O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) modificou o processo de divulgação dos dados relativos aos patrimônios dos candidatos nas eleições de 2022. Para todos os cargos, não é mais possível conferir algumas informações relativas a bens.
Esses dados eram disponibilizados até as eleições de 2020, porém, a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) fez com que o TSE mudasse o entendimento acerca da transparência. Com isso, dados do pleito passado também foram limitados no Sistema DivulgaCandContas, que é aberto à população em geral.
Até o último pleito, marca, modelo, placa, cor e ano de carros eram disponibilizados na relação de bens dos candidatos. No caso do postulante a um cargo político ter ações ou participação em empresas, era possível saber à qual companhia se referiam e mesmo o tamanho de sua participação. Esse detalhamento foi totalmente excluído.
Assim, a relação patrimonial passa a ter um padrão simplificado, contemplando a indicação do bem e o valor declarado à Receita Federal.
O tribunal explica que a modificação está prevista na resolução de 2019, que entrou em vigor com a LGPD, a partir de setembro de 2020. Em nota, a Corte ressalta que "a inibição da publicização do campo 'descrição' decorre de previsão constante no art. 27, I, da respectiva resolução, e foi adotada para evitar exibição de informações desnecessárias (endereços de imóveis, placas de veículos, dados bancários)".
A definição foi reforçada após alegadas ameaças sofridas por candidato eleito suplente de vereador no município de Guarulhos, São Paulo, nas eleições de 2020. Dessa forma, em novembro do ano passado, o TSE decidiu pela retirada, do DivulgaCandContas, dos dados pessoais de Luciano Reginaldo Fulco.
Especialistas avaliam
A decisão, no entanto, é tema de embate por entidades ligadas à transparência de informações que podem ser consideradas de relevância pública. Conforme o advogado especialista na legislação de proteção de dados, Gustavo Chaves Barcellos, existe um vácuo no poder de decisão a respeito da LGPD por parte da Autoridade Nacional de Dados ou da Justiça, incluindo a Corte eleitoral. Para o especialista, haverá prejuízos ao eleitor com a nova regra.
— O que vai preponderar, os interesses da coletividade ou a letra fria da lei, que pode ser adaptada a qualquer contexto do cotidiano? O TSE está se curvando à individualidade e indo de encontro à própria finalidade de tratamento de dados. A corte está garantindo o anonimato para dados que podem, sim, influenciar na escolha do candidato — destaca Barcellos.
Já o advogado especialista em Direito Eleitoral, Roger Fischer, pondera que a decisão do TSE é conservadora, mas avalia que poucos eleitores efetivamente consultam o sistema do tribunal. Ele ainda destaca que não haverá alterações quanto à análise de doações indevidas às campanhas.
— Há uma série de outras informações disponíveis que amparem a escolha do eleitor. E é importante ressaltar que em casos de processos judiciais, como abuso de poder econômico, a exemplo de doações de pessoa jurídica ligada ao candidato, haverá análise específica e tais dados são passíveis de verificação.
Carta
Na última segunda-feira (1), cinco entidades dedicadas à defesa da transparência pública enviaram ao TSE carta aberta contra a omissão de detalhes da declaração de bens dos candidatos.
Para o Fórum de Direito de Acesso a Informações Públicas (que reúne 28 organizações), a Data Privacy, o InternetLab, a Open Knowledge Brasil e a Transparência Brasil, que assinam o manifesto, a alteração representa “um grave retrocesso na transparência das candidaturas e do processo eleitoral”.
No texto dirigido ao presidente e ao vice-presidente da Corte, Luiz Edson Fachin e Alexandre de Moraes, e à juíza ouvidora do TSE, Larissa Nascimento, as entidades apontam que a ocultação das informações prejudica gravemente a fiscalização da sociedade sobre a evolução patrimonial dos candidatos e sobre a veracidade das declarações.
Em audiência realizada pelo TSE em junho deste ano, as entidades já tinham feito alerta semelhante e se manifestaram pela importância da manutenção de informações sobre candidatos de forma constante e transparente, mesmo após o período das eleições.