Em uma derrota para o governo Jair Bolsonaro e o chanceler Ernesto Araújo, o Senado rejeitou nesta terça-feira (15) a indicação do embaixador Fabio Mendes Marzano para ocupar a posição de delegado permanente do Brasil nas Nações Unidas, em Genebra, na Suíça. Esta é a primeira rejeição de um diplomata pelo plenário no atual governo, algo considerado raro — em governos eleitos pelo voto direto, só aconteceu em 2015 e 1961.
A reprovação ocorreu por ampla margem, 37 votos contrários a 9 favoráveis, num sinal de fragilidade da base governista na Casa. Marzano havia sido aprovado pela Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, em parecer do senador Fernando Collor de Mello (PROS-AL). O placar na comissão foi de 13 a 0, favorável ao embaixador. Porém, o diplomata indispôs-se com a senadora Kátia Abreu (PP-TO) durante a sabatina.
A senadora ruralista quis saber a posição do embaixador sobre entraves ao Acordo de Livre Comércio entre Mercosul e União Europeia por causa do desgaste brasileiro frente ao descontrole na preservação ambiental e citou o protecionismo do agronegócio europeu. Ele, porém, recusou-se a comentar, sob o argumento de que o assunto escapava ao foco da delegação em Genebra.
Marzano alegou não ter "mandato" para falar, já que o tema não é atribuição de sua atual secretaria. A senadora, então, afirmou que a negativa "envergonhava o Itamaraty, o Senado e o Brasil". Ela disse que o Itamaraty virou uma "casa dos terrores" em que os diplomatas são tolhidos de expressar opiniões. Ela indicou que trabalharia contra Marzano, embora já houvesse, naquele momento, votado a favor dele na comissão, o que não poderia ser desfeito.
Marzano é homem de confiança do chanceler Ernesto Araújo. Atualmente, é secretário de Assuntos de Soberania Nacional e Cidadania, respondendo, por exemplo, por assuntos de defesa, Nações Unidas, direitos humanos, assistência consular e pela pauta ambiental, motivo de atritos diplomáticos e geopolíticos do governo. Ele é considerado um diplomata muito religioso, católico, e articulado profissionalmente.
Formado no Instituto Militar de Engenharia (IME), é atual vice-presidente da Associação dos Diplomatas Brasileiros. Chefiou a assessoria de Assuntos Internacionais do Supremo Tribunal Federal. Desde 1989 no Ministério das Relações Exteriores, serviu na Espanha, no Peru, na Venezuela e nos Estados Unidos e na Delegação do Brasil junto à Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura).
A pauta da liberdade religiosa é um dos eixos da política externa bolsonarista, e Marzano deveria atuar em campanha contra a "perseguição a cristãos". No ano passado, ele foi enviado para discursar pelo governo em Budapeste, na Hungria, um dos países cujo governo de direita de Viktor Orbán é aliado de Bolsonaro. Na ocasião, defendeu prioridade à pauta religiosa em organismos internacionais.
Marzano era o nome para substituir a embaixadora Maria Nazareth Farani Azevêdo, que deixará o posto na ONU e teve atuação aprovada pelo governo. Ela é um dos nomes fortes na diplomacia atualmente, casada com o embaixador Roberto Azevêdo, ex-diretor-geral da OMC (Organização Mundial do Comércio).
A última rejeição a um diplomata ocorreu em 2015, também para um organismo internacional. A então presidente Dilma Rousseff (PT) foi derrotada na indicação de Guilherme Patriota para a representar o País na Organização dos Estados Americanos (OEA), em Washington. Na ocasião, porém, o placar foi apertado: 37 votos a 36. Em 1961, o nome de Antônio Ermírio de Moraes, do grupo Votorantim, para o cargo de embaixador do Brasil em Bonn (então capital da Alemanha Ocidental) também foi rejeitado pelo Senado. Ele fora indicado por Jânio Quadros, que havia renunciado dias antes.