Vestindo fraque e samba-canção, Beto Roncaferro fez uma geração dançar, cantar e rir, por todo canto do Rio Grande do Sul. Com João Antônio (o Toninho Badarok), Julio Fürst e Gilberto "Bagual" Travi, falecido há nove anos, o músico estreou em 1978 no Discocuecas e permaneceu até 1997, quando eles anunciaram “férias não remuneradas”.
O grupo aproveitou a febre da discoteca — o mundo vibrava ainda com Os Embalos de Sábado à Noite, estrelado por John Travolta —, misturando piadas e paródias. Anteciparam no Brasil uma proposta que ressurgiu com o Casseta & Planeta, anos depois, e chegou ao auge com o Mamonas Assassinas.
Essa história começou no Curto Circuito, uma participação de 15 minutos na Rádio Continental. Logo migrariam para a Rádio Gaúcha, onde debochavam da programação e das estrelas da própria emissora com a antológica Radionada Esportiva, e passariam a fazer shows por todo o interior do Rio Grande do Sul.
— Uruguaiana, São Borja, São Francisco de Paula, qualquer lugar que tu possa imaginar. Fora Santa Catarina e São Paulo — lembra Beto. — Tem gente que me encontra hoje e diz: vocês estiveram na minha cidade, foi maravilhoso o show. E, às vezes, eu nem lembro.
Os Discocuecas viajavam com dois caminhões: um era o palco e o camarim, e o segundo servia para guardar toda a parafernália de sonorização e iluminação para fazer uma verdadeira discoteca, conta Beto.
Fizeram sucesso com hits como Hey, Tchë, a versão de Daisy My Love, dos Almôndegas, a caribenha Era Uma Vez ou o rock Só Não Me Faz, sempre unindo humor e música. O grupo foi parar na TV: cantaram no Programa do Chacrinha, do Bolinha, do Raul Gil, Clube dos Artistas, no Fantástico. Também foi para o teatro. Beto lembra que lotaram o Teatro Presidente, por três meses.
— Foi uma surpresa para nós. A gente não acreditava que fosse acontecer isso — relata Beto.
Depois do Discocuecas, Beto, contrabaixista que também toca guitarra, teclado e outros instrumentos, teve uma banda de cover por um tempo e estrelou outro espetáculo de humor ao lado de Toninho, chamado Garotos de Programa.
Aos 69 anos, está devidamente aposentado. Aproveitou para desenvolver um hobby: miniaturas. Em viagem a Inglaterra, voltou disposto a reproduzir em papel papelão prensado, musgo, arame, alfinetes e muita sucata a Matthew Street, a rua em que fica o Cavern Pub, bar em que tocavam os Beatles. Acabou fazendo outros prédios de Liverpool, como a barbearia da rua Penny Lane e o pub Ye Cracke.
Mas o tempo em isolamento social — está há três meses sem sair do seu apartamento, em Porto Alegre —, aflorou seu lado criativo na música também. Está se dedicando a um projeto antigo, uma espécie de ópera rock.
— É uma sinfonia chamada Nemo, que é a história do Capitão Nemo, de Vinte Mil Léguas Submarinas (de Júlio Verne). Se por acaso ficar legal, eu vou montar num teatro. Mas está só no papel por enquanto.
Julio Fürst, Toninho e Beto voltaram aos palcos em 2013, em apresentação que marcou os 35 anos do começo do Discocuecas. Mas Beto acredita que terminou por aí a história do grupo.
— Acho que agora a gente se aposentou pro resto da vida. Ou pelo menos por mais vinte anos — diz ele, aos risos.