Instalados às margens do Arroio Dilúvio, em Porto Alegre, 13 moradores de rua foram removidos na manhã e na tarde de sábado (24), em ação da prefeitura. Equipes da Fundação de Assistência Social e Cidadania (Fasc) e do Departamento Municipal de Limpeza Urbana (DMLU) percorreram a Avenida Ipiranga retirando os moradores e destruindo as casas improvisadas, construídas com restos de materiais e lixo, principalmente sobre os taludes do arroio.
A Secretaria de Desenvolvimento Social e Esporte garante que a iniciativa, que chamou atenção de algumas pessoas que passavam no momento da ação, faz parte de um trabalho rotineiro de assistência social. Para a secretária interina, Denise Ries Russo, a repercussão desse episódio em específico foi maior porque a concentração de pessoas em situação de rua na Avenida Ipiranga estava mais elevada.
Questão envolvendo moradores de rua foi tema de reportagem de GaúchaZH em dezembro, quando, na ocasião, debatia-se a concentração de pessoas nessa situação vivendo embaixo do Viaduto Otávio Rocha. Naquela oportunidade, a prefeitura informou que estudava uma estratégia mais ampla para lidar com a ocupação de espaços públicos por moradores de rua. Ainda em janeiro, estimava-se que estaria em execução, começando pelo viaduto, na Avenida Borges de Medeiros. Segundo Denise, esse projeto ainda está sendo discutido e ainda não tem data para ser apresentado.
Veja trechos de entrevista com a secretária interina:
As remoções realizadas no sábado são o começo de um plano mais amplo para a questão dos moradores de rua da cidade ou se tratam de uma ação isolada?
Dentre as atividades da assistência social, se faz todo um trabalho diário e rotineiro de acompanhamento e de remoção dessas pessoas em situação de rua, principalmente nos pontos mais vulneráveis. Essa ação acabou tendo mais repercussão neste final de semana por ser no Dilúvio, na Avenida Ipiranga, onde, nos últimos tempos, a gente tem tido uma concentração de pessoas um pouco maior. Mas esse é um trabalho que é feito normalmente, é parte de uma ação que temos em toda a cidade. Duas semanas atrás, uma abordagem intensiva começou a ser feita nessa região. Nós conversamos com esses moradores, explicamos os riscos que a área oferece, fizemos cadastro social e colocamos os nossos serviços de assistência à disposição.
Então, esses moradores já estavam cientes de que aconteceria a remoção no sábado?
Sim. A gente tem uma equipe em vários pontos da cidade dando esse suporte, informando os riscos, alertando. E quando a gente define que alguns pontos devem ser evacuados, avisamos com antecedência, conversamos e cadastramos. Com isso, conhecemos as pessoas que estão ali, sabemos todo o seu histórico. É muito mais do que uma simples remoção. É todo um trabalho de reforço de vínculos, de conversar com eles e entender por que estão na rua, se tem para onde voltar. A maior parte desses 13 moradores que foram removidos tem família próxima. Eles optaram por voltar para suas casas. Para nós, o mais importante é que essas pessoas possam voltar para os seus lares, para as suas famílias, porque a gente sabe que é com a família que eles têm mais sucesso em não retornar às ruas. Além disso, também colocamos à disposição os equipamentos que a gente tem. Perguntamos se eles queriam ser encaminhados para albergues, se queriam ser encaminhados para abrigos. Tem todo um trabalho, não fomos lá e só tiramos as pessoas. O Dilúvio é uma área que oferece risco a esses moradores e à população em geral.
Em dezembro, demos uma matéria sobre o Viaduto Otávio Rocha em que a prefeitura dizia que estudava um plano mais amplo para a cidade e que deveria começar ainda em janeiro por aquele local. Essa ação de sábado faz parte desse plano maior?
Não, esse plano maior ainda está sendo discutido e será apresentado em determinado momento. Ainda não há definição. Mas as estratégias de atendimento à população de rua continuam independentemente de um plano maior. É um trabalho que está sendo feito de forma integrada, com outros órgãos da prefeitura.
Quais são os outros órgãos que atuam nesse trabalho?
