A série de reportagens "Os Segredos de Brizola" foi publicada em Zero Hora em setembro de 1999
Às 17h15min do dia 6 de setembro de 1979, uma quinta-feira ensolarada, Brizola pisou em solo brasileiro pela primeira vez depois de 15 anos, em Foz do Iguaçu (PR). O avião bimotor Piper, prefixo ESO, que o trouxe de Assunção foi conduzido por Manoel Leães, o mesmo piloto que 15 anos antes havia levado o líder trabalhista das areias de Cidreira para o exílio no Uruguai.
Quando o retorno de Brizola ao Brasil completou 20 anos, em 1999, Zero Hora reconstituiu a trajetória do ex-governador no exílio. Uma entrevista exclusiva foi dada pelo líder trabalhista e é relembrada por GZH na data em que sua morte completa 20 anos.
Os 15 anos de exílio exigiam uma recepção apoteótica, caravanas e discursos inflamados. O mais novo anistiado a desembarcar no Brasil em processo de abertura política, no entanto, optou pela prudência. Apesar da recepção calorosa, que reuniu milhares de pessoas em São Borja, Brizola manteve-se cauteloso em suas declarações e discursos.
Com o Paraguai em plena ditadura militar, a passagem de Brizola havia sido cercada de todos os cuidados. Sereno Chaise chegara ao país dias antes do regresso do amigo para conversar com autoridades. Entre as exigências para o desembarque estava a proibição da presença de jornalistas. Uma comitiva de 27 pessoas partiu de Nova York rumo ao Brasil. Durante uma escala técnica no Aeroporto de Dulles, em Washington, parte do grupo se perdeu, entre eles a filha de Brizola, Neusa Maria.
No início da manhã de 7 de setembro, o ex-exilado político embarcou no bimotor pilotado por Manoel Leães para a última etapa do retorno. No voo ainda estavam Neusa, o filho José Vicente, a neta Laila, João Vicente, filho do ex-presidente João Goulart, e o senador Pedro Simon (MDB).
Chegar por São Borja era um pedido de Neusa,que pretendia visitar os túmulos dos pais e do irmão e ex-presidente João Goulart. Brizola considerava menos perigoso ingressar pelo Paraguai do ditador Alfredo Stroessner do que pela Argentina, também em pleno regime militar.
Em São Borja, o avião do ex-governador pousou na pista da Granja São Vicente que já havia pertencido ao seu cunhado João Goulart e na época administrada pelo sobrinho João Vicente.
O auge de seu retorno foi marcado por um comício no centro do município. Bancadas de deputados estaduais e federais do MDB do Rio Grande do Sul, ex-líderes de organizações guerrilheiras, antigos e novos trabalhistas estavam presentes à grande recepção. O aparente clima de união escondia um fato evidente nos bastidores: a nova oposição dificilmente se manteria unida. Os rachas eram visíveis já nas conversas em São Borja. Inúmeras vertentes ideológicas começavam a surgir na esquerda.
O discurso de chegada de Brizola ficou aquém do esperado. Na época, muitos emedebistas viram nas declarações do ex-governador críticas à atuação do MDB frente ao regime militar. Depois de passar alguns dias em São Borja para se informar da nova realidade, Brizola deslocou-se para Porto Alegre. Sereno e Wilson Vargas haviam planejado um roteiro de comum acordo como ex-governador. Uma caravana passaria por vários municípios e chegaria à Capital com milhares de carros. O roteiro foi cancelado na última hora.
De Porto Alegre, Brizola seguiu para o Rio de Janeiro semanas depois.
Rompimento durante debate
No dia 6 de março de 1980, durante um debate na TV Guaíba, o ex-governador Leonel Brizola e o senador Pedro Simon (MDB) formalizaram, ao vivo, o rompimento.
— O senhor deveria renunciar e colocar-se sob julgamento do povo em 1982. Um senador não pode mentir — disse Brizola durante o programa.
O ex-governador sustentava que Simon havia se comprometido ainda em Nova York, em julho de 1979, a aderir ao PTB tão logo fosse reinstaurado o pluripartidarismo. O senador sempre negou que tivesse prometido se aliar a Brizola no partido trabalhista reorganizado.
Os dois líderes oposicionistas deixaram de se falar por muitos anos, apesar de estarem juntos nos palanques de Luiz Inácio Lula da Silva, no segundo turno da eleição presidencial de 1989, e de Alceu Collares, no segundo turno do pleito para o governo do Estado, em 1990.
No dia 16 de novembro de 1992, esboçaram uma reaproximação ao participarem de um encontro com líderes do PMDB e do PDT gaúchos em Porto Alegre.