O presidente da República, Jair Bolsonaro, prestou depoimento, na noite desta quarta-feira (3), no âmbito do inquérito que investiga suposta tentativa de interferência política do chefe do Executivo da Polícia Federal. Em oitiva realizada no Palácio do Planalto, Bolsonaro disse que "jamais teve qualquer intenção" de interferir na PF quando "pediu" ao ex-ministro Sérgio Moro as mudanças na diretoria-geral e nas superintendências da corporação.
O chefe do Executivo afirmou que pediu a substituição do delegado Maurício Valeixo - pivô da última crise entre Moro e Bolsonaro — "em razão da falta de interlocução" com o então diretor-geral.
Em diferentes trechos de seu depoimento, Bolsonaro atacou Moro, o ex-aliado que agora pode ser seu concorrente nas eleições 2022.
O presidente repetiu a acusação de que o ex-juiz da Lava-Jato teria concordado em colocar o delegado Alexandre Ramagem na chefia da PF "desde que ocorresse após a indicação do ex-Ministro da Justiça à vaga no Supremo Tribunal Federal".
Além disso, afirmou que o ex-ministro estava "administrando a pasta sem pensar no todo, sem alinhamento com os demais ministérios e o Gabinete da Presidência".
Em nota, a defesa de Moro reagiu ao fato de que não foi comunicada do depoimento, "impedindo seu comparecimento a fim de formular questionamentos pertinentes".
O então ministro do STF Celso de Mello, hoje aposentado, ao determinar que Bolsonaro prestasse o depoimento presencialmente, havia autorizado os advogados do ex-juiz a formularem perguntas a serem feitas ao chefe do Executivo.
A forma de oitiva do presidente no âmbito da investigação se tornou um impasse no STF. Bolsonaro recorreu à corte para depor por escrito, depois quis "desistir" da oitiva e, no início de outubro, manifestou "interesse em depoimento mediante comparecimento pessoal", um ano depois do início do impasse que travou as investigações.
Após Bolsonaro informar à corte que iria depor por escrito no inquérito, o ministro Alexandre de Moraes, relator da investigação no STF, determinou, no dia 7 de outubro, que a PF ouvisse o presidente em até 30 dias, mediante "prévio ajuste de local, dia e hora".
O depoimento de Bolsonaro era uma das últimas etapas para a conclusão do inquérito. Assim que for finalizado, o relatório da PF será enviado à Procuradoria-Geral da República (PGR), a quem cabe decidir se há provas suficientes para a apresentação de uma denúncia contra o presidente.
Segundo Moro, entre as provas de que Bolsonaro tentou interferir na PF estão mensagens trocadas pelos dois em um aplicativo e a reunião ministerial de 22 de abril de 2020.
Naquele encontro, que teve a gravação divulgada após decisão judicial, Bolsonaro disse:
— Já tentei trocar gente da segurança nossa no Rio de Janeiro e oficialmente não consegui. Isso acabou. Eu não vou esperar f... minha família toda de sacanagem, ou amigo meu, porque eu não posso trocar alguém da segurança na ponta da linha que pertence à estrutura. Vai trocar. Se não puder trocar, troca o chefe dele. Se não puder trocar o chefe, troca o ministro. E ponto final. Não estamos aqui para brincadeira.
O que diz a defesa de Moro
Confira íntegra da nota assinada pelo advogado do ex-juiz, Rodrigo Sánchez Rios:
"A Defesa do ex-ministro Sérgio Moro foi surpreendida pela notícia de que o presidente da República, investigado no Inquérito 4831, prestou depoimento à autoridade policial sem que a defesa do ex-ministro fosse intimada e comunicada previamente, impedindo seu comparecimento a fim de formular questionamentos pertinentes, nos moldes do que ocorreu por ocasião do depoimento prestado pelo ex-ministro em maio do ano passado. A adoção de procedimento diverso para os dois coinvestigados não se justifica, tendo em vista a necessária isonomia entre os depoentes."