Da janela do gabinete, no segundo andar do Paço Municipal, o prefeito Nelson Marchezan observa, condoído, os efeitos da covid-19 em Porto Alegre, onde se concentra o maior número de casos confirmados da doença no Estado. O comércio está fechado. Há pouca gente nas ruas, mas ele e os secretários mais próximos seguem lá, analisando números, avaliando projeções e tomando decisões difíceis. Dia e noite.
Desde que a pandemia começou a mostrar sua face mais dura, há cerca de três semanas, as luzes do prédio inaugurado em 1901, por onde passaram Otávio Rocha, Alberto Bins, José Loureiro da Silva e outros nomes ilustres, só se apagam tarde da noite — ou mesmo ao alvorecer. Foi assim na virada da última terça para quarta-feira (1°).
Por volta das 23h, Marchezan deu início à revisão da versão consolidada do decreto de calamidade pública do município, prorrogando medidas de restrição na Capital até 30 de abril. Era preciso checar ponto por ponto. Em razão disso, o expediente se encerraria às 4h30min.
— A gente já vinha com um ritmo forte antes de tudo isso acontecer. O perfil do prefeito é esse. Mas nessas últimas três semanas isso se intensificou — conta o secretário de Relações Institucionais, Christian Lemos.
Marchezan não para. Acomodado à mesa centenária do gabinete, passa horas no tablet e no celular, ouvindo interlocutores e discutindo soluções para a crise. Teme o impacto econômico do isolamento, mas segue convicto de que é preciso preservar vidas.
Ao redor dele, pastas, papéis, álcool gel, água, café, canetas, fones de ouvido e carregadores dividem o ambiente com um cubo mágico multicolorido, presenteado por um amigo há algumas semanas. Antes da pandemia, Marchezan gostava oferecer o passatempo a quem chegasse, em tom cordial. Agora, com o risco de contaminação, não dá mais.
— Melhor não. Deixo na mesa só porque acho bonito — diz o prefeito, preocupado com o que vem pela frente.
Diante do avanço do número de infectados, as reuniões em teleconferência se multiplicam e se prolongam. Marchezan conversa com líderes setoriais e representantes de instituições - de diretores de hospitais a empresas de ônibus. Com a equipe, é metódico, crítico e exigente.
— Ele não deixa nada para depois. Se surge um problema, resolve na hora. Se detecta um erro, manda corrigir. Não doura a pílula. Sabe que tem fama de esquentado, mas brinca com isso. Acho que está mais à vontade com os colaboradores — avalia o secretário extraordinário de Enfrentamento do Coronavírus, Bruno Miragem.
Na tomada de decisões, o chefe do Executivo tem sempre por perto Lemos e Miragem, além do secretário da Saúde, Pablo Stürmer, do adjunto, Natan Katz, e de técnicos da prefeitura. O secretário de Comunicação Social, Orestes Andrade Jr, ajuda a intermediar as relações com a imprensa.
— A responsabilidade é gigantesca, mas o prefeito tem absoluta certeza de que as medidas certas estão sendo tomadas na hora certa — diz o jornalista.
Para aguentar o tranco, Marchezan e os escudeiros costumam almoçar juntos, quase todos os dias, no Paço Municipal. A comida vem dos poucos estabelecimentos que permanecem abertos na região, com a opção de telentrega. Farroupilha prensado (com queijo, presunto e requeijão), pizza e pastel de carne são os menus mais pedidos, mas o que eles gostariam mesmo é de ver todos os restaurantes reabertos e a cidade fervilhando outra vez.