O presidente Jair Bolsonaro ignorou orientações das autoridades sanitárias no enfrentamento ao coronavírus e provocou aglomerações neste sábado (11) ao visitar a recém-começada obra de um hospital de campanha em Águas Lindas de Goiás (GO), a 57 km de Brasília.
Após uma trégua na tensa relação com o presidente, o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, criticou o gesto do chefe do Executivo.
Autoridades e convidados se amontoaram na chegada de Bolsonaro à unidade emergencial que começou a ser erguida na última terça-feira (7). Do lado de fora, dezenas de pessoas se amontoaram próximo ao terreno onde está sendo construído o hospital. O presidente fez o deslocamento de helicóptero.
Os apoiadores do lado de fora gritavam a favor de Bolsonaro e contra a imprensa e o governador Ronaldo Caiado (DEM-GO), que rompeu politicamente com o presidente da República por discordar de sua postura no enfrentamento da crise.
Assim que desceu do helicóptero, Bolsonaro subiu em um barranco e foi até um grupo que se amontoava em um cordão de isolamento. Depois da visita, à qual a imprensa não teve acesso, Bolsonaro foi até outros focos de aglomeração para saudar as pessoas. O presidente retirou a máscara que usava enquanto cumprimentava a população.
Após a partida do presidente, Mandetta condenou a aglomeração de pessoas.
– Posso recomendar, não posso viver a vida das pessoas. Pessoas que fazem uma atitude dessas hoje daqui a pouco vão ser as mesmas que vão estar lamentando – afirmou.
Questionado se a orientação valia também para o presidente da República, Mandetta afirmou que "vale para todos os brasileiros". Mandetta não acompanhou Bolsonaro no momento em que ele foi até as pessoas.
– Procuro seguir uma lógica de não aglomeração – disse o ministro.
Caiado também falou em tom crítico à atitude de Bolsonaro em Águas Lindas.
– Ele que deverá explicar esta situação. Esta posição não foi a minha. Ele é o presidente e eu sou o governador. A minha posição foi a que vocês acompanharam. Esta é a posição que manteremos até o dia 19 – afirmou o governador de Goiás, mencionando a data em que o Estado deve começar a flexibilizar o isolamento social em algumas regiões.
Caiado foi criticado por moradores do município por causa das regras de restrição de funcionamento do comércio.
– Eu sigo a parte da ciência e sigo também as regras do Ministério da Saúde. Então, esta é minha posição. As regras implantadas no estado de Goiás são as regras do Ministério da Saúde. Então, minha posição é contra a liberação neste momento – afirmou o governador.
Neste sábado, a Human Rights Watch, ONG que defende e pesquisa os direitos humanos, divulgou relatório que diz que o presidente está colocando os brasileiros em "grave perigo ao incitá-los a não seguir o distanciamento social" para conter a transmissão da covid-19.
Desde 15 de março, Bolsonaro já participou de uma manifestação e fez passeios por Brasília, provocando aglomerações. No documento, a organização afirma ainda que Bolsonaro "age de forma irresponsável disseminando informações equivocadas sobre a pandemia".
Apesar de toda a estrutura montada para receber Bolsonaro, o evento em Goiás não entrou na agenda oficial do governo e sequer foi confirmado pela Secretaria de Comunicação.
Caiado foi convidado para acompanhar Bolsonaro na quinta-feira (9). Aliado de primeira hora, o governador de Goiás havia rompido com o presidente em 25 de março.
O rompimento se deu depois do pronunciamento feito em rede nacional na noite anterior. O goiano anunciou que não conversaria mais com Bolsonaro e que o Estado não atenderia suas determinações sobre o combate ao coronavírus.
À época, Caiado, que é médico, criticou as declarações do presidente sobre os impactos econômicos da crise e seus ataques aos governadores, qualificando-os como um "discurso totalmente irresponsável".
O hospital
O hospital começou a ser construído pelo governo federal em um terreno de 10 mil metros quadrados cedido e terraplanado pela prefeitura. A previsão é de que a estrutura fique pronta em mais duas semanas. De acordo com o Ministério da Infraestrutura, estão sendo investidos R$ 10 milhões.
O hospital terá 200 leitos adaptáveis para unidades de tratamento semi-intensivas, com tubulação e suporte para respiradores. A operação ficará a cargo do governo de Goiás, que contratará uma OS (organização social) para gerir a unidade.
Até o momento, apenas a carcaça do hospital está de pé. De acordo com vizinhos, o terreno só foi cercado com tapumes na quinta-feira. A escolha do local foi feita, de acordo com o governo federal, após pedido de apoio do governo de Goiás à União devido à necessidade de atenção especial à doença.