Os ministros Luís Roberto Barroso, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes voltaram a criticar, nesta quinta-feira (23), as propostas em votação no Congresso para alterar as regras de funcionamento da Corte.
Antes da sessão de julgamentos, Barroso afirmou que as mudanças "não são necessárias e não contribuem para a institucionalidade do país".
— Não há institucionalidade que resista se cada setor que se sentir contrariado por decisões do tribunal quiser mudar a estrutura e funcionamento do tribunal — criticou.
Não há institucionalidade que resista se cada setor que se sentir contrariado por decisões do tribunal
LUIS ROBERTO BARROSO
presidente do STF
O ministro afirmou ainda que não vê justificativas legítimas para reformar o STF e que há demandas mais "importantes e urgentes" para o país.
— Nada sugere que os problemas prioritários do Brasil estejam no Supremo Tribunal Federal. Até porque as mudanças sugeridas já foram acudidas, em sua maior parte, por alterações recentes no próprio Regimento do Supremo — seguiu.
O STF, na gestão da ministra Rosa Weber, em dezembro de 2022, já aprovou uma emenda que alterou o regimento interno e determinou que as decisões individuais precisam ser submetidas ao crivo plenário. A mudança foi adotada com a justificativa de reforçar a colegialidade da Corte.
Os pedidos de vista — quando os ministros requisitam mais tempo para analisar o processo e suspendem o julgamento — também foram limitados ao prazo de 90 dias. Desde então, se o ministro não observa o prazo, a ação é liberada automaticamente para ser incluída novamente na pauta.
Na prática, o tribunal, ao promover as mudanças por iniciativa própria, se adiantou a tentativas de interferência externa. O movimento, contudo, não foi suficiente para conter investidas de deputados e senadores.
As declarações de Barroso vêm um dia após o Senado aprovar, em dois turnos, por 52 votos a 18, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que limita os poderes de ministros do STF. O texto estabelece que os magistrados ficarão impedidos de suspender por meio de decisões individuais a vigência de leis aprovadas pelo Legislativo. A medida também vale para leis analisadas pelos tribunais estaduais.
— É inevitável que o Supremo desagrade segmentos políticos, econômicos e sociais importantes, porque ao tribunal não é dado recusar-se a julgar questões difíceis e controvertidas. Tribunais independentes e que atuam com coragem moral não disputam torneios de simpatia — reagiu Barroso.
"Essa casa não é composta por medrosos", diz Mendes
Mendes disse que o teor da proposta "é mera reprodução de PEC que já havia sido rejeitada pelo Parlamento em 2020" e ressaltou que o Supremo respeita a separação dos Poderes. "Mesmo quando isso não ocorre, a menção à separação dos Poderes ocorre de forma implícita".
O decano da Corte disse, ainda, que a independência judicial é o "fundamento básico do Estado de Direito" e que a separação dos Poderes "não pode ser objeto de emenda constitucional que busque aviltá-la".
— Este Supremo, sempre atento às suas responsabilidades institucionais e ao contexto que o cerca, está preparado, não tenho a menor dúvida, para enfrentar uma vez mais, e caso necessária, investidas desmedidas e inconstitucionais, agora provenientes do poder Legislativo — afirmou. — Esta Casa não é composta por covardes — emendou Mendes
"Tacão autoritário"
Mendes traçou um paralelo entre os ataques sofridos pela Corte durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro e a proposta aprovada no Senado que visa limitar os poderes dos ministros. Ele disse que o STF "não sucumbiu ao populismo responsável pelo 8 de janeiro" e que a Corte "não haverá de se submeter ao tacão autoritário, venha de onde vier".
Curiosamente, a PEC não impede decisões monocráticas em habeas corpus, mecanismo usado por defesa de políticos
GILMAR MENDES
ministro do STF
— É preciso altivez para rechaçar esse tipo de ameaça de maneira muito clara — afirmou, em duro recado dado no início da sessão plenária de hoje.
Ele disse que a PEC "não possui qualquer justificativa plausível" e que a tentativa de alteração constitucional "interfere no ato de julgamento". Ele criticou, ainda, a "estranha prioridade" da Casa em apontar as decisões monocráticas do STF como um problema para o País e acusou o Congresso de não dar "nenhuma resposta em relação a problemas que são urgentes para a democracia".
O ministro também lembrou a atuação do STF durante a pandemia, por exemplo, e disse que se a PEC já estivesse em vigor, o tribunal seria impedido de interromper "políticas lesivas". Ele ainda acrescentou que "curiosamente, a PEC não impede decisões monocráticas em habeas corpus, mecanismo usado por defesa de políticos".
Moraes diz que PEC do Senado esconde insinuações, intimidações e ataques ao Judiciário
São importantes instrumentos da democracia, mas não quando escondem insinuações, intimidações e ataques à independência do Judiciário
ALEXANDRE DE MORAES
ministro do STF
Moraes, disse nesta quinta-feira (23), que as PECs "são importantes instrumentos da democracia, mas não quando escondem insinuações, intimidações e ataques à independência do Judiciário, e principalmente a independência deste tribunal".
Ele destacou que a Constituição "proíbe qualquer medida contra separação de Poderes" e que "na pandemia, houve necessidade de decisões liminares, referendadas sempre pelo plenário do STF".
O ministro também reforçou a fala do ministro Gilmar Mendes, que disse que "esta Casa não é composta por covardes e medrosos".