Demitido do Ministério da Cidadania na quinta-feira (13), o deputado Osmar Terra (MDB-RS) disse que perdeu o cargo porque o presidente Jair Bolsonaro "tinha de resolver uma questão específica em outras áreas do governo". Em entrevista ao programa Atualidade, da Rádio Gaúcha, nesta sexta-feira (14), o ex-ministro avaliou que o governo "tem o direito de fazer os arranjos políticos que são necessários" e disse não estar decepcionado e que irá continuar apoiando a atual gestão federal:
— Houve uma crise, não foi no meu ministério, tinha de se resolver uma questão específica em outras áreas do governo. O ministro Onyx (Lorenzoni) é uma peça chave do governo, foi quem esteve desde o início com o presidente, ia sair da Casa Civil para ser nomeado o (general Walter) Braga Netto e o ministério que tinha como albergar (o Onyx) era o da Cidadania.
Segundo Terra, o presidente ofereceu a possibilidade de assumir uma embaixada, mas ele declinou o convite. Disse que há possibilidade de retornar ao governo caso ocorra alguma mudança no número de ministérios, com a criação de uma pasta que cuide de temas ligados a drogas, por exemplo. O ex-ministro também falou sobre a fila de beneficiários que aguardam para ser incluídos no programa Bolsa Família e investigação sobre suspeitas de irregularidades por uma empresa pelo Ministério da Cidadania. Sobre o futuro político, disse não saber se permanecerá filiado ao MDB
Acompanhe os principais pontos da entrevista:
Por que o senhor foi demitido?
O governo tem o direito de fazer os arranjos políticos que são necessários a cada momento. Sou um cargo de confiança. Fui convidado de uma maneira inusitada. Não esperava ser ministro do governo Bolsonaro e foi um convite feito pessoalmente, não teve envolvimento político. A pessoa que fez a sugestão foi Onyx (Lorenzoni), ele me chamou lá, me mostrou a estrutura do ministério e me convidou e disse que o presidente tinha aceitado o convite.
O ministro Onyx é uma peça chave do governo.
O presidente vem na reunião com deputados, onde foi anunciado, para dizer que estava me convidando pela minha história. Foi um convite pessoal que me honrou muito. Meus planos já estavam em outra direção quando fui convidado. O meu compromisso… Bom, é um governo que está moralizando, quer mudar o Brasil, foi participar desse processo. Houve uma crise, não foi no meu ministério, tinha de se resolver uma questão específica em outras áreas do governo.
O ministro Onyx é uma peça chave do governo, foi quem esteve desde o início com o presidente, ia sair da Casa Civil para ser nomeado o (general Walter) Braga Netto e o ministério que tinha como albergar (o Onyx) era o da Cidadania.
O senhor ficou decepcionado?
O presidente Bolsonaro, para mim, é a possibilidade de mudança que tem neste país.
Não, porque todos os processos que participei do governo… O presidente Bolsonaro, para mim, é a possibilidade de mudança que tem neste país. Qual presidente, candidato, convidaria Sergio Moro para ser ministro da Segurança Pública? Qual convidaria Paulo Guedes para fazer a revolução na economia? E convidaria o Tarcísio (Gomes de Freitas)? O cargo mais disputado que teve pelos partidos a vida inteira que conheço era ministro da Infraestrutura. E era indicação política dos partidos, a gente sabe o que aconteceu. Esse cargo hoje é de um militar de carreira. Então, em todas as áreas tivemos essas indicações pessoais do presidente. É o melhor ministério que vi nos últimos anos.
Bolsonaro chamou o senhor pessoalmente?
Ele me explicou a situação, que precisava resolver uma situação específica, que era da Casa Civil, e que a alternativa que ele tinha, com um conjuntura toda, o Ministério da Educação sendo atacado pela Câmara, e que o meu ministério se cogitou de se estabelecer uma estrutura de aumentar um pouco mais. Se falou das embaixadas também. Disse: “presidente, não tenho nenhuma pretensão, eu vim aqui para ajudar, vou lhe ajudar, voltando pra Câmara, mas não tenho pretensão de ir para embaixada e não tenho pretensão, se tiver a possibilidade de ter uma estrutura que cuide de drogas, mas isto é impossível agora”. Teria de fazer uma nova lei para aumentar o ministério. Se configurou também quando o Banco Central deixar de ser ministério…
O senhor reconhece algum erro administrativo que explique as filas no programa Bolsa Família?
Essa história da fila no Bolsa Família é uma piada, ainda mais quando é o PT que critica.
Conheço o Bolsa Família muito bem. Foi um programa que sempre teve fila. Todos os 14 anos do PT sempre teve fila. Chegou a ter fila de 2 milhões porque o governo não comportava. No governo Dilma, a média foi de 1,2 milhão de famílias na fila. Achava que tinha de reduzir isso. E no governo Michel (Temer) conseguimos alocar um recurso específico e reduzir a zero. Fui o único responsável a acabar com a fila.
Mas em razão do contingenciamento do governo não podemos alocar recursos e tem fila de 400, 500 mil pessoas, o que é o normal. Agora virou problema porque eu era responsável. Dilma chegou a fazer um post. Cheguei a tirar 8 milhões de famílias do Bolsa Família que não precisavam. Os controles tem de ser aperfeiçoados. Conseguimos uma vitória que é o Imposto de Renda dizendo que se paga ou não. O programa está totalmente controlado. Teve ainda 13º. Mas achamos que o programa não pode ficar só transferindo renda. Tem de capacitar. Criamos o programa Criança Feliz para que se tenha desempenho melhor na escola. Agora essa historia da fila no Bolsa Família é uma piada, ainda mais quando é o PT que critica.
