Ao menos por enquanto, os moradores da Vila Mato Sampaio, no bairro Bom Jesus, em Porto Alegre, vão seguir ocupando as residências que estão sobre um terreno público. A razão disso é que a Justiça não aceitou as propostas apresentadas pelo município às famílias que devem deixar as suas residências. Conforme o Diário Gaúcho mostrou no dia 16 de setembro, a Procuradoria-Geral do Município (PGM) propôs aos atingidos pela reintegração de posse o pagamento de aluguel social no valor de R$ 500 durante seis meses e, para quem construiu suas casas até 1997, pagamento de indenização. Além disso, houve uma remarcação do terreno a ser retomado, diminuindo o número de casas a serem demolidas para 46 _ antes, eram 56.
Porém, no entendimento da juíza Vera Letícia de Vargas Stein, da 7ª da Fazenda Pública de Porto Alegre, a solicitação de "propostas concretas de alternativas habitacionais" não foi cumprida pela prefeitura. Estas alternativas foram solicitadas pela magistrada na mesma decisão que suspendeu a reintegração de posse – que deveria ocorrer a partir do dia 10 de setembro –, noticiada pelo Diário no dia 6 de setembro.
O despacho da Justiça que manteve a reintegração suspensa foi publicado no dia 18 de setembro. Na terça-feira, dia 24, a prefeitura foi intimada para se manifestar novamente. A intenção é que o município cumpra integralmente o pedido da juíza da Fazenda Pública, de apresentar opções que realmente atendam às necessidades da parte afetada do Mato Sampaio.
Sem negociação
Conforme a advogada Stéphani Fleck da Rosa, que representa cerca de 40 das famílias afetadas pelo problema, a comunidade segue com a intenção de permanecer na área e "as vias de negociação com a prefeitura estão fechadas". Conforme Stéphani, o município tem tentado realizar o cadastramento dos moradores. Porém, é entendido que estes dados serão usados como base para pagamento do aluguel social, medida que não é aceita pela comunidade.
– Até hoje, a prefeitura ainda não fez uma proposta concreta e real aos moradores. Sabemos apenas de algumas propostas através do que aparece na mídia. O município quer apenas cumprir a reintegração, sem qualquer proposta, apenas sinalizando com tentativas sem êxito de cadastro dos moradores em aluguel social – explica a advogada.
A prefeitura quer desocupar a área para iniciar a construção de uma praça e de uma rua, além de uma bacia de detenção pluvial, para evitar alagamentos. As obras são contrapartidas da iniciativa privada em função da construção de um empreendimento imobiliário nas proximidades da Bonja.
A PGM disse que, tendo em vista todas as alternativas apresentadas, deverá recorrer da decisão.
Projeto de lei terá audiência pública
Junto ao imbróglio judicial entre município e moradores, corre na Câmara de Vereadores um projeto de lei que pode transformar o terreno público em uma área de interesse social. Isso alteraria a designação do plano diretor para aquela área, não sendo mais um espaço destinado a uma praça e uma rua.
Conforme o vereador Roberto Robaina (PSOL), um dos autores do projeto e vice-presidente da Comissão de Urbanização, Transportes e Habitação (Cuthab), o projeto poderia ser votado ainda em setembro. Porém, um parecer da procuradoria da Câmara orientou que antes do encaminhamento para votação, deve ser feita uma audiência pública.
– Poderíamos seguir para votação sem a audiência, mas abriria margem para contestações jurídicas e de constitucionalidade do projeto – explica Robaina.
Cautela
O vereador encaminhou o pedido da audiência, que ficou marcada para o dia 22 de outubro. Além disso, os vereadores também aguardam parecer da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa. Robaina diz que como a Justiça suspendeu a reintegração, o Legislativo está tratando a situação com menos urgência, pois o risco de retirada imediata deixou de existir.
– Vamos seguir os passos corretos, passando pela audiência pública, que dará sustentação jurídica ao processo.
Depois da encontro no dia 22 de outubro, a expectativa do parlamentar é que o projeto entre em votação ainda em novembro. Como o Diário mostrou no dia 5 de setembro, com a mobilização dos moradores junto ao Legislativo, vereadores de oposição e da própria base do governo se mostraram contrários ao plano de despejo idealizado pela prefeitura e apoiaram o projeto.
Entenda o caso
- Depois de a Justiça determinar a reintegração de posse da área, o município comunicou aos moradores que a decisão seria cumprida a partir do dia 10 de setembro.
- Diante da contrariedade dos moradores, a mobilização da comunidade fez advogados de defesa e Câmara de Vereadores encaminharem pedidos ao Tribunal de Justiça (TJ).
- Enquanto não havia resposta do TJ, no dia 5 de setembro, o Legislativo protocolou projeto de lei para tentar converter a destinação da área, tornando-a disponível para moradia.
- No dia 6 de setembro, a Justiça suspendeu a reintegração de posse, pedindo a prefeitura que apresentasse alternativas aos moradores que seriam retirados de casa.
- A prefeitura apresentou suas alternativas no dia 13 de setembro.
- Seis dias depois, em 18 de setembro, a Justiça não aceitou as propostas do município e manteve a reintegração suspensa.
- PGM afirma que recorrerá da decisão.