito que mais da metade dos lugares que fotografei já fecharam. Não por acaso, a descrição do perfil diz se tratar de registros de cidades que estão deixando de existir – conta.
Uma das plaquinhas registradas por Leo, por exemplo, foi a da Casa Augusto, eternizada em 2014. Em junho passado, o encerramento da loja de artigos de sapataria após 138 anos rendeu reportagem em GZH. De regiões como Centro Histórico, 4º Distrito e dos confins das zonas Norte e Sul, aparecem no perfil fachadas que, mesmo sem legenda elaborada, às vezes apenas com algumas hashtags, são ao mesmo tempo nostálgicas, curiosas e até de algum humor involuntário.
Uma tabacaria do Partenon, por exemplo, oferece “artigos para: presentes e fumantes”, além de “bijuterias, revistas e material escolar”. Já no São Geraldo, a loja de aviamentos – artigos para costura e artesanato, para quem estiver se perguntando – é uma das fachadas em que o telefone ainda aparece com sete dígitos. Há registros de placas com números até de seis dígitos (anteriores a 1991, portanto), como a de uma antiga vinícola perto do aeroporto, agora coberta por uma faixa anunciando venda de cimento.
O feed do Instagram também é registro de uma estética de comércio de rua que ficou para trás. Caíram em desuso, mas ganharam certo charme, as letrinhas de acrílico em frente a painéis quadrados do mesmo material iluminados por lâmpadas fluorescentes. Também desbotam os últimos registros de letreiros pintados a mão diretamente nos prédios.
Curiosamente, o carinho do autor das fotos ou dos seguidores do perfil por vezes não é compartilhado pelos próprios donos dos negócios.
– Se o proprietário tivesse recurso para trocar o letreiro, talvez trocasse por um moderno, diferente. Com as impressoras plotter, houve essa perda estética. Esses tempos eu vi uma foto da Rua dos Andradas na década de 1970 e ela era toda iluminada por essas fachadas de acrílico. Acho que era um bom estímulo para caminhar por ali à noite.
Leo já pensou em transformar o projeto em algo maior, como no caso do livro de Nova York. Enquanto isso não acontece, serve como uma provocação ao porto-alegrense:
– As pessoas deixaram de caminhar e de prestar atenção na cidade.
Ironicamente, o perfil do Instagram é um convite a tirar o olho do celular e olhar à volta.