Os trens estão ficando mais vazios ano após ano. Quem diz isso é a própria Trensurb, que opera o transporte sobre trilhos entre Porto Alegre e outras cinco cidades da Região Metropolitana – Canoas, Esteio, São Leopoldo, Sapucaia do Sul e Novo Hamburgo. Conforme dados divulgados pela empresa, em 2019, foram transportados 48.055.364 usuários – uma média de pouco mais de 4 milhões mensais. Já em 2018, durante o ano todo foram transportados 51.751.903 passageiros. A queda entre um ano e outro é de 7,14%.
A diminuição não é novidade. O último ano em que a Trensurb registrou aumento na demanda foi em 2014, quando cerca de 58 milhões foram transportados – crescimento de 8% em relação a 2013. De 2015 em diante, os números caíram. Daquele ano, quando 57.541.910 usuários foram transportados, até o ano passado, a retração chegou aos 16,4%.
Passagem
A quantidade de usuários transportados em 2019 é a menor registrada na última década. Menos do que isso, só em 2009, quando 44,4 milhões de pessoas usaram o serviço da Trensurb. Quando se vê a curva para baixo no gráfico, o primeiro motivo que vem a cabeça para a redução de usuários pode ser o aumento na passagem – em fevereiro de 2018, a tarifa, que custava R$ 1,70, passou para R$ 3,30, acréscimo de 94%, e no ano passado, foi de R$ 3,30 para R$ 4,20, mas 27% de aumento. Os últimos dois anos foram os que tiveram as maiores quedas.
Porém, para o chefe do setor de Planejamento e Projetos de Mobilidade Urbana (Semob) da Trensurb, Frank Alves Ferreira, os acréscimos da tarifa não puxaram a queda sozinhos. Isso porque entre 2015 e 2017, mesmo sem aumento na passagem, houve queda. Frank relaciona o fato com o cenário econômico do país e com as mudanças nas necessidades de deslocamento das pessoas.
– Claro, quando era R$ 1,70, era muito barato, tornando o trem a opção mais frequente. Mas os três primeiros anos de queda vão de encontro com questões como o aumento do desemprego e o surgimento de aplicativos de transporte – explica Wagner, que ainda relaciona a queda maior com outras mudanças recentes:
– Além disso, as pessoas têm mudado seus hábitos de deslocamento. Por exemplo, o ensino a distância (EAD) cresceu muito, sendo que as viagens relacionadas a educação eram uma boa demanda nossa. Outro ponto é o perfil de compra das pessoas: elas têm utilizado muito mais a internet. São fatores que vão diminuindo a necessidade de viagens. A passagem influencia também, claro, mas não está sozinha.
Contenção
Frank também recorda que o pico da demanda foi em 2014, ano em que a Trensurb consolidava a extensão até Novo Hamburgo e Porto Alegre era uma das sedes da Copa do Mundo. Mesmo assim, diante dos números recentes, a companhia tem se focado em apresentar programas para conter a queda.
– A gente se preocupa e vai buscar ações para atrair quem deixou de usar o sistema. Temos integração em Porto Alegre e Canoas, mas é algo que pode ser ampliado – diz ele, que segue:
– Também temos o Ciclista Trensurb, que permite o transporte de bicicletas no trem em certos horários. Teve a volta dos trens acoplados, que vão operar de novo quando sairmos da tabela de verão, permitindo levar mais gente ao mesmo tempo. A Trensurb é uma empresa criada com viés social, então, quanto mais gente transportar, melhor.
Opiniões divididas
Nem todos os usuários percebem que há menos gente andando de trem. Quem utiliza o meio de transporte em horários de pico ainda reclama da superlotação, mas também da idade avançada da maioria dos veículos.
O professor André Fava, 56 anos, se desloca diariamente da Capital para Sapucaia do Sul, onde trabalha. Para ele, a situação ainda pode piorar com a privatização da Trensurb – o que está na lista de intenções do governo federal:
– Sobem o custo da tarifa, mas não muda a qualidade do serviço.
Moradora de Esteio, a auxiliar contábil Tatiane Gomes, 42 anos, acredita que o aumento no custo da passagem influencia na queda de passageiros.
– Quando era R$ 1,70, fazíamos o deslocamento por qualquer razão. Porém, vai subindo o preço e a gente precisa priorizar. Atualmente, só venho para resolver questões de trabalho, uma vez por semana – explica.
A sensação é compartilhada pelo técnico óptico Wagner Vieira, 36 anos, de Canoas. Ele utiliza o trem para trabalhar na Capital por achar prático, já que mora perto da estação Niterói.
– Costumo me deslocar em horários fora do pico e tenho sentido que há menos gente usando ao longo dos últimos anos. O serviço é bom, o que poderia ser feito são melhorias pontuais em algumas estações – sugere Wagner.