O presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Humberto Martins, determinou, na tarde desta quarta-feira (23), a expedição de alvará de soltura em favor do prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella, para que ele seja colocado imediatamente em prisão domiciliar. O político foi detido na manhã de terça-feira (22) em uma operação da Polícia Civil e do Ministério Público que apura os crimes de corrupção, organização criminosa e lavagem de dinheiro.
Humberto Martins determinou ainda que o presidente do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), desembargador Cláudio de Mello Tavares, preste informações, no prazo máximo de 48 horas, sobre o não cumprimento da liminar em habeas corpus concedida na terça-feira (22).
A nova decisão do ministro se deu após petição da defesa do prefeito, informando que o TJRJ estaria retardando o cumprimento da liminar, na qual Humberto Martins substituiu a prisão preventiva pela prisão em regime domiciliar, com o uso de tornozeleira eletrônica.
Além disso, o prefeito ficou proibido de manter contato com terceiros, terá que entregar seus telefones, computadores e tablets às autoridades, está proibido de sair de casa sem autorização e impedido de usar telefones.
As medidas cautelares são válidas até que o ministro Antonio Saldanha Palheiro, relator do habeas corpus impetrado pela defesa, analise o mérito do pedido — o que deverá acontecer após o fim das férias forenses.
O que motivou a prisão
As prisões foram autorizadas pela desembargadora Rosa Helena Guita, do Tribunal de Justiça do Rio, em ação movida pelo Ministério Público fluminense. Crivella foi detido às 6h desta terça-feira (22) em sua casa na Barra da Tijuca. Ele atribuiu a prisão à "perseguição política" e disse esperar "justiça".
Também foram presos o empresário Rafael Alves, o delegado aposentado Fernando Moraes (ex-vereador e que foi chefe da Divisão Antissequestro), o ex-tesoureiro de campanha de Crivella, Mauro Macedo, além dos empresários Adenor Gonçalves dos Santos e Cristiano Stockler Campos.
A investigação teve como ponto de partida a delação premiada do doleiro Sérgio Mizrahy, preso no âmbito da operação Câmbio Desligo, um dos desdobramentos da Lava-Jato fluminense. Veio dele a expressão "QG da Propina" para se referir ao esquema, que teria como operador Rafael Alves, homem forte da prefeitura, apesar de não ter cargo oficial. Ele é irmão do ex-presidente da Riotur, Marcelo Alves — os dois foram os principais alvos dos mandados de março, e Marcelo foi exonerado logo depois.
O suposto QG funcionaria assim, de acordo com o delator: empresas interessadas em trabalhar para o Executivo carioca entregavam cheques a Rafael, que faria a ponte com a prefeitura para encaminhar os contratos. O esquema também funcionaria no caso de empresas com as quais o município tinha dívidas — aqui, o operador mediaria o pagamento.
Os celulares de Alves, que não tinha cargo na prefeitura mas atuaria como gerenciador de propina em troca de contratos com empresas, foram peças-chave para associá-lo ao prefeito do Rio. Durante operação deflagrada em março, Crivella ligou para o empresário, mas quem atendeu foi o delegado que cumpria o mandado.
Apenas um dos quatro aparelhos foi entregue voluntariamente pelo investigado - os outros dois, além desse que recebeu a ligação de Crivella, estavam num carro de Shana Harouche, mulher de Rafael, no qual também foram encontrados R$ 50 mil, relógios e joias. Indícios, segundo o MP, de que ele se preparava para uma eventual fuga.
"Da análise do conteúdo dos telefones celulares de Rafael Alves, apurou-se que o Prefeito Marcelo Crivella figura como um de seus mais frequentes interlocutores, tendo sido detectadas, no aparelho encontrado sob a pilha de roupas, 1.949 mensagens trocadas entre eles", apontou a desembargadora Rosa Helena Guita, do Tribunal de Justiça do Rio.
Muitas delas tinham linguagem cifrada, "deixando transparecer que seu conteúdo não poderia ser tratado por meios de comunicação convencionais". As conversas mostravam ainda que vários encontros eram marcados entre Rafael e Crivella, seja na prefeitura ou na casa do mandatário - os dois moram no mesmo condomínio, na Barra da Tijuca, zona oeste da cidade.
Por ter sido o principal articulador econômico para a campanha de Crivella em 2016, Rafael Alves — que conseguiu para o irmão, Marcelo Alves, a vaga de presidente da Riotur — exercia influência constante sobre o comandante carioca. Segundo o MP e a Justiça, o prefeito acatava ordens do empresário como se fosse um subordinado: desfazia atos administrativos a pedido dele, por exemplo. "A subserviência do prefeito a Rafael Alves é assustadora", afirma a magistrada.