O gosto e o cheiro terrosos percebidos na água desde a semana passada em Porto Alegre podem ser provocados pela proliferação de micro-organismos na parte norte do Guaíba, conforme o Departamento Municipal de Água e Esgotos (Dmae).
O órgão deverá contar nos próximos dias com o resultado de um laudo mais detalhado sobre as condições do manancial, mas a hipótese mais provável é a de multiplicação de algas ou cianobactérias provenientes do Rio Gravataí. Elas produzem substâncias que deixam a água com as características notadas pela população, mas, conforme o Dmae, não há risco à saúde.
Ao longo da semana, o Dmae recebeu cerca de 60 reclamações de moradores em razão de alterações na água — em condições normais, o número de queixas não passa de uma ou duas. Em razão dos relatos, a prefeitura informa que intensificou as coletas de amostras para análise e, preventivamente, reforçou o sistema de tratamento. A quantidade e o tempo de aplicação de dióxido de cloro foram ampliados, e o processo passou a receber carvão ativado. O objetivo é reduzir a percepção de gosto ou cheiro no líquido.
O diretor de Tratamento e Meio Ambiente do Dmae, Marcelo Gil Faccin, afirma que a provável proliferação dos micro-organismos no Guaíba, provocada pela combinação entre calor e estiagem, não compromete a segurança do abastecimento.
— Ainda não temos os resultados (da análise da água por um laboratório terceirizado), mas tudo leva a crer que seja um processo de floração de algas ou cianobactérias a partir do Rio Gravataí. Elas liberam compostos que, mesmo em quantidade muito pequena, alteram o gosto sentido pelo consumidor — afirma Faccin.
Esses micro-organismos expelem duas substâncias que seguidamente afetam a água distribuída na Capital nos verões: a geosmina e o MIB (2-Metilisoborneol). Pelas características percebidas pela população e pelos profissionais do próprio Dmae que degustam amostras em busca de eventuais alterações, a sensação terrosa sugere a presença desses elementos.
Nos últimos anos, a Capital tem registrado fenômenos de mudança nas condições de consumo da água nos meses mais quentes. A multiplicação de algas é a causa mais comum para a presença de tons de terra ou mofo no sistema de abastecimento — em 2012, os micro-organismos chegaram a mudar a cor do Guaíba. No ano passado, durante o Carnaval foram registradas 324 queixas por essa razão em Porto Alegre.
— Continuamos atendendo aos requisitos do Ministério da Saúde, mas as pessoas estão acostumadas a um padrão nota 9. Quando cai para um padrão nota 7, embora ainda esteja dentro dos parâmetros exigidos, os consumidores se queixam — avalia Faccin.
Professor da Feevale e coordenador do Mestrado em Virologia, Fernando Spilki concorda que as algas ou cianobactérias são as causas mais prováveis das mudanças percebidas na Capital com base em episódios semelhantes ocorridos em anos anteriores. Ele acrescenta que, além dos fatores climáticos, a liberação de esgoto in natura em rios que abastecem o Guaíba, em municípios da Região Metropolitana, aumenta o problema. Spilki confirma que o consumo da água não configura risco, desde que passe pelo sistema de tratamento do Dmae.
— A água tratada adequadamente é segura. Mas, nesse período, deve-se evitar o consumo da água não tratada. Nesse caso, podem ocorrer problemas de saúde — avisa o especialista.
Há dois anos, o cheiro e gosto eram de mofo na água de Porto Alegre. O problema terminou dois dias depois de o governo estadual suspender a licença da empresa Cettraliq, que tratava efluentes químicos. A companhia foi fechada, mas garante não ter sido responsável pelo fenômeno.
As explicações
Microalgas ou cianobactérias — micro-organismos que combinam características de algas e bactérias — podem estar se proliferando na água que vem do Rio Gravataí, que desemboca no Guaíba.
Elas produzem substâncias que, segundo o Dmae, não afetam a saúde mas alteram o gosto o cheiro e o gosto da água mesmo em quantidades quase imperceptíveis. São chamadas de geosmina e MIB (2-Metilisoborneol).
O que contribui
Temperaturas elevadas, pouca chuva, baixa cobertura de nuvens e pouco vento são fatores para o fenômeno.
60 queixas
A respeito da água foram feitas só na semana passada na Capital. O normal é uma ou duas por semana.
Onde está pior
Região central e norte, abastecidas pelas estações Moinhos de Vento e São João.
O que está sendo feito
O Dmae reforçou o sistema de tratamento com dióxido de cloro e carvão ativado. O órgão aguarda o laudo de análises mais detalhadas de amostras de água (realizadas por laboratório terceirizado). O resultado deve sair nos próximos dias.