Por seis meses, ZH investigou como o DEP fiscaliza os serviços prestados por empresas que deveriam manter limpos os equipamentos de drenagem em Porto Alegre. Sem controle, os serviços são mal feitos e superfaturados, com prejuízos aos cofres públicos e reflexos para a população, que sofre com alagamentos decorrentes de temporais.
O descontrole sobre o que é feito por empresas contratadas pelo DEP deixa nas ruas um rastro de serviços de má qualidade, pagos sem a devida fiscalização. Zero Hora encontrou pelo menos dois exemplos de trabalho mal executado no bairro Anchieta, em Porto Alegre.
São casos em que o serviço ruim contribui para piorar o estado de ruas que já sofrem com alagamentos e aumentar o risco para pedestres. Um deles envolve a ação da Cooperativa de Trabalhadores Autônomos das Vilas de Porto Alegre Ltda (Cootravipa) em um equipamento de drenagem (ED) existente na esquina das avenidas dos Estados e Torquato Severo.
Em 3 de fevereiro, quando ZH esteve no local pela primeira vez, o ED em questão era apenas uma tampa de concreto largada sobre uma parte da calçada que é de terra e grama. Junto a ela havia um fradinho caído – uma espécie de pequeno poste de concreto usado sobre calçadas para evitar estacionamento ou passagem irregular de veículos. Pela localização, distante do meio-fio da rua, a tampa parecia ser um poço de visita.
Na manhã de 18 de abril, uma equipe da Cootravipa trabalhou no local e aquela tampa foi transformada em bueiro. Com cimento foi criada uma área de captação de água da chuva, típica de bocas de lobo. Chamou a atenção terem sido deixados no local restos de terra, cimento e pedras, material que facilmente pode ser arrastado pela chuva para dentro de bocas de lobo, causando entupimentos. Cinco dias depois do serviço, choveu e o local alagou completamente, indicando que o bueiro seguia entupido, apesar do serviço feito pela Cootravipa. A água ficou acumulada dentro do bueiro por dias.
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Reparo feito ao lado de equipamento danificado
Outro exemplo de ação com falhas na execução foi flagrado por ZH em 15 de abril, dia em que uma equipe da Construtora Minosso trabalhava em um trecho das ruas Vitor Valpírio e João Carlos More. Tratava-se de uma obra de reconstrução de rede de esgoto pluvial. Bem ao lado de onde a Minosso começou o trabalho, na Avenida Severo Torquato, havia um equipamento de drenagem com a tampa completamente destruída, situação que se mantinha igual até o fechamento desta reportagem. É, no mínimo, curioso que uma obra paga pelo DEP tenha sido aprovada sem que o fiscal percebesse o problema logo ao lado. O buraco exposto sobre o passeio representa risco para pedestres, além de permitir que lixo de grande volume caia na rede, causando entupimento.
Outro detalhe a chamar a atenção foi a não-colocação de asfalto em parte do trecho em que a obra foi realizada, na Rua João Carlos More. Conforme comerciantes da região, tudo foi escavado para a realização do serviço, mas apenas um pedaço da rua recebeu cobertura na conclusão do trabalho. A população fez queixa à prefeitura sobre a má-finalização da obra. Havia expectativa de que os paralelepípedos retirados das ruas em obra fossem repostos.
A Minosso voltou em 4 de maio para reparos. Um trecho da Rua Vitor Valpírio recebeu reforço na camada de asfalto e a parte que ficara sem a cobertura, na João Carlos More, foi completada.
A necessidade de reparos logo depois de concluído um trabalho também aponta para desperdício de dinheiro público. Com empresa instalada na Vitor Valpírio, Hamilton Mancuso Junior, contatou órgãos da prefeitura pedindo uma solução adequada para a via:
– Nos disseram que devia ser refeita a cobertura de paralelepípedo. Mas usaram asfalto. Estamos aguardando.
Desde 2011, segundo dados do Tribunal de Contas do Estado, a Minosso recebeu R$ 59,9 milhões de órgãos municipais por trabalhos como execução de redes de esgoto sanitário e serviços de reconstrução e implantação de redes e galerias de esgoto pluvial.
A Cootravipa tem diversos contratos com o município para prestar serviços variados, tendo recebido da prefeitura, entre 2011 e 2016, R$ 296,9 milhões, conforme dados do site do Tribunal de Contas do Estado. A limpeza de EDs é feita dentro do contrato que tem como objeto a "execução de serviços de manutenção e conservação corretiva do sistema pluvial". Há um contrato desse tipo para cada uma das quatro seções do DEP: Centro, Sul, Norte e Leste.
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