Um dos pastores que estariam por trás do "gabinete paralelo" que atuaria no Ministério da Educação (MEC), negociando transferências de recursos federais para prefeituras, teria pedido um quilo de ouro para conseguir liberar verbas para o município de Luis Domingues, no Maranhão. O pedido teria sido feito por Arilton Moura ao prefeito da cidade, Gilberto Braga (PSDB), segundo reportagem do jornal O Estado de S. Paulo.
— Ele (Arilton) disse: "Traz um quilo de ouro para mim". Eu fiquei calado. Não disse nem que sim nem que não — disse Braga, afirmando que não aceitou a proposta.
Conforme a publicação, a conversa ocorreu em abril de 2021 durante almoço no restaurante Tia Zélia, em Brasília, logo após uma reunião com o titular do MEC, Milton Ribeiro, na sede do ministério. O encontro estava fora da agenda oficial do ministro.
— Ele (o Arilton) disse que tinha que ver a nossa demanda, de R$ 10 milhões ou mais, tinha que dar R$ 15 mil para ele só protocolar (a demanda no MEC). E, na hora que o dinheiro já estivesse empenhado, era para dar um tanto, X. Para mim, como a minha região era área de mineração, ele pediu um quilo de ouro — afirmou o prefeito ao Estadão.
Na cotação de terça-feira (22), um quilo de ouro valia R$ 304 mil.
— Ele falou, era um papo muito aberto. O negócio estava tão normal lá que ele não pediu segredo, ele falou no meio de todo mundo. Inclusive, tinha outros prefeitos do Pará. Ele disse: "Olha, para esse daqui eu já mandei tantos milhões, para outro, tantos milhões" — declarou Braga, se referindo a verbas do MEC.
No mesmo encontro, o pastor teria passado o número de uma conta-corrente para que prefeitos anotassem e pudessem fazer os repasses da "taxa" de R$ 15 mil.
Ainda conforme o Estadão, um dos representantes dos municípios relatou que, após deixar "as demandas na mão" de Arilton, recebeu a conta do pastor para que o dinheiro fosse transferido. Como não efetuou a transferência, o pedido "não foi protocolado".
Na terça-feira (22), deputados de oposição pediram que o Supremo Tribunal Federal (STF) abra uma investigação contra o ministro da Educação e o presidente da República, Jair Bolsonaro, após a revelação do suposto esquema no MEC. A notícia-crime foi encaminhada ao Supremo pela bancada da minoria na Câmara, liderada pelo deputado federal Alencar Santana Braga (PT-SP).
No documento, os parlamentares pedem um parecer da Procuradoria-Geral da República (PGR) e que Ribeiro seja afastado do cargo caso as irregularidades sejam confirmadas. Medida semelhante foi adotada no Senado.
Entenda o caso
De acordo com o jornal O Estado de S. Paulo, um "gabinete paralelo" formado por pastores no MEC tem garantido repasses federais com agilidade fora dos padrões. Desde o começo de 2021, os religiosos Gilmar Santos e Arilton Moura intermediaram reuniões de prefeitos no ministério que resultaram em pagamentos e empenhos (reserva de valores) de R$ 9,7 milhões dias ou semanas após os encontros.
Com trânsito livre na pasta, os pastores atuariam como lobistas, segundo o Estadão. Viajam em voos da FAB e abrem as portas do gabinete do ministro para prefeitos e empresários. O grupo é capitaneado por Santos, presidente da Convenção Nacional de Igrejas e Ministros das Assembleias de Deus no Brasil, e Moura, assessor de Assuntos Políticos da entidade.
O Estadão identificou a presença dos dois em 22 agendas oficiais no MEC, 19 delas com o ministro, nos últimos 15 meses. Algumas são descritas como reunião de "alinhamento político" na agenda oficial de Ribeiro, que também é pastor.
Na terça-feira (22), o jornal Folha de S.Paulo divulgou áudio em que Milton Ribeiro afirma repassar verbas para municípios indicados pelos dois pastores, a pedido de Bolsonaro. No mesmo dia, o ministro da Educação negou que haja favorecimento.