A juíza Tamara Hochgreb Matos, da 24ª Vara Cível de São Paulo, condenou o presidente Jair Bolsonaro a pagar indenização de R$ 100 mil por danos morais coletivos em razão dos ataques "reiterados e agressivos" do chefe do Executivo a jornalistas, caracterizando os mesmos como "assédio moral coletivo contra toda a categoria". A magistrada viu "grave ofensa à moralidade pública e a valores fundamentais da sociedade e da democracia" e determinou que o montante seja revertido para o Fundo Estadual de Defesa dos Direitos Difusos.
Tamara ainda destacou que a conduta de Bolsonaro é ainda mais grave por ser incompatível com a dignidade da função que ocupa e pela enorme repercussão que encontram suas manifestações em todo o país. Datada desta terça-feira (7) — Dia Nacional da Liberdade de Imprensa —, a sentença acolhe parcialmente pedido do Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo.
"No caso concreto, os ataques reiterados e agressivos do réu à categoria dos jornalistas profissionais, em pronunciamentos públicos e veiculados em suas redes sociais, voltando-se ora contra jornalistas determinados, ora contra a categoria como um todo, de forma hostil, desrespeitosa e humilhante, com a utilização de violência verbal, palavras de baixo calão, expressões pejorativas, homofóbicas e misóginas, evidentemente extrapolam seu direito à liberdade de expressão e importam assédio moral coletivo contra toda a categoria de jornalistas, atentando contra a própria liberdade de imprensa e a democracia, porquanto têm o condão de causar temor nos profissionais da imprensa, muitas vezes atacados moral e até fisicamente pelos apoiadores do requerido, que o têm como exemplo", registrou a magistrada.
Na avaliação da juíza, Bolsonaro tem utilizado o direito à liberdade de expressão de maneira claramente abusiva e de forma absolutamente incompatível com a dignidade do cargo que ocupa. Para Tamara, o chefe do Executivo alega que tal liberdade lhe outorgaria verdadeiro salvo conduto para expressar as suas opiniões, ofensas e agressões contra quem entender.
No entanto, a magistrada entendeu que o presidente se manifesta de "forma hostil e belicosa" contra os jornalistas profissionais, "desprezando-os e desqualificando-os, como categoria e até mesmo como pessoas, visando desmoralizá-los, utilizando-se de termos ofensivos, vulgares e até mesmo ilícitos, incompatíveis com a urbanidade e maturidade esperada de um Presidente da República, e com os princípios da dignidade humana, da moralidade e da impessoalidade que devem nortear o exercício de tal".
"Restou, destarte, amplamente demonstrado que ao ofender a reputação e a honra subjetiva de jornalistas, insinuando que mulheres somente podem obter um furo jornalístico se seduzirem alguém, fazer uso de piadas homofóbicas e comentários xenófobos, expressões vulgares e de baixo calão, e pior, ameaçar e incentivar seus apoiadores a agredir jornalistas, o réu manifesta, com violência verbal, seu ódio, desprezo e intolerância contra os profissionais da imprensa, desqualificando-os e desprezando-os, o que configura manifesta prática de discurso de ódio, e evidentemente extrapola todos os limites da liberdade de expressão garantida constitucionalmente", ponderou.
A magistrada não acolheu pedido para que o presidente fosse proibido de se manifestar de forma ofensiva à profissão de jornalista ou a jornalistas específicos, mas ressaltou que a negativa não implica dizer que o chefe do Executivo possui o direito de ofender, humilhar ou assediar moralmente jornalistas, individualmente ou como categoria — "a tutela jurisdicional que limita a liberdade de expressão somente pode ser concedida diante de alguma violação concreta e atual, e não futura", ponderou, indicando que a intervenção judicial só se dá após eventuais abusos.
"Ademais, a proibição pretendida já está prevista em lei, que veda a manifestação da liberdade de expressão que importe ofensa, humilhação, violação a direitos da personalidade e prática de discursos de ódio, não havendo necessidade de determinação judicial para tanto", registrou ainda.