Quem circula pelas ruas de Porto Alegre pode observar um aumento na quantidade de placas de "alugue" em frente a imóveis comerciais. A mudança na paisagem é confirmada por dados: nos últimos cinco anos, quase que dobrou o número de casas, lojas e salas comerciais desocupados, conforme o Sindicato Intermunicipal das Empresas de Compra, Venda, Locação e Administração de Imóveis e dos Condomínios Residenciais e Comerciais no RS (Secovi/RS). Somados os três tipos de imóveis, há 6.589 espaços vagos, contra 3.354 de cinco anos atrás (aumento de 96%).
O levantamento aponta que, em julho de 2014, 2.053 salas eram anunciadas pelas imobiliárias da Capital, saldo que subiu para 4.467 em julho de 2019 — salto de 117%. No mesmo período, o número de lojas sem locatário cresceu 79% (de 1.010 para 1.808) e o de casas comerciais variou 7,9% (de 291 para 314).
Presidente do Secovi/RS, Moacyr Schukster culpa a recessão na economia.
— Sem emprego, as pessoas não têm dinheiro. E, sem dinheiro, não gastam. Sem confiança em se estabelecer, o empreendedor não tem coragem de ir adiante, de alugar um espaço ou abrir uma filial — afirma, acrescentando que "há esperança" na retomada e que "os negócios imobiliários continuam a se realizar", mesmo em menor número.
O professor de Economia da UFRGS Marcelo Portugal vai na mesma linha: afirma que o Brasil está "andando de lado" desde o aprofundamento da crise em 2014 e os negócios ainda sentem os reflexos:
— Há cinco anos, afundamos. O pico de PIB (Produto Interno Bruto) do Brasil foi no primeiro trimestre de 2014. Depois disso, só caiu. Ficamos 8,12% mais pobres até o fim de 2016. Começou a andar em 2017, mas ainda a passos de tartaruga.
Em Porto Alegre, no mesmo período, 28.986 empresas deixaram de operar, contra 20.622 que se instalaram ou abriram filiais na Capital. Os números referentes aos alvarás voltaram a crescer em 2018, quando 15 mil empresas tiveram licença expedida, contra 8.746 baixas. Essa mudança de perspectiva deixa esperançoso o secretário municipal de Desenvolvimento Econômico, Eduardo Cidade:
— Vivemos um novo momento, como mostram os números de 2018, com a volta de abertura de novas empresas. Em 2019, a quantidade de alvarás que estamos emitindo também é bem significativa, o que entendemos como um movimento de abertura de negócios.
O secretário pondera, no entanto, que o número de imóveis vagos está relacionado ao enxugamento das estruturas das grandes corporações.
— Temos Renner, Sicredi e Walmart, por exemplo, atuando em Porto Alegre com atendimento centralizado, reduzindo a quantidade de espaços locados. Os bancos privados antes tinham várias regionais e agora tudo está em local único, também reduzindo o número de imóveis utilizados — ressalta.
Na última semana, a Ford anunciou que o escritório da empresa, localizado na Avenida Carlos Gomes, foi fechado. O atendimento às concessionárias passará a ser concentrado em São Paulo. A região em que a montadora mantinha os negócios teve, entre 2014 e 2017, índices negativos em relação a abertura e baixa de alvarás na prefeitura, o que reforça a percepção de quem vê prédios e salas desocupadas. Trezentos CNPJs foram desligados, ante 158 emitidos, na Avenida Carlos Gomes.
— Grandes empresas estão nos deixando. Por exemplo: os grandes bancos. É uma realidade, um fato inegável. A tecnologia também eliminou empregos, pois foram criados sistemas que fazem com que as pessoas não precisem ir à agência — reforça o presidente do sindicato do setor imobiliário.
Coworkings afetam salas comerciais
Para além dos números da economia, há uma mudança de comportamento por trás do aumento de imóveis comerciais desocupados. O trabalho exercido em casa — home office — e os escritórios compartilhados — coworkings — impactam nos números. É o que Schukster chama de "reflexo de novos tempos".
No bairro Moinhos de Vento há quatro anos, a Upworks oferece cinco salas privativas, de seis metros quadrados a nove metros quadrados, com capacidade de reunir até três pessoas. De acordo com o proprietário, João Carlos Saba, 80% do espaço está ocupado:
— A procura de quem vem aqui é para reduzir custos, encontrando uma estrutura pronta. Há desde jovens a aposentados ou empresários que desistiram de ter uma sala própria, abrindo mão de ter de fazer reformas ou investimento em mobiliário.
Com R$ 1,4 mil mensais, quem procura a empresa tem internet, água, luz e telefone, além de limpeza e manutenção inclusos.
Outra empresa de espaços colaborativos é a Vox Coworking, no bairro Rio Branco.
— As pessoas comentam que aqui chega a ser até um terço do valor, pois não tem que arcar com IPTU, recepcionista e mobília. É o "plug and play", chega e trabalha, não precisa nem preparar a sala — afirma o empreendedor Nei Nadvorny, 58 anos.