A seis dias da posse de Gabriel Souza (MDB) como vice-governador do Rio Grande do Sul, o diretório gaúcho do MDB ainda tem feridas abertas e distanciamentos, mas a temperatura da animosidade baixou.
Por estreita margem, a convenção do partido, em julho, aprovou a indicação de Gabriel, que inicialmente era pré-candidato a governador, como vice na chapa do reeleito Eduardo Leite (PSDB). Uma ala da legenda, comandada pelo prefeito Sebastião Melo (MDB), pelo deputado federal Osmar Terra (MDB) e por outros expoentes da velha guarda, se rebelou. Houve tensão nos bastidores, troca de farpas públicas e ofensas nos bastidores.
No segundo turno da eleição, o grupo de Melo anunciou formalmente apoio ao então candidato bolsonarista Onyx Lorenzoni (PL). Apostando alto, Melo pediu votos contra a chapa do MDB na propaganda eleitoral e também aboletou-se em um caminhão de som que circulou pelas ruas de Porto Alegre pedindo votos no 22, número de urna do PL.
A ala de Melo acusava Gabriel de ter se lançado candidato a governador já com o propósito de ser vice de Leite. Já o grupo do vice-governador eleito falava reservadamente em infidelidade partidária, desrespeito à decisão soberana da convenção e de levar os casos à comissão de ética.
A fervura começou a baixar poucos dias após o fim do segundo turno. Melo tomou a iniciativa de telefonar para Leite e Gabriel para parabenizar pela vitória e se colocar à disposição para manter a relação institucional. Depois daquilo, o debate foi arrefecendo e passou a prevalecer o discurso de que a eleição acabou. Hoje, fala-se em tentar curar feridas.
Presidente estadual do MDB e prefeito de Rio Grande, Fábio Branco afirma que não existe nenhum procedimento na comissão de ética da sigla para análise de condutas. Ele ainda rebate a hipótese de lideranças que saíram derrotadas no desgastante processo, como Melo e Terra, deixarem o MDB.
— Estou trabalhando ao máximo para que tudo possa voltar ao normal. Temos atuado em reuniões da direção executiva. Somos um partido democrático e respeitamos a todos. Nosso trabalho é de recomposição. Não pensamos em retaliação, divisão nem saída de ninguém. Todos são importantes para o futuro — diz Branco, projetando as eleições municipais de 2024.
Gabriel saiu fortalecido da eleição e, atualmente, tem maioria do MDB, o que deverá ser consolidado e ampliado ao longo dos quatro anos de governo. A máquina estadual deverá ajudar a solidificar sua liderança no embate geracional do partido. Nos bastidores, Gabriel tem feito manifestações semelhantes às de Branco. Ele tem reiterado que a eleição ficou para trás e que não haverá caça às bruxas.
Uma consequência inescapável das mágoas, ao menos por enquanto, é o fechamento de portas do Palácio Piratini para os apoiadores de Onyx. É o caso do deputado estadual Tiago Simon (MDB), que esteve ao lado do candidato do PL. Sem conseguir a reeleição à Assembleia Legislativa, ele está cotado para assumir uma secretaria na prefeitura de Porto Alegre.
No diretório da Capital, o discurso também é de pacificação, embora os distanciamentos políticos sejam reconhecidos.
— Não é a primeira nem a última vez que o MDB tem dissidências internas. Hoje o debate interno deu uma arrefecida. É claro que ficaram cicatrizes. Algumas podem ser vencidas. Outras, não. O processo é de reconstruir pontes internas — diz Alexandre Borck, presidente do MDB de Porto Alegre.
Sobre o futuro de Melo, ele afirma:
— Não vejo ele saindo do partido. São mais de 40 anos de militância no MDB.
Político próximo ao prefeito, o vereador Idenir Cecchim (MDB) diz que é preciso respeitar o resultado da eleição. Ele recorda que “tudo começou” com uma “briga dentro de casa” entre Gabriel e o deputado federal reeleito Alceu Moreira (MDB). Ambos são da mesma base eleitoral, o Litoral Norte, e foram pré-candidatos a governador pelo MDB. Houve tensionamento, acusações de interferência externa supostamente operada por Leite, e Alceu retirou-se do páreo, em março, quando a derrota ficou iminente na disputa interna. Depois, emedebistas simpáticos à recondução de Leite, casos de José Fogaça, Germano Rigotto e Juvir Costella, passaram a emplacar a tese de Gabriel ser vice. O argumento era fortalecer o centro-democrático e derrotar a direita radical bolsonarista.
— O futuro do partido vai depender dos dois lados. Precisamos de humildade para fazer uma reflexão, ver onde erramos. Não vejo ferida que não possa cicatrizar. Eu gostei da atitude do Melo de telefonar para eles e desejar um bom governo — diz Cecchim.
Ele afirma que vai “permanecer ao lado de Melo” nas decisões futuras, mas assegura que jamais conversaram sobre eventual saída do MDB.
Lideranças da legenda dizem que ainda é cedo para análises definitivas e que é necessário aguardar o início do governo Leite e Gabriel. Outro ponto a ser observado, dizem emedebistas, é a possibilidade de formatação de federação partidária entre MDB, PSDB, Cidadania e Podemos. Essa hipótese, caso concretizada, poderá ter o condão de produzir reacomodação de forças.