Uma ação civil pública foi ajuizada contra a Fraport, a concessionária do Aeroporto Salgado Filho, devido ao impasse na retirada das casas da Vila Nazaré e realocação dos moradores. Os procuradores entendem que o reassentamento de cerca de 1,5 mil famílias do local é de responsabilidade da empresa alemã, que assumiu o aeroporto em janeiro de 2018 por 25 anos. O grupo estrangeiro diz que a obrigação não consta em seu contrato com a União.
Parte das casas das famílias do conjunto habitacional estão na cabeceira da pista, que será ampliada em 920 metros. Para a obra ocorrer, elas precisam ser retiradas. Os procuradores entendem que todos os moradores - não só os que estão no trecho da ampliação - devem ser retirados. O valor estimado da construção de novas moradias e o realocamento de todas as pessoas é de aproximadamente R$ 140 milhões, orçado ainda em 2016.
Na ação, que é assinada em consórcio pelo Ministério Público Federal (MPF), Ministério Público (MP) do Rio Grande do Sul, Defensoria Pública da União (DPU) e Defensoria Pública do RS, há uma exigência para que a empresa apresente em juízo, no prazo de 10 dias, proposta de solução habitacional que abranja a totalidade das famílias componentes da Vila Nazaré. Os órgãos dizem que a sugestão deva respeitar o entendimento dos moradores.
"Proposta essa que deve ser adequada aos moradores e respeitar seu direito de escolha, garantindo-se a isonomia de tratamento inclusive com relação às opções disponíveis, e com indicação de valores adequados e suficientes, bem como garantindo a continuidade dos meios de geração de renda das famílias", cita a ação.
No documento, de 132 páginas ao qual GaúchaZH teve acesso, também há um pedido para que a Fraport não realize "qualquer remoção, realocação ou reassentamento forçado, antes da conclusão do cadastro integral das famílias" ou para os empreendimentos do Minha Casa Minha Vida já concluídos em Porto Alegre.
"(...) É sua a responsabilidade, inclusive financeira, a desocupação da referida área, bem como de eventuais reassentamentos e realocações, respeitando os direitos das famílias ali residentes", afirma a ação.
O procedimento também tem como alvo a prefeitura de Porto Alegre e o Departamento Municipal de Habitação. As exigências à prefeitura também são para que não promova a retirada das famílias do local e para que aprove o futuro plano de reassentamento que deve ser apresentado pela empresa alemã.
A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) também é citada no documento. A demanda ao órgão é para que fiscalize a Fraport e garanta a apresentação de uma solução habitacional.
Os procuradores, promotores e defensores públicos ainda pontuam que não são contra a obra:
"Desde já, há de se registar que os autores não se posicionam contra a ampliação da pista do Aeroporto Salgado Filho na presente ação civil pública e não faz parte do objeto dessa demanda judicial a permanência, por tempo indefinido, das famílias na área prevista para integrar os projetos de melhorias no sítio aeroportuário. Todavia, as famílias, dentre elas algumas que residem na área há mais de 50 (cinquenta) anos, exatamente em função do tempo decorrido, possuem direitos, (...) tais como trabalho, saúde e educação".
Um dos responsáveis pela ação, o procurador regional dos Direitos do Cidadão, Enrico Rodrigues de Freitas, ainda diz que o acordo firmado entre a prefeitura e a Fraport para realização de melhorias em dois condomínios oferecidos aos moradores da Vila Nazaré não muda o entendimento do órgão. Segundo ele, as famílias precisam ter direito de escolha dos locais e muitos não concordam em morar nos condomínios, que ficam nos bairros Rubem Berta e Sarandi.
Procurada pela reportagem, a Fraport enviou uma nota afirmando acreditar na Justiça brasileira e em uma decisão favorável ao seu entendimento, de que não é responsável pela retirada das famílias. O grupo alemão ainda criticou a atuação dos órgãos contra "investidores estrangeiros que estão comprometidos a cumprir as obrigações contratuais".
A reportagem entrou em contato e aguarda posicionamento dos demais citados.
Confira a nota da Fraport:
"A Fraport Brasil acredita na justiça brasileira e está confiante que receberá uma decisão favorável para continuar o projeto.
Por outro lado, está desapontada com a forma que certas entidades públicas estão tratando empresas privadas e investidores estrangeiros que estão comprometidos a cumprir as obrigações contratuais em sua totalidade, em conformidade com a legislação brasileira.
A Fraport Brasil responderá as dúvidas a ela pertinentes assim que finalizar a análise da ação que contém mais de 900 páginas, impetrada ontem (4/7) no final do dia."