Tramita na Câmara de Vereadores um projeto de lei que divide opiniões de ativistas da causa animal: a responsabilização do resgate emergencial de cães e gatos de rua pela prefeitura de Porto Alegre.
De autoria da vereadora Lourdes Sprenger (PMDB), a iniciativa, na prática, tornaria obrigatório o recolhimento dos bichos pelo poder público - que, atualmente, não tem o compromisso legal de cumprir o serviço. A Secretaria Especial dos Direitos Animais (Seda) alega que a medida irá incentivar o abandono.
Pelo projeto, a Seda faria o recolhimento de animais que tenham sido atropelados ou espancados, sofram de maus-tratos ou estejam abandonados e de cães bravios soltos, que coloquem em risco a população, além de fêmeas grávidas e filhotes. O resgate estava previsto entre as atividades da secretaria na sua criação, em 2011, mas, um ano e meio depois, o artigo acabou derrubado na Câmara.
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- Se uma secretaria trouxe para si a responsabilidade pela causa animal, ela tem de ter fôlego para atendê-la. Não queremos que, agora, toda vez que se veja um animal abandonado se ligue para a Seda e diga: "resgate". Não. Se tratam de casos excepcionais - defende Lourdes.
Assim, a vereadora afirma que não há risco de superlotar a Unidade de Medicina Veterinária (espécie de canil municipal onde os bichos são tratados) e incentiva um maior esforço da prefeitura em doar os animais. Atualmente, cerca de 200 cães e gatos recolhidos mediante denúncia ao telefone 156 são atendidos no local - e outros 200 estão em espécies de albergues. Porém, a secretária adjunta da Seda, Bernadete Moog, é contrária à medida:
- Canil ou unidade de medicina veterinária não devem ser depósitos. Entendo que não deve haver o recolhimento pelo simples recolhimento porque vai incentivar o abandono. O animal precisa ir para uma dessas unidades quando realmente precisar de tratamento, e não para ficar lá eternamente - diz.
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- Se formos a favor (do projeto de lei), estamos indo contra nós mesmos, porque aquela pessoa que poderia cuidar ou buscar um lar para aquele animal estaria o abandonando.
Para Lourdes, casos recentes em Porto Alegre indicam o descaso no atendimento por parte da Seda. Entre eles, a vereadora cita um episódio que ganhou visibilidade pelas redes sociais: a morte da cadela Twid, arremessada de um prédio pela dona na Rua Marechal Floriano. Conforme a vereadora, a secretaria tinha conhecimento dos maus-tratos desde 2012 e pelo menos cinco protocolos haviam sido abertos. À época, a Seda emitiu nota esclarecendo que, tão logo tomou conhecimento da morte do animal, emitiu multa superior a R$ 2,2 mil à tutora do cão Twid e que a equipe de fiscalização havia feito visitas ao local, mas que não encontrou os responsáveis.
Pelo 156, a prefeitura recebe cerca de 50 denúncias envolvendo animais a cada dia - e, na contramão, trabalha com apenas nove fiscais na rua para atendê-las e 11 veterinários na unidade de tratamento. A secretária adjunta alega que, em função da alta demanda, nem todos os episódios são socorridos de imediato. Contrária ao recolhimento dos bichos, Bernardete defende a castração dos animais na tentativa de diminuir a reprodução (entre 2013 e 2014, foram realizadas 9,2 mil pela secretaria) e o trabalho de conscientização junto à população para evitar casos de maus-tratos - considerados crime no país, segundo a Lei de Contravenções Penais.
A negação da Seda à medida, garante Bernardete, não se baseia no custo extra que o Executivo desprenderia com o recolhimento, mas principalmente na inexistência de espaço físico para acomodar os cães e gatos - já que, atualmente, a secretaria precisa do auxílio de protetores para acolhê-los e tratá-los. Entre ONGs, porém, o projeto do Legislativo é visto com bons olhos.
- O objetivo não é incentivar o abandono, nem tampouco que a Seda seja responsável por um recolhimento sem nenhum critério. É um recolhimento específico. O poder público se responsabilizar por algumas situações que são limite, acho interessante porque existe verba e material de manejo que as ONGs não têm - avalia a dentista Marcia Simch, uma das fundadoras da ONG Bicho de Rua.