Se a história recente de Alezi Goulart, 21 anos, fosse um jogo de videogame, a primeira fase provavelmente teria sido daquelas que um principiante avançaria com dificuldade. Com a família passando por uma crise financeira após levar um calote, aos 16 anos o garoto resolveu buscar um jeito de ajudar nas despesas da casa. Sem experiência profissional, a primeira tentativa — trabalhar como menor aprendiz na Assembleia Legislativa — resultou inócua. Diante do fracasso, o então estudante do 3º ano do Ensino Médio criou seu próprio desafio: dar início a uma loja virtual praticamente do zero. Acumulava apenas a vivência de anos como um nerd viciado em games e encantado com design gráfico, e uma pequena verba negociada com a mãe para dar os primeiros passos.
Iniciada em 2013, a trajetória que deu início à Nerduniverse, loja online de produtos voltados à cultura geek, não podia ilustrar melhor a geração hiperconectada e pouco afeita a convenções em que Alezi cresceu. Sem dinheiro, mas atento ao crescimento do Facebook, resolveu investir em parcerias com páginas populares para divulgar seu negócio. Com pouco mais de 30 estampas criadas por ele, pôs no ar o site no qual venderia as camisetas e moletons com temática nerd e procurou donos de páginas com temas afins — e milhares de curtidores — propondo que divulgassem seu e-commerce em troca de um percentual sobre as vendas. Quatro pessoas toparam, e em poucos dias já havia interessados em comprar os produtos da loja nerd.
Sem um capital inicial de investimento, o dinheiro dos pedidos era destinado integralmente à compra de material: em resumo, os primeiros clientes pagaram por um produto que sequer tinha sido confeccionado. Alezi pedia um adiantamento para a operadora de cartão e trabalhava nas camisetas para enviá-las no prazo prometido.
A iniciativa emplacou logo nos primeiros meses, quando o inexperiente empresário começou a ter um lucro impensado para alguém que sequer tinha tido um salário: viu-se administrando as primeiras dezenas de milhares de reais mensais. O crescimento exponencial do negócio, porém, começou a pesar em sala de aula. Aluno exemplar do Colégio Maria Imaculada, perdeu rendimento diante do acúmulo de responsabilidades. Os professores pressionavam para que os estudantes buscassem um foco senão quisessem se tornar "profissionais medíocres". Alezi assumiu o conselho a sua maneira.
— Não conseguia mais me concentrar nas aulas, então, resolvi sair do colégio. Como eu já estava ganhando um bom dinheiro por mês, e meus pais viram que o negócio era sério, eles apoiaram. Fui emancipado e em seguida saí de casa. Queria ir para o mundo adulto o mais rápido possível, para me habituar — conta o porto-alegrense, que recebeu a reportagem em meio à quarta mudança de endereço (do Petrópolis para o Moinhos de Vento) desde que deixou a casa da mãe — desta vez, para voltar por alguns meses.
Apesar de ser fã de games e bem ambientado no universo geek, Alezi tem pouco de um nerd convencional. No dia da entrevista, estava mais para um tipo descolado: vestia calça jeans, camiseta lisa ajustada e um par de alpargatas. Tem o cabelo bem cortado, com topete, uma tatuagem no braço esquerdo e a marca de um alargador na orelha. Os compromissos de empresário não impedem a manutenção do hobby que virou trabalho: ultimamente, dedica parte do tempo livre a um jogo no qual pessoas caem de paraquedas em uma ilha em busca de armas e equipamento a fim de matar os outros jogadores, enquanto tentam sobreviver.
Planos de aposentadoria aos 25
Os resultados de investir em um mercado até então tímido no Brasil vieram rápido: ao final do primeiro ano de Nerduniverse, segundo o próprio dono, o faturamento foi de R$ 3 milhões — a média se manteve nos anos seguintes, mas a perspectiva para 2018 é crescer entre 7% e 15%. Fase completa com sucesso, foi a vez de buscar os bônus: embarcou com os pais para uma viagem de férias pela Europa. Sua estreia em um avião foi também a primeira vez da família fora do Brasil — já conheceu os Estados Unidos e atualmente vai a São Paulo cerca de uma vez por mês.
Logo ficou claro, porém, que o trabalho estava apenas começando. Autodidata, Alezi traçou planos de estudos para compreender melhor o mundo no qual queria se inserir: por conta própria, aprendeu sobre e-commerce, design, finanças e gestão de empresas, assuntos sobre os quais discorre com jargões de entendido. De temperamento tranquilo e discurso focado, comanda uma equipe de 20 pessoas, da qual é o caçula. Depois de investir em um prédio de 1,5 mil metros quadrados "pensando grande", resolveu, meses atrás, repensar o negócio. Hoje, todos trabalham em modelo de home office, e ele mantém apenas um pavilhão onde são produzidas as peças de vestuário.
Seu tempo livre é cuidadosamente partilhado entre o videogame, a namorada e a música, hobby ao qual dedica pelo menos duas horas por dia para tocar violão e cantar — alguns vídeos são postados em seu perfil no Facebook. Os finais de semana são de folga, misturada com sua rotina de estudos, que passa por temas variados: vai desde assuntos pertinentes ao trabalho, passando por psicologia — dedicou um ano a entender o tema para conversar melhor com a namorada, estudante da área — e chegando em seu mais novo xodó, as criptomoedas.
O patrimônio é quase todo investido. Segundo Alezi, cerca de 70% do que ganha atualmente é aplicado em fundos de investimento de baixo risco, e os outros 30% em aplicações mais arriscadas, como bolsa de valores e bitcoins. Sua meta é ambiociosa: quer autonomia financeira para se aposentar aos 25 anos — sim, você não leu errado.
— Aos 25, eu quero ter independência para não precisar ganhar mais. Não quero trabalhar puramente por dinheiro. Quero ter impacto, trabalhar com projetos sociais — conta.
Quem duvida?