Aguardados há semanas por porto-alegrenses e órgãos públicos, os resultados dos testes pedidos pela Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam) a um laboratório de São Paulo para verificar a presença de possíveis poluentes relacionados às alterações no cheiro e no gosto da água de Porto Alegre, não indicaram o que pode ter causado o problema que perdura há quase dois meses. Na prática, significa que os órgão ambientais seguem sem saber o que causa o problema e não fazem ideia de como combatê-lo.
Depois de avaliar o laudo, na tarde desta segunda-feira, Fepam e Departamento Municipal de Água e Esgotos (Dmae) disseram apenas que os 132 possíveis poluentes testados não foram encontrados fora dos níveis normais em nenhum dos cinco pontos onde a água foi coletada.
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A secretária do Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, Ana Pellini, afirmou que as causas ainda não identificadas das mudanças na água provavelmente não estão relacionadas a uma única fonte, mas a uma conjunção de fatores:
– No Rio Grande do Sul, não temos problema de falta de água, temos problema de poluição. Acreditamos que existe um conjunto de potenciais poluentes que possam estar contribuindo para isso.
Ela ressaltou que a Fepam fará monitoramento da água coletada nos cinco pontos da cidade e que esse monitoramento deve se tornar permanente. Os resultados da primeira amostra serão disponibilizados na quinta-feira.
Segundo o diretor-geral do Dmae, Antônio Elisandro de Oliveira, as análises enviadas a São Paulo investigavam apenas a presença de substâncias e compostos voláteis, já que os testes para verificar a presença de bactérias podem ser feitos em laboratórios locais. Ele disse também que não se pode afirmar, por essas análises, que a toxicinas produzidas pela bactéria actinomiceto, encontrada em grande quantidade na casa de bombas da Trensurb e na casa de bombas número 5 do Departamento de Esgotos Pluviais (DEP), tenha relação com o problema.
– A análise vai continuar. Estamos buscando laboratórios que possam refinar ainda mais o processo de análise porque, nesses casos, estamos falando de uma concentração muito pequena, de nanogramas – afirma Oliveira.
Assumindo que o ponto onde a água é captada hoje, junto ao Cais Navegantes, está longe do ideal, a prefeitura deu início ao processo de licenciamento ambiental junto à Fepam para alterar o ponto de captação supostamente mais afetado pela poluição. A água desse local abastece os sistemas São João e Moinhos de Vento (regiões Norte e Central).
O novo ponto seria no Rio Jacuí, próximo ao Saco do Ferraz, onde a qualidade da água bruta é melhor do que no Guaíba. A iniciativa inaugura um horizonte possivelmente mais seguro para o abastecimento de parte da Capital, mas só a longo prazo: a obra, que não deve ter início neste ano, levará pelo menos dois anos para ser concluída, segundo o diretor do Dmae. O investimento é estimado em R$ 150 milhões.
Especialistas indicam análise minuciosa no Guaíba
De acordo com a engenharia Química da UFRGS Liliana Amaral Féris, o próximo passo a ser tomado pelos órgãos responsáveis pela qualidade da água em Porto Alegre deve ser analisar o caminho percorrido pela água desde a pré-captação até o pós-tratamento, pois, dessa maneira, é possível identificar onde ocorre a poluição.
– Como a água é um solvente universal, diversas substâncias podem se somar em diferentes pontos do sistema de abastecimento da cidade. A amostragem em lugares específicos pode camuflar os pontos que geram as anormalidades no líquido. Às vezes, uma bactéria A se soma com uma bactéria B em um ponto específico do sistema, comprometendo todo o processo. Isso é que chamamos de poluição difusa – explicou.
O engenheiro civil Carlos Bulhões Mendes, do Instituto de Pesquisas Hidráulicas da UFRGS, acrescentou que a dificuldade em analisar o problema se encontra na grande quantidade de rios que desaguam no Guaíba:
– O Guaíba é um grande "liquidificador". As poluições de cinco rios desaguam nele (o Jacuí, o Taquari, o Caí, o Rio dos Sinos e o Gravataí), dificultando no processo de identificação do problema. O que causa mais estranheza é a demora na solução desse problema.
Água é potável, reforçam Fepam e Dmae
O Dmae informa que reforçou o estoque de carvão ativado, que continuará sendo usado no tratamento de água – assim como o dióxido de cloro, que, desde que o problema se intensificou, é usado no tratamento 24 horas por dia.
Mesmo com o projeto de mudança de ponto de captação, o que indica que a água captada no local atual não é de boa qualidade, Dmae e Fepam ressaltam que os parâmetros de potabilidade continuam atendendo ao que é exigido pelo Ministério da Saúde.