Com os pilares da nova ponte do Guaíba no limite do território da Ilha Grande dos Marinheiros, em Porto Alegre, aproximadamente 300 das 400 famílias que terão que sair para a continuidade das obras já estão em busca de casas fora dali. Elas fazem parte do grupo que aceitou aderir à Compra Assistida, na qual escolhem uma casa em qualquer local do Estado e, se o imóvel estiver de acordo com os critérios do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte (Dnit), o órgão faz a compra.
Os valores vão de R$ 152 mil por moradia (para famílias compostas por um núcleo familiar) até R$ 178 mil (mais de um núcleo). O Diário Gaúcho acompanha o caso desde 2014.
Incluindo a Ilha e as Vilas Areia e Tio Zeca, no continente, 1.089 famílias e 33 comércios terão de ser realocados. Quando a obra chegar a 90% – em setembro, estava 69% concluída –, os trabalhos só irão avançar sem a presença dos moradores.
Um grupo de 125 famílias já escolheu as casas e apresentou documentação ao Dnit. Nos dias 16 e 17 de outubro serão realizadas as primeiras audiências de conciliação. Os imóveis escolhidos devem estar com a documentação em dia. Segundo o Dnit, a conclusão do processo dependerá da adesão das famílias.
Sem loteamento
A construção de um loteamento dentro da ilha, a possibilidade de realocação mais desejada pelos moradores, ainda está só na promessa. O projeto de construir 573 unidades habitacionais, entre casas e apartamentos, em uma área localizada na margem sul da BR-116/290, ainda depende da liberação do licenciamento pela prefeitura.
Se, há quatro anos, a recicladora Sandra Marilu da Silva, 44 anos, afastava a possibilidade de sair da ilha, hoje, admite que vai aderir à Compra Assistida. Ela e a família estão pesquisando imóveis em Eldorado Sul, a 10km do local:
– Primeiro, nos mostraram a maquete do loteamento e achamos tudo lindo. Um tempo depois, nos disseram que seríamos realocados para casas de passagem, e não queremos isso. Aí, fomos obrigados a mudar de ideia.
Ao perceber que o loteamento não sairia do papel a tempo, se convenceu de que comprar uma casa em outro local seria a solução menos arriscada.
– Temos uma história de vida aqui. Vai ser difícil sair, mas estamos nos acostumando com a ideia – avalia Sandra.
Demora preocupa moradores
O reciclador Luci Machado Braga, 68 anos, já escolheu uma casa para morar, também em Eldorado. Ele enviou a documentação do imóvel para o Dnit e aguarda a audiência para saber se a casa foi aprovada. Morador da ilha há 45 anos, não vê a hora de ir embora:
– Procurei por uma casa com terreno grande, onde possa ter uma horta e espaço para os meus três cachorros. Tenho vontade de sair daqui. Da minha parte, já escolhi a casa, agora preciso saber se está tudo certo para o Dnit.
Luci está cadastrado no grupo dos primeiros 125 moradores a deixar a ilha. Mas reclama das informações desencontradas e da falta de uma data certa para a mudança ocorrer.
Filha de Luci, a também recicladora Itamara de Moura, 30 anos, está insatisfeita com a indefinição. Ela apresentou ao Dnit duas opções de imóvel (um em Canoas e outro em Eldorado do Sul), mas reclama da falta de autonomia em definir o futuro da família. E teme perder o imóvel com a demora:
– Querem resumir nossas vidas, mas temos uma história aqui. Eles não nos dão certeza de nada. Pode ser que nenhum dos imóveis que apresentei como opções seja aceito.
Galpão de reciclagem
Outra preocupação dos moradores é o futuro do galpão de reciclagem da ilha. Pertencente à Associação de Catadores de Materiais de Porto Alegre Ilha Grande dos Marinheiros, o local existe desde 1989 e emprega 18 pessoas, entre eles, Sandra, Luci e Itamara. Na segunda-feira, técnicos do Departamento Municipal de Limpeza Urbana (DMLU) realizaram um levantamento para apresentar o plano para a construção de uma nova unidade.
De acordo com o compromisso firmado entre o DMLU e a Defensoria Pública, o prazo para a apresentação do projeto de um galpão provisório encerra-se no final de outubro.
Segundo o DMLU, ainda não há definição sobre o local onde o galpão será construído. O Dnit apresentou duas propostas, mas as áreas não estão adequadas.
Também não se sabe quando as obras vão começar. Após a definição do projeto e do local, a execução da obra e os recursos ficarão a cargo do Dnit. Diante da falta de certezas, os trabalhadores prometem resistência.
– Só vamos sair daqui quando tivermos nosso emprego garantido. Não vamos ficar um dia parados – afirma Sandra.