A manifestação do dia 4 de junho, convocada pelo Movimento Brasil Livre (MBL) e parlamentares de oposição ao governo Luiz Inácio Lula da Silva em protesto à cassação do mandato de deputado federal de Deltan Dallagnol (Podemos-PR), virou alvo de boicote de Jair Bolsonaro (PL) e apoiadores. O gesto expõe um racha na direita.
Na quinta-feira (25), durante o Encontro Nacional dos Presidentes do PL, em Brasília, Bolsonaro pediu ao público que não vá ao protesto, com a justificativa de poupar esforços em prol da CMPI do 8 de Janeiro, cujos trabalhos foram iniciados nesta semana no Congresso. A primeira reunião do colegiado foi marcada por tumulto e bate-boca entre parlamentares.
— A CPMI é muito importante para nós, mais do que qualquer outro movimento que porventura alguém queira fazer por aí. E até peço, não façam. Não façam do outro... (inaudível). O mais importante no nosso momento é a CPMI. Estou vendo as pessoas (inaudível) querendo marcar reunião, povo na rua. Eu peço: não façam isso — disse Bolsonaro na ocasião, ao lado de Valdemar Costa Neto, presidente do PL.
O vídeo com o trecho de seu discurso foi publicado por Sérgio Camargo (PL-SP), ex-presidente da Fundação Cultural Palmares e apoiador de Bolsonaro. Ele foi candidato a deputado federal nas últimas eleições, mas ficou como suplente.
O discurso tem reverberado nas redes sociais como um pedido explícito do ex-presidente de boicote à manifestação do dia 4 de junho. Uma das figuras que replicou o material é Fabio Wajngarten, advogado, assessor pessoal e porta-voz de Bolsonaro.
Wajngarten publicou também na quinta-feira, em uma rede social, um texto afirmando que "é necessário avaliar quem esteve de fato ao lado do governo nos últimos quatro anos antes de sair apoiando e promovendo manifestação oportunista. A direita teima em ser vagão e rebocada por quem nunca conseguiu ser locomotiva."
À reportagem, o ex-secretário de Comunicação Social de Bolsonaro confirmou que a crítica foi direcionada à manifestação do 4 de junho e à deputada Carla Zambelli (PL-SP), que chamou seguidores para o ato. Na quinta-feira à tarde, ela fez uma publicação apelando aos seguidores em favor de Dallagnol.
— Hoje é o Deltan, amanhã pode ser o Nikolas (Ferreira) ou eu... Vocês não gostariam que esses movimentos também fossem às ruas por nós? — questionou.
Por volta das 21h, Zambelli abriu uma live na qual afirmou que foi um erro não ter falado com Bolsonaro antes.
— Estão me chamando de traidora. Eu sei que não sou. Erramos em não conversar com Bolsonaro antes. Se ele falou para não ir, não vamos. Mas vou pedir a vocês, não desistam do Deltan Dallagnol — reforçou.
Um dos parlamentares que ajudaram a organizar o ato previsto para o dia 4 de junho é Carlos Jordy (PL-SP), líder da oposição na Câmara. Questionado sobre as declarações do ex-presidente, o parlamentar disse que "Bolsonaro é um político experiente e o maior líder da oposição do Brasil".
— Ele sabe o que é o melhor nesse momento — afirmou.
A reportagem também procurou Deltan Dallagnol e o deputado federal Kim Kataguiri (União Brasil-SP), que é um dos líderes do MBL, mas não obteve retorno.
Nos bastidores, corre o rumor de que o protagonismo recente de Dallagnol teria incomodado Bolsonaro. Desde que foi cassado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), no dia 17, o ex-procurador da Lava-Jato tem participado de manifestações e está se articulando para reaver o mandato. No domingo (21), o ato em que ele participou em Curitiba teve o apoio do MBL. O grupo rompeu com Bolsonaro depois da eleição de 2018.
A proximidade de Bolsonaro com o presidente do PL, ao lado de quem discursou no evento de líderes do partido, também incomoda alguns setores da direita. Valdemar foi preso e condenado no Mensalão. Ele chegou a ser investigado na Lava-Jato, e hoje o PL, sigla que está sob seu comando, move uma ação de investigação judicial eleitoral contra Sérgio Moro, ex-juiz da operação e aliado de Dallagnol.
Como fica o ato
À reportagem, o MBL confirmou que a manifestação do dia 4 de junho está mantida. O grupo decidiu na sexta-feira (26) mudar o local. Do vão do Masp, que fica na Avenida Paulista, o ato mudou para o Largo da Batata, em Pinheiros, na zona oeste da capital paulista.
Em nota, o movimento justificou a mudança: "Fazer manifestação no domingo está sendo muito complicado por causa de a Paulista estar fechada. As últimas vezes foram muito problemáticas, além do curto período de tempo para produção, estruturação e conversas com a polícia".
Com o mote "Democracia, Justiça e Liberdade", a manifestação é contra gestos recentes da gestão petista, interpretados pelo grupo como "perseguição a inimigos". "Começando com a farsa de Flávio Dino, passando pelo PL 2.630 (PL das Fake News), o PL da Censura, e chegando agora à cassação de Deltan, sabemos que o PT não vai parar", diz o MBL.