A declaração do presidente Jair Bolsonaro neste sábado (7) a favor dos protestos do próximo dia 15 desagradou os presidentes da Câmara, do Senado e do Supremo Tribunal Federal (STF). Nos bastidores, Rodrigo Maia (DEM-RJ), Davi Alcolumbre (DEM-AP) e o ministro Dias Toffoli manifestaram a aliados descontentamento e indignação com o gesto de Bolsonaro.
O presidente pediu, em discurso em Boa Vista (RR), que a população participe das manifestações e afirmou que político que tem medo de rua não serve para o cargo. Ao tomar conhecimento da fala de Bolsonaro, Alcolumbre conversou com Toffoli. Combinaram que, se houver uma manifestação, será conjunta, do Legislativo e do Judiciário, e mais dura que as anteriores.
Alcolumbre demonstrou a interlocutores irritação e preocupação e considerou o episódio deste sábado uma "situação grave". Na avaliação dos chefes do Congresso e do Supremo, o recado passado pelo Palácio do Planalto nos últimos dias foi de que Bolsonaro não se manifestaria após a polêmica do vídeo que compartilhou via WhatsApp convocando para os atos.
Incentivados por parlamentares bolsonaristas e pelo próprio presidente, ativistas conservadores preparam o ato do dia 15, que prega bandeiras de direita, contrárias ao Congresso e em defesa de militares e do atual governo. A manifestação é considerada uma reação a uma fala de Augusto Heleno, que chamou o Congresso de "chantagista".
O assunto foi discutido pessoalmente entre Bolsonaro e Alcolumbre na última segunda-feira (2). O senador reclamou da situação para Bolsonaro, que, por sua vez, teria dito que não teve a intenção de colocar as ruas contra o Congresso. Outros parlamentares ouviram do presidente que o episódio era um "mal-entendido".
Mensagem parecida foi passada pelo ministro Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo) a Toffoli e Maia. Por isso, as frases de Bolsonaro neste sábado (7) irritaram os comandos do Legislativo e do Judiciário.
Eles discutem a possibilidade de uma resposta conjunta ao Planalto. Avaliam, porém, que não se pode cair na "pilha" do presidente e responder à atitude incisivamente. Iniciar um bate-boca com o presidente agora em virtude da convocação, avalia a cúpula do Congresso, poderia apenas instigar mais ainda a população contra o próprio Congresso e aumentar a mobilização.
Vídeo polêmico
Um vídeo do discurso em Roraima foi compartilhado pelo deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), o que também não foi bem recebido pelos demais Poderes. Bolsonaro se manifestou durante uma escala em Boa Vista para sua viagem aos EUA. Segundo ele, o protesto do dia 15 "é um movimento espontâneo e o político que tem medo de movimento de rua não serve para ser político".
— Então participem, não é um movimento contra o Congresso, contra o Judiciário. É um movimento pró-Brasil. Quem diz que é um movimento impopular contra a democracia está mentindo e tem medo de encarar o povo brasileiro — disse.
As afirmações vêm um dia após o presidente da Câmara afirmar que o governo Bolsonaro tem contribuído para afastar investidores do país ao criar incertezas em relação ao seu compromisso com a democracia e a defesa do ambiente.
— O governo gera uma insegurança grande para a sociedade e para os investidores — disse Rodrigo Maia.
Ele destacou, por exemplo, que a declaração de Bolsonaro se deu em uma área militar, na base aérea de Boa Vista, o que, na avaliação feita por ele, poderia configurar um atentado à Lei de Segurança Nacional. A atitude de Bolsonaro foi alvo de críticas no Parlamento. Para o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), o fato de ele dizer que a manifestação não é contra o Legislativo não vai alterar o conteúdo dos protestos, que foram inicialmente organizados com esse propósito.
— O presidente montou um palanque numa base aérea para estimular uma manifestação de rua, que, sabidamente, é contra o Congresso Nacional e contra o Supremo Tribunal Federal — disse.
Posição de parlamentares
A deputada Sâmia Bomfim (PSOL-SP) afirmou que o presidente convocou a população a participar de um ato que, para ela, tem caráter golpista.
— É hora de dar um basta — afirmou.
O senador Omar Aziz (PSD-AM) criticou a convocação de Bolsonaro aos atos porque isso não vai resolver os problemas da economia do país.
— Fuga de capital do país, dólar nas alturas e o presidente instigando a população como se isso fosse resolver o problema econômico do Brasil. Se isso resolver, eu também apoio — ironizou.
Durante a semana, senadores foram informados pela articulação política do governo que o general Augusto Heleno, ministro que comanda o Gabinete de Segurança Institucional (GSI), gravaria um vídeo falando sobre o equilíbrio entre os Poderes e a importância do Congresso, o que seria encarado como um pedido de desculpas depois que uma conversa em que acusa o Legislativo de chantagear o Executivo vazou em transmissão do próprio Palácio do Planalto.
O discurso do presidente neste sábado foi acompanhado de fala de Heleno. Bolsonaro afirmou que já levou "facada no pescoço dentro do meu gabinete por pessoas que não pensam no Brasil". O ministro, por sua vez, disse que o presidente tem encontrado resistência em sua atuação.
Aliados de Alcolumbre pontuaram ainda que a manifestação de Bolsonaro acontece na semana em que se revelou que o gabinete de Eduardo Bolsonaro usou a estrutura do Congresso para realizar ataques virtuais e estimular o ódio contra supostos adversários do chefe do Executivo.
No STF, ministros avaliam que o ideal é não alimentar o que consideraram uma provocação de Bolsonaro. Para integrantes do Supremo, ao convocar os atos, o presidente faz uma "manobra diversionista" para criar uma cortina de fumaça sobre os resultados negativos da economia.