Há especulação de que o Bolsa Família poderia ir para o Ministério da Família, da ministra Damares Alves.
Não, não tive informação nenhuma. Acho que ministro Onyx tem capacidade para tocar e deverá tocar. Estava discutindo exatamente com ele uma mudança estrutural no programa quando aconteceu essa conjuntura política. Mas o ministro Onyx é meu parceiro, amigo, entende exatamente o que entendemos das famílias e tem condições de tocar isso com bastante competência.
Aliados o criticam dizendo que mudou discurso. Sempre foi humanista e dentro do governo radicalizou. Valeu a pena?
Não mudei o discurso. Se tu puder mostrar um discurso meu diferente que faço hoje. Não tenho uma vírgula mudada no meu discurso. Os conceitos que tive sobre drogas são os mesmo que tinha há 30 anos. Saiu uma matéria dizendo que eu era de esquerda, querendo me caracterizar como oportunista. O meu discurso sempre foi o mesmo. Muita gente mudou de discurso, e mudou para o outro lado. Mudou para ter costumes liberais, a favor das drogas.
Mas o senhor era de esquerda. Quem acompanhou sua trajetória sabe.
Como de esquerda? Sempre tive uma postura em relação a questão social, se isso é ser de esquerda, continuo com a mesma postura. Então, não considero que isso é de esquerda ou de direita. O discurso, depois que caiu o muro de Berlim, mudou muito. Passou a ser sobre costumes, e costumes que não concordo. Fui anti-PT, ajudei a fazer o impeachment da (ex-presidente) Dilma (Rousseff). Tinha de mudar este país.
O senhor no passado foi filiado ao PCdoB, no MDB lutou contra a ditadura.
Eu fui militante de esquerda 40 anos atrás, depois foi só decepção.
Eu fui militante de esquerda 40 anos atrás, depois foi só decepção. O discurso que a humanidade ia para direção do socialismo, virou tudo ditadura. O povo saiu para a rua para derrubar o regime da União Soviética. Não houve uma guerra. Acabou com o povo na rua. Acabou porque o povo derrubou o muro (de Berlim). Que servia para coisas horrorosos como vemos na Venezuela.
Eu me decepcionei muito. E também posturas que eu acreditava serem coerentes ao que eu penso. Tem gente que acha que Lula é preso político. Ladrão virou preso político. Eu estou nessa, há muito tempo deixei de acreditar. O que eu defendo é um país com ética.
Um dos motivos apontados para sua saída seria a contratação da B2T pelo ministério? O que está por trás dessa constatação?
Isso já foi, já conversei com o presidente sobre o que saiu sobre isso. As notícias estão erradas. Primeiro, porque não se contrata nenhuma empresa na Esplanada sem ter o ok da CGU (Controladoria-Geral da União). Essa empresa inclusive, até julho, fazia a tecnologia da informação da própria CGU. Ninguém tinha informações sobre a investigação, que estava ocorrendo no Ministério do Trabalho. E uma das empresas que tinha lá era essa, e aí tem de ver o que houve ou não. Mais órgãos do governo trabalharam com ela. Era uma empresa que tinha 21 contratos na Esplanada.
Em 2017, a CGU emitiu relatório apontando fraudes no Ministério do Trabalho. O seu ministério não atentou para isso?
Não, se teve uma situação específica. Se fosse isso, a CGU tinha suspendido contrato (que tinha até meados de 2019). Agora, todo mundo que participou da linha de contratação dessa empresa foi afastado ainda no ano passado no meu ministério.
Se as investigações avançarem, o senhor tem convicção de nada irregular?
Fiz uma revisão e a contratação da empresa seguiu todos os trâmites. Não sei se vai aparecer algo lá ou não. Assim como não sei se vai acontecer na CGU. Se vai aparecer ou não, não tenho nada a ver com isso. A forma que o contato é feito foi totalmente autorizada, em processo está disponível.
O senhor volta para Câmara e permanece no MDB?
Acho que o MDB se deixou levar nessa onda de corrupção e parceria que fez com o PT esses anos todos.
Não sei. O MDB é um partido que estou militando há 40 anos. Então é uma conversa que tenho de fazer com eles. Acho que o MDB se deixou levar nessa onda de corrupção e parceria que fez com o PT esses anos todos — que sempre fui contra. O partido ficou muito desgastado. Foi uma das causas para a redução de voto que o partido teve. Se não fosse a candidatura do (ex-governador José Ivo) Sartori, hoje o MDB teria a metade dos deputados que tem.
A política hoje mudou completamente. As pessoas têm informações em tempo real, e isso leva com que os discurso tradicionais percam relevância, ainda mais se tem toda a direção acusada de corrupção, como teve o MDB. Perdi voto não foi por causa do meu trabalho, perdi voto porque eu era do MDB.
O senhor vai para a Aliança pelo Brasil, novo partido que Bolsonaro quer criar?
Não sei. O que estou trabalhando é para que o MDB se recicle. Se não se reciclar, aí vou ver, estou de sangue doce. Posso ser candidato ou até a sair da política e fazer uma vida acadêmica.