É um grupo de trabalho, nem sempre esses órgãos estão juntos em todas as nossas ações. Normalmente temos a Secretaria Municipal de Saúde, a Secretaria de Serviços Urbanos, por meio do DMLU _ que ontem (sábado) estava junto _, o Departamento Municipal de Habitação e a Guarda Municipal.
Por que acontece de não estarem juntos em todas as ações?
Depende muito do perfil da população. A Saúde vai quando a gente chama. Às vezes eles estão juntos desde o início, mas nesse sábado foi combinado Assistência Social, Guarda Municipal e Secretaria de Serviços Urbanos. Nós estamos trabalhando muito integrado com essas áreas até porque o desafio é grande e delicado. Uma coisa é o DMLU fazer o trabalho dele ali, como fizeram, de retirar os resíduos, mas se eles encontram moradores de rua sem a companhia da Assistência, não podem fazer nada, pois precisa ser planejado, precisa ser feito em conjunto para dar um encaminhamento adequado aos moradores.
Para onde foram os moradores retirados do Dilúvio no sábado?
Nenhum deles quis ir para os equipamentos públicos. Estávamos preparados para recebê-los, mas eles foram se movimentando por conta e cada um indo para um lado. A informação que temos é que eles retornaram para casas de familiares. A gente entrega tipo uma cartinha para eles, orientando-os a procurar os Centros de Referência Especializados da Assistência Social (Creas) da região central para continuar com os encaminhamentos, então, segunda-feira (26) é possível que a gente retome o atendimento a partir da procura deles.
O que foi feito com os pertences removidos?
Na verdade, a maior parte retirada foram resíduos. As pessoas nos dizem se querem guardar ou não. A maioria não quis guardar. Quando nos pedem para guardar, nós catalogamos os itens, informamos onde será guardado, que pode ser ou em um depósito do DMLU, ou em um depósito da Fasc, e eles podem ir lá retirar. Ontem, os itens de apenas um morador foram guardados. O restante foi descartado com a autorização deles.
Como vai ser esse atendimento nesta segunda-feira (26)?
Eles estão orientados a procurar o Creas a partir de amanhã (segunda) e aí cada caso será estudado. Em alguns casos, pode ser encaminhado o benefício do aluguel social (R$ 500 para subsidiar pagamento de moradia). Só que esta é uma ferramenta que nem sempre está disponível, depende de orçamento. Mas muitos deles, principalmente esses moradores de rua, têm dificuldades de acessar o aluguel social quando está disponível pela própria característica dessa população, que tem dificuldade em viver em ambientes fechados. Então, tem todo um esforço para isso. O primeiro passo é encaminhar (os moradores de rua) para a Saúde ou para suas famílias. Tem muitos que vêm de outras cidades, que a gente ajuda a retornar. Muitos querem voltar e não conseguem, então a gente faz o cadastro, faz contato com a prefeitura da cidade, com as famílias dessa pessoa, a fim de garantir que essa ela possa realmente ser acolhida em seu local de origem. Às vezes, as pessoas falam que "eles têm que trabalhar", mas eles estão há não sei quanto tempo na rua. A gente começa um atendimento com eles, mostrando o valor do trabalho. É preciso trabalhar com eles a questão da higiene também, até que, em um determinado momento, eles estão prontos para uma "emancipação", aí é que começamos o encaminhamento dessas pessoas ao mercado de trabalho.
Então, não há uma promessa de aluguel social para todos?
Não, até porque não é uma ferramenta que fica disponível o tempo inteiro. Cada caso é um caso. Teve um deles que fez uma estrutura no Dilúvio, com jardim, que chamou muita atenção da população, esse caso, por exemplo, é uma pessoa que veio do interior, que tem parente em Porto Alegre também e que, casualmente, teria um parente que veio do interior para buscá-lo.
Esse tipo de ação como a que ocorreu no sábado será feita em outro local nos próximos dias?
A gente vai ajustando as datas. Vamos continuar a sequência de trabalho na Ipiranga. Ainda não temos dias definidos, mas vamos seguir na avenida fazendo o mesmo procedimento, abordando os moradores, e então, acertando uma data.