O Bará do Mercado foi tombado patrimônio histórico-cultural de Porto Alegre pela Câmara de Vereadores no dia 18. Ali no mosaico de pedras e bronze, na encruzilhada dos quatro corredores centrais, acredita-se que há uma energia protegendo o Mercado Público há gerações.
O Bará é, para as religiões de matriz africana, o orixá que tem o poder de abrir caminhos. Ele foi parar ali após ser assentado, ou seja, fixado em algum objeto por meio de rituais. Esse "ocutá" — que pode ser uma pedra, pedaço de madeira, de metal, ou mesmo um punhado de terra — estaria enterrado sob o prédio de 151 anos.
Há duas versões sobre quem fez o assentamento. A primeira é de que foram os escravos na época da construção do Mercado Público. Mas há também religiosos que acreditam ter sido obra de Príncipe Custódio, que chegou ao Brasil quando o Mercado já existia. Ele veio do Benin, país africano, com uma corte de 48 pessoas e viveu em Porto Alegre de 1901 a 1935, quando faleceu com 104 anos. Além do Mercado Público, ele teria feito assentamentos em lugares como o Palácio Piratini, na Igreja das Dores e no antigo Patíbulo da Rua dos Andradas.
Segundo o historiador Pedro Rubens Vargas, não há evidência física do objeto. Nos anos 90, durante a reforma do prédio histórico, não foi encontrado qualquer objeto em escavações. Mas há relatos de que, já no século 19, o orixá era reverenciado no centro do Mercado.
— Há alguns anos, tinha a banca Central ali no meio, que acabou sendo deslocada. As pessoas chegavam a jogar moedas para dentro da banca, porque ali sempre foi o local do Bará — acrescenta o historiador.
É que, além de abrir caminhos, o Bará ainda representa o trabalho e a fartura. É daí que vem a tradição de jogar dinheiro no centro do Mercado Público.
— Relaciona à prosperidade. Quanto mais a moeda circular, mais vai favorecer quem ofertou ela — explica Bábà Diba de Iyemonjà, presidente do Conselho Estadual do Povo de Terreiro.
Várias celebrações religiosas já ocorreram no local, como para marcar o Dia de São Pedro e do Bará Lodê, em 29 de junho, e o Dia de Santo Antônio, que é também do Bará, em 13 de junho. Além disso, o local faz parte de um rito chamado Passeio. Nele, religiosos de matriz africana passam por pontos considerados importantes para a sua ancestralidade — primeiramente no Mercado, depois no cais e então em uma igreja católica ou em casas dos religiosos. Isso é feito de quatro em quatro anos, explica Bábà Diba.
O Bará do Mercado ainda faz parte do Museu de Percurso do Negro em Porto Alegre. A primeira etapa desse museu a céu aberto foi concluída em 2011 com a inauguração da obra Tambor, na Praça Brigadeiro Sampaio. Também integram a Pegada Africana, na Praça da Alfândega, o Painel Afrobrasileiro, no Chalé da Praça XV. O centro do Mercado ganhou a obra em mosaico de de Leandro Machado e Pelópidas Tebano, executada por Leonardo Posenato e Vinícius Vieira, em 2013.
Para Bábà Diba, o Bará do Mercado acabou transcendendo as religiões de matriz africana e foi adotado pelo porto-alegrense. Ele acredita que o Mercado e o Bará são o coração da Capital.
— Toda a energia é emanada dali, dessa fonte de axé que tem ali — conclui Bábà Diba.