– Ô, seu Paulo. Vê aquela minha moranga no capricho!
O pedido na banca instalada na calçada da Rua Vicente Lopes Santos, bairro Menino Deus, retrata uma proximidade entre consumidores e comerciantes quase em extinção na Capital, mas que resiste em um modelo de mercado antigo e, mesmo em tempos de crise, próspero.
Do Humaitá à Restinga, são 50 feiras em Porto Alegre – a mais recente, foi inaugurada no começo do mês no bairro Auxiliadora –, e há associações de moradores solicitando abertura de novas. Embora não tenha números que comprovem o crescimento, o diretor da Divisão de Fomento Agropecuário da Secretaria de Produção, Indústria e Comércio (Smic), Antonio Bertaco, diz que as vendas têm aumentado, e credita isso à busca por melhores preços e por qualidade.
Veja onde ficam e os horários das feiras:
Mas para Carlos Alberto Andrade de Souza, feirante há 42 dos seus 56 anos, é justamente o contato entre vendedores e freguesia que estimula o movimento nos corredores improvisados no meio da rua. Outro feirante antigo, o agricultor do Lami Eliseu Rosa da Silva, mais conhecido como tio Juca, 72 anos, concorda, e identifica até mesmo uma carência do "povo da cidade" por um atendimento mais pessoal.
– Quem vai em feira gosta de conversar. Às vezes trazem sementes, trazem mudas, e tem aquela conversa boa – conta.
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Para os clientes, o contato semanal com os mesmos comerciantes gera mais confiança na qualidade do produto adquirido.
– Eu conheço os vendedores da feira por nome, e eles geralmente sabem o que eu quero. Eu sei que eles não vão me vender uma coisa ruim – diz Sthefany Fattori Selli, 18 anos, que herdou da mãe o hábito de fazer feira no bairro Santo Antônio.
Na Capital, as feiras são classificadas como modelo e mercadão do produtor, onde trabalham produtores e comerciantes, e feiras ecológicas, essencialmente formadas por produtores que vendem alimentos sem agrotóxico. As feiras modelo têm até mesmo uma moeda própria: uma banca com máquinas de cartão de crédito e débito troca o valor requisitado pelo cliente por cédulas de R$ 0,50 a R$ 10 da circulante.
A ecológica da Redenção é uma das mais tradicionais de sábado, e lota de gente, cores e cheiros, além de parecer um desfile de carrinhos de feira. É justamente por esse excesso de informações que se apaixonou a empresária Graziela de Paula, 32 anos. Faz um ano que ela decidiu substituir o supermercado por feiras. Levando as sacolas de pano fabricadas por sua empresa, fica satisfeita em produzir menos lixo e julga mais sustentável comprar direto do produtor – ela vai primeiro na feira ecológica e, o que faltar, busca nas feiras modelo.
– É bom comprar o que vem direto da terra – destaca.
O ZH Pelas Ruas visitou duas feiras modelo, uma ecológica e um mercadão do produtor, e colheu algumas dicas com frequentadores:
- Para quem vai à feira modelo da Vicente Lopes Santos, no Menino Deus, a aposentada Maria Regina Garavelo, 55 anos, tem duas dicas. A primeira é o pastel de feira – literalmente. Tem de queijo, carne, frango, presunto, calabresa ou chocolate, e custa R$ 4. A outra dica é a banana da banca da dona Elena. Há 30 anos nas feiras da Capital, Elena Isabel da Silva Borges, 60 anos, e o marido Luis Carlos Borges, 66 anos, criaram os filhos vendendo banana. E escalaram a prole, depois de crescida, para trabalhar no negócio da família também.
- A funcionária pública Paula Schiavon, 42 anos, frequenta a feira ecológica da Avenida José Bonifácio, junto à Redenção, há um ano e meio, e indica o pólen apícola, que encontra em bancas que vendem mel. Ela usa o produto nos sucos que prepara em casa.
- Na feira modelo da Avenida Ceres, perto da PUCRS, a contadora Rosângela dos Santos, 55 anos, vai praticamente de caravana com as amigas, munida de uma lista gigante. O que não pode faltar na sacola dela são os caquis mel, que precisam estar bem maduros para não ter aquela sensação adstringente (quando parece que prende a língua).
- O mercadão do produtor do Largo Zumbi dos Palmares (na Cidade Baixa) no sábado de manhã é uma das maiores feiras da cidade. Além dos produtos hortifrutigranjeiros, tem doces tentadores e até caldo de cana. Para o advogado Roberto Abreu, 55 anos, vale a pena comprar queijo colonial e queijo parmesão para ralar, pela qualidade e pelo preço.