Se tem algo que pandemia não diminuiu, foi a criatividade de Douglas Weiss, 17 anos. Morador de Gravataí, ele achou um jeito de gerar renda e manter seus estudos, mesmo com o distanciamento gerado pelo coronavírus. E o exemplo dele chama a atenção nas redes sociais.
A história do jovem se confunde com a de milhares outros garotos negros ou de regiões periféricas do Brasil. Aos oito anos, perdeu o pai, que tinha envolvimento com o tráfico. Pouco tempo depois, deixou Alvorada com a mãe, a diarista Kelen da Silva Weiss, 38 anos, e três irmãos – algum tempo depois, outro menino chegou. A família estabeleceu um novo lar em Gravataí. As dificuldades que passou lhe fizeram querer distância do sofrimento e das escolhas erradas.
– Sempre digo que filho de peixe, peixinho não é. Não é porque meu pai fez o que fez, que eu vou fazer o mesmo – diz.
Douglas cursa o Ensino Médio em uma instituição privada, o Instituto Adventista Cruzeiro do Sul (IACS). O local, que fica em Taquara, funciona como internato. Até o início do ano, o pagamento das mensalidades se dava com a renda obtida com o trabalho como jovem aprendiz, que conseguiu na própria escola. Só que este período, que dura cerca de dois anos, encerrou-se no início de 2020.
Sem condições de pagar as mensalidades, começou a buscar uma saída. É aí que entra sua veia artística e a guinada criativa, com a ideia de gravar clipes musicais divulgando o comércio local.
Início
Douglas já ajudava há algum tempo Jaina Wichmann, proprietária de uma livraria. Quando a família mudou-se para a cidade, Kelen, mãe de Douglas, passou a trabalhar na casa de Jaina. Quando ele estava no Ensino Fundamental, pediu a ela roupas novas para usar em sua formatura. Por conhecer de perto a realidade da família, a comerciante aceitou de pronto, mas o garoto não quis nada de graça, e ofereceu-se para cuidar das redes sociais da livraria.
– Ele me falou, “posso ajudar a melhorar a qualidade das postagens”. Eu adorei – recorda ela.
No início deste ano, surgiu a ideia de fazer uma paródia (versão de uma música, com versos diferentes) para divulgar o espaço.
– No início deste ano, quando fizemos a primeira, foi um sucesso. Ele parece tímido, mas quando liga a câmera e o microfone, se transforma em um artista – conta Jaina.
Com o sucesso da campanha improvisada, apareceram mais interessados.
Clipes e estúdio improvisados
Jaina mostrou a iniciativa ao Sindicato dos Lojistas (Sindilojas) da cidade, que abraçou a ideia e convidou outros comércios a fazerem o mesmo. Assim, começaram as contribuições espontâneas que tem servido como renda para o garoto.
– As rimas partiram de mim. Agora, o Sindilojas disponibiliza a câmera e um amigo me dá a maior força nas gravações. O processo criativo é bem rápido, começo a escrever e já gravo com meu celular mesmo. Não tenho muitos recursos, meu estúdio é dentro do roupeiro – conta ele.
Mesmo sem aulas presenciais, Douglas segue tendo lições a distância e, por consequência, as mensalidades para pagar. Poder fazer isso com auxílio da sua criatividade nas rimas e paródias tem uma satisfação constante.
– Esta foi uma maneira que consegui para me virar em meio a tudo isso – celebra.
A mãe de Douglas está realizada:
– Estou muito feliz por ele, um menino que sempre me ajudou e sempre correu atrás das coisas que queria fazer.
Presidente do Sindilojas de Gravataí, José Rosa exalta a criatividade do menino e sua capacidade de transformar músicas conhecidas numa propaganda para um comércio local.
– Fortalecer o comércio da nossa cidade com uma mensagem tão divertida e criativa quanto essa que ele passa nos vídeos é algo muito positivo. Nós temos oferecido a possibilidade de gravar a todos os comércios filiados – explica José.
Atualmente, Douglas tem cerca de 2 mil seguidores no Instagram, sua principal plataforma.
Sucesso
O vídeo de mais sucesso até gora é uma paródia da música Hoje Eu Vou Parar na Gaiola, de MC Livinho e Renan da Penha, que divulga uma pizzaria.
Colunista do Diário Gaúcho e repórter da TV Globo, Manoel Soares, conheceu o trabalho de Douglas e divulgou em seu perfil:
– Podemos jogar um talento desse no lixo, deixando ele ir para um caminho errado, ou criamos dispositivos para abraçar esses talentos e fazer deles ícones locais. Eu espero que a gente consiga dar essa opção para o Douglas. Ele é um talento raro, precisa ser visto e aproveitado.