Um projeto de lei em tramitação na Câmara de Vereadores deve acirrar o debate sobre o ensino de temas relacionados à sexualidade nas escolas de Porto Alegre. A iniciativa exige que qualquer conteúdo sobre o assunto precisará de “autorização prévia e expressa” dos pais ou responsáveis para ser ministrado aos estudantes da rede pública municipal.
A proposta, de autoria do vereador Wambert Di Lorenzo (PROS), que é professor universitário, determina que os responsáveis devem autorizar o acesso de crianças e adolescentes tanto a aulas, palestras e debates quanto a livros, apostilas e materiais multimídia que tenham como mote a sexualidade.
Conforme o texto, o pedido de autorização deverá ser produzido pela escola e encaminhado sete dias antes do acesso ao conteúdo. Se os pais não autorizarem, os estudantes deverão ser submetidos a atividades paralelas. Na prática, a família teria o poder de vetar a atividade ou mesmo de revogar a autorização concedida em qualquer momento, sem necessidade de apresentação de justificativa.
Segundo Wambert, o projeto tem duas motivações principais: o risco de erotização precoce das crianças e a necessidade de atrair os pais para compreender melhor os conteúdos que os filhos estão recebendo na sala de aula.
- Meu problema não é com a educação sexual, mas que os pais tenham domínio do conteúdo. A escola não pode invadir excessivamente valores familiares. Os pais têm condições de discernir qual a idade adequada para que os filhos possam ou não ter esse tipo de educação – avalia o vereador.
Assim como outras propostas que versam sobre a composição da grade curricular em escolas, a medida deve sofrer resistência de sindicatos e entidades representativas de professores. Para Vládia Paz, diretora da Associação dos Trabalhadores em Educação de Porto Alegre (Atempa), entidade que representa os educadores e funcionários de escolas municipais, o projeto “não tem cabimento”.
Os pais têm condições de discernir qual a idade adequada para que os filhos possam ou não ter esse tipo de educação
WAMBERT DI LORENZO
Vereador (PROS)
- Isso (exigência de autorização) fere o papel da escola de oferecer o acesso ao conhecimento universal sistematizado pela humanidade ao longo do tempo.
A professora diz que os pais devem acompanhar e participar da educação dos filhos, mas pondera que temas relacionados à educação sexual fazem parte do rol de conteúdos a serem ministrados às crianças.
- Assim como ensinamos o alfabeto e o sistema de numeração, é preciso explicar às crianças questões sobre o corpo - defende a educadora.
Procurador apontou inconstitucionalidade
Apresentado em novembro do ano passado, o projeto recebeu parecer contrário da procuradoria da Câmara em 22 de janeiro. Na avaliação do procurador Fábio Nyland, a proposta é inconstitucional.
"Não é possível, especialmente por projeto de lei de iniciativa de vereador, se restringir o conteúdo que será ministrado na grade curricular das escolas, ou mesmo exigir autorização previa dos pais. Até porque a educação é um direito de todos e um dever do Estado e da família, nos termos do artigo 205 da Constituição Federal", escreveu Nyland no parecer.
Não é possível se restringir o conteúdo que será ministrado na grade curricular das escolas, ou mesmo exigir autorização previa dos pais.
FÁBIO NYLAND
Procurador da Câmara Municipal
De acordo com Wambert, no entanto, isso não é impeditivo para continuidade da tramitação:
- Vários projetos receberam parecer negativo, mas a procuradoria não é vereadora. O projeto sobre educação financeira também recebeu parecer negativo. Ele foi aprovado e esta vigente – exemplifica.
A matéria passou pela segunda sessão de discussão em pauta nesta quinta-feira (7). Até o momento, nenhum vereador apresentou emendas. A partir de agora, deve ser enviada à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), que emitirá parecer quanto à constitucionalidade e à legalidade.
Se chegar ao plenário, o projeto precisa do apoio de maioria simples dos vereadores para virar lei.
O que prevê o projeto
- Autorização prévia e expressa dos responsáveis legais dos estudantes da rede pública municipal de ensino para que eles tenham acesso a qualquer conteúdo que verse sobre sexualidade nas dependências das escolas.
- Inclui na lista de atividades que precisariam de autorização palestras, mesas redondas, debates, conversações e ministração de aulas ou de matérias sobre educação sexual, além de livros, apostilas, revistas, demais impressos e quaisquer tipos de materiais multimídia que contenham caráter ou explicações referentes a temas voltados para a sexualidade.
- A autorização deverá ser produzida pela escola e encaminhada para a família do estudante em até sete dias antes do acesso ao conteúdo.
- Caso não haja autorização expressa dos responsáveis legais, os estudantes deverão ser submetidos a atividades paralelas.
- Os responsáveis legais do estudante poderão revogar a autorização concedida em qualquer momento, sem necessidade de apresentação de justificativa.
- As escolas ficarão responsáveis pelo arquivo e controle das autorizações assinadas pelos responsáveis dos estudantes.