O delegado federal Alexandre Ramagem, mais cotado para assumir a direção-geral da Polícia Federal (PF), é visto como um profissional sério, íntegro e competente por boa parte da corporação. O que pesa contra o atual diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) é o clima criado pelas acusações feitas pelo ex-ministro da Justiça e Segurança Sergio Moro ao pedir demissão, na sexta-feira (24), após a demissão de Maurício Valeixo da diretoria-geral da PF.
Moro afirmou que o motivo para o presidente Jair Bolsonaro querer fazer a troca no comando da PF é o interesse em ter à frente da corporação alguém que lhe repasse informações de investigações em andamento, especialmente que envolvam filhos do presidente. Delegados e agentes da PF consultados por GaúchaZH avaliam que Ramagem é técnico e tem histórico operacional. Na própria Abin, área usualmente ocupada por militares, ele é visto como um bom gestor.
O problema para Ramagem é o momento e a forma como ocorre a troca.
— Ele é o nome certo, mas em um momento delicado — atesta um delegado gaúcho.
Ou seja: qualquer que seja o indicado para o mais alto cargo da PF, terá que lidar com a desconfiança da corporação. Um delegado que atua em Brasília avalia que para Ramagem, pela ligação que tem com a família Bolsonaro, terá dificuldade para apresentar a independência que um diretor-geral precisa:
— Ele vai sofrer muita pressão.
Ramagem coordenou a segurança de Bolsonaro durante a campanha de 2018 e depois se tornou chefe da segurança. Em decorrência do clima de desconfiança e incerteza, delegados já preveem, inclusive, perda no ritmo de trabalhos da PF.
Repercussão
Eduardo Brun Souza, vice-diretor regional da Associação dos Delegados da Polícia Federal no RS (ADPF), reconhece as qualificações de Ramagem, que preenche os requisitos legais para ocupar o cargo, princípio “muito caro” à entidade.
— É uma grande responsabilidade. Coordenar a PF como um todo traz peso estratégico mais de longo do que de curto prazo — diz Brun, enaltecendo que a entidade espera uma gestão autônoma:
— Estamos sempre vigilantes no cumprimento da lei e das diretrizes constitucionais.
Perguntado sobre a função exercida por Ramagem na campanha de Bolsonaro e a relação com o filho do presidente e vereador do Rio de Janeiro, Carlos Bolsonaro, Brun opina que “antes de ser delegado, o policial federal é um cidadão e tem suas relações de amizade e familiares”. Para ele, as responsabilidades do cargo não podem ser afetadas por fatores pessoais.
— Não gera preocupação agora. Qualquer juízo de impropriedade que façamos, nosso trabalho está sendo fiscalizada diuturnamente. Não tem possibilidade de eventuais malfeitos não virem à tona. Relações pessoais que se tenha com determinadas pessoas trazem vigilância maior.
O presidente do Sindicato dos Policiais Federais do Rio Grande do Sul (Sinpef/RS), Júlio Cesar Nunes dos Santos, avalia a indicação com naturalidade. Ele diz que Ramagem é apto para o cargo e acredita que a aproximação com Bolsonaro tenha se dado quando o delegado fazia a segurança pessoal do então candidato. Santos sustenta que as investigações da PF dispõem de protocolos e trâmites que tornam difícil a interferência externa.
— Temos uma missão e vamos seguir cumprindo, independentemente do governo. Sempre com o objetivo de manter a reputação da instituição — diz o agente gaúcho.