Cristian Luciano Gustavo da Rosa, 18 anos, não tinha nem tênis para ser enterrado quando o pai, o quadrista Giovanni Dias da Rosa, 43 anos, o reconheceu, vestido só de cuecas e atingido por quatro disparos - no braço esquerdo, na nádega, na boca e na lateral da cabeça - em uma maca do HPS. Já era final de noite da terça-feira e a cidade ardia em chamas em uma série de ataques a ônibus na Zona Sul de Porto Alegre.
O jovem, apontado pela Brigada Militar como um expoente do tráfico no Bairro Cascata, foi morto durante a ação da Companhia de Operações Especiais (COE), do 1º BPM, considerada pela polícia como um possível estopim de para os incêndios em coletivos. Segundo os PMs, houve um tiroteio e o jovem teria sido perseguido entre as ruas da Igreja e Menino Deus. Alegam que o socorreram em uma das viaturas ainda ferido, mas chegou sem vida ao hospital.
A família contesta essa versão e nesta sexta falou com exclusividade ao Diário Gaúcho.
- Meu filho nunca foi anjo. Era assaltante? Era. Passou pela Fase? Sim. Mas nunca foi traficante e muito menos gerente do tráfico. Não merecia morrer desse jeito. Eles (policiais militares) mataram o meu filho - desabafa a doméstica Ana Cristina da Silva Gustavo, 37 anos.
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Ela e o marido agora devem ser ouvidos pela 1ª DHPP, acrescentando algumas dúvidas ao caso que ainda não está claro aos investigadores.
- O local do crime foi descaracterizado pelos policiais militares. Estamos fazendo todos os levantamentos periciais possíveis e à procura de testemunhas - explica o delegado Rodrigo Pohlmann.
Houve tiroteio?
E a primeira resposta que os peritos terão de responder é clínica. Desde que nasceu, Cristian tinha o braço direito paralisado. Conforme os dois primeiros PMs ouvidos pela polícia, depois de ser perseguido e atingido no braço esquerdo e na nádega, o jovem teria se virado apontando um revólver calibre 38 - apreendido naquela noite com duas cápsulas deflagradas - e aí, como reação, teria sido atingido pelos tiros na região da cabeça.
A polícia já solicitou exames residuográficos no corpo de Cristian para determinar se, de fato, ele atirou contra os policiais.
O socorro na viatura
O segundo ponto ainda não esclarecido pela investigação é o que aconteceu após o suposto tiroteio. Em depoimento, policiais militares admitiram que Cristian Luciano poderia já estar morto no local, mas alegam tê-lo levado em uma das viaturas por pressão da comunidade.
Na ocorrência, a informação inicial da BM era de que o jovem foi levado ao Hospital Divina Providência, mas não houve nenhum registro de entrada dele neste local. Foi parar no HPS e, segundo o boletim médico, já chegou sem vida. E sem as roupas que vestia quando foi atingido no tiroteio.
A polícia já solicitou os relatórios de GPS das viaturas envolvidas na ocorrência.
No 1º BPM, também foi instaurado um inquérito policial militar para apurar a conduta dos PMs. De acordo com o comandante do batalhão, tenente-coronel Kleber Rodrigues Goulart, até o momento não foi constatada nenhuma irregularidade na ação dos quatro PMs envolvidos na ocorrência.
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