O subprocurador-geral Lucas Rocha Furtado, do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (TCU), pediu à Corte de contas que suspenda o pregão eletrônico do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), que prevê a compra de 3.850 ônibus rurais escolares com preços supostamente inflados. Como divulgado em reportagem recente sobre o caso, a licitação tem suspeita de sobrepreço de até R$ 732 milhões. O pregão eletrônico está marcado para esta terça-feira (5).
O alerta para o risco de sobrepreço partiu de instâncias de controle e da própria área técnica do fundo, vinculado ao Ministério da Educação (MEC). Documentos do FNDE indicam que o governo aceitou pagar até R$ 567,6 mil por um ônibus de 59 lugares que, segundo a área técnica do fundo, deveria custar, no máximo, R$ 361,8 mil. O edital ainda prevê a aquisição de outros modelos de ônibus, com diferentes capacidades de passageiros.
"O fato descrito é grave e envolve a possibilidade do desvio de assombrosa importância em dinheiro. Mais de R$ 730 milhões em prejuízo ao erário, que podem se converter além disso em prejuízo à democracia, a depender da destinação que, às vésperas do período eleitoral para o pleito nacional, esses recursos venham a ter, como, por exemplo, a composição do chamado 'caixa 2 de campanha'", escreveu Lucas Rocha Furtado na representação que protocolou no TCU nesta segunda-feira (4).
O pedido de suspensão será analisado pelo ministro Antonio Anastasia. Segundo Furtado, as "circunstâncias já bastariam, por si, para demonstrar que a pronta intervenção do TCU se situaria entre as atuações mais importantes às quais essa Corte de Contas já se dedicou". Ele ressaltou que é preciso considerar também que "se trata de possível desvio de recursos da educação, cujo mal funcionamento por carência de recursos causa prejuízos prolongados à sociedade e de difícil reparação".
No documento, o subprocurador-geral lembra o recente escândalo de corrupção envolvendo pastores lobistas no Ministério da Educação, que, segundo vários prefeitos, teriam pedido propina em troca de liberação de recursos no ministério.
"Se já não bastasse o escândalo do favorecimento, por afinidades políticas e pessoais, de lideranças religiosas que levou à demissão do ex-ministro Milton Ribeiro, o setor de educação do governo federal é agora novamente atingido por suspeitas de descalabros administrativos, se não também morais", acrescentou Furtado.
O pedido na representação do MP junto ao TCU é para a Corte determinar "que o FNDE suspenda quaisquer tratativas e tomadas de decisões com relação ao supracitado pregão visando a aquisição de ônibus escolares destinados a atender crianças da área rural, até que o tribunal decida sobre o mérito da questão".
Ele solicitou também ao tribunal a abertura de procedimento para apuração sobre a possível "existência de sobrepreço da ordem de R$ 732 milhões no pregão eletrônico elaborado pelo FNDE para a aquisição de ônibus escolares destinados a atender crianças da área rural".
Na avaliação da Diretoria de Administração do FNDE, o valor global do pregão deveria ficar em R$ 1,3 bilhão. Mas, por decisão da Diretoria de Ações Educacionais, chefiada por Gharigam Amarante — nome ligado ao presidente nacional do PL, Valdemar Costa Neto —, o preço total foi estimado em R$ 2 bilhões. O presidente do fundo é Marcelo Ponte, que foi chefe de gabinete do atual do ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, no Senado.
Apesar de alertas da área técnica da Procuradoria Federal e da Controladoria-Geral da União, a respeito do possível sobrepreço, Gharigam e Ponte mandaram a licitação seguir e fizeram pequenos ajustes que praticamente não alteraram o preço dos ônibus.