Entenda a reportagem em cinco pontos
- Após a aprovação da reforma da Previdência, o governo federal deve encaminhar ao Congresso um pacote de medidas que integram a reforma administrativa.
- Entre os temas em estudo está o fim da estabilidade do funcionalismo e a possibilidade de demissão por baixo desempenho.
- Nem todas as alterações seriam aplicáveis aos funcionários que já integram o serviço público atualmente.
- O pacote ainda deve passar pela análise do ministro Paulo Guedes antes de ser apresentado oficialmente a deputados e senadores.
- A estimativa de economia com as ações, até 2030, chegaria a R$ 389 bilhões.
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Vista como peça prioritária no quebra-cabeça federal para o equilíbrio das contas, a reforma administrativa preparada pelo governo vai propor alterações na relação da União com o funcionalismo. O fim da estabilidade e demissão por baixo desempenho são os principais pontos da proposta em análise pela equipe econômica, que deverá chegar ao Congresso nas próximas semanas, após aprovação da reforma da Previdência no Senado.
O pacote com as mudanças terá proposta de emenda à Constituição (PEC), leis complementares e ordinárias, e ainda passará pelo crivo do ministro da Economia, Paulo Guedes.
Além da aproximação dos salários pagos pelo setor público aos oferecidos no setor privado, técnicos do governo querem rever o número de carreiras vinculadas ao Poder Executivo, alterar matrizes salariais e acabar com progressões automáticas que utilizam o critério de antiguidade.
As mudanças mais radicais atingiriam apenas quem fosse admitido após eventual aprovação das novas regras pelo Legislativo. Servidores que já atuam na União poderiam ser afetados, com a revisão de benefícios e a necessidade de participar de programas de qualificação, em casos de baixo desempenho.
A proposta ainda prevê a alteração das regras do estágio probatório, hoje de três anos. A intenção é que o período de avaliação complemente a seleção feita através de concurso. A efetivação do servidor só ocorreria após análise de desempenho e comprometimento, o que, na prática, não ocorre atualmente.
Critérios mais rígidos e transparentes deverão ser adotados também para analisar o desempenho de setores do serviço público e de carreiras específicas. A ampliação do ponto eletrônico em setores da administração federal, incluindo postos nos Estados, também está nos planos.
Integra o pacote a regulamentação da Lei de Greve, prevista na Constituição. O principal objetivo é incluir regras adaptadas ao serviço público. Atualmente, casos judicializados acabam sendo decididos através de regras utilizados para o setor privado. Os servidores deverão ter, ainda, um novo código de conduta, atualizando o documento atual, elaborado em 1994.
Caso seja aprovado, o conjunto de mudanças não seria aplicado a todas as carreiras. Seriam preservados de parte das medidas os profissionais que atuam em funções mais suscetíveis a pressões externas e influência política, como auditores da Receita Federal e diplomatas. As ações não devem atingir os poderes Judiciário e Legislativo.
A proposta deverá trazer a criação da figura do servidor temporário e até de contratações via CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), assim como ocorre na iniciativa privada, mesmo que a seleção ocorra através de concurso público.
Na quinta-feira, Guedes disse que o governo também estuda a adoção de uma trava nos reajustes de servidores em entes federativos que gastem mais de 80% com folha de pagamento. Na prática, a medida atingiria municípios, Estados e a União.
— Será que é hora de travar os salários por um ou dois anos? Estamos redesenhando isso em uma reforma administrativa e vamos mudar o plano de carreira — disse o ministro, destacando que os servidores públicos tiveram reajustes de salário acima da inflação nos últimos anos.
A linha seguida pelo Ministério da Economia sobre o tema é corroborada por um estudo feito pelo Banco Mundial, a pedido do governo brasileiro, divulgado na última quarta-feira. Para a entidade, há uma "janela de oportunidade" para o país equalizar os gastos com pessoal, a partir de reformas estruturais.
Entre as recomendações incluídas no levantamento, estão a redução dos salários de entrada dos servidores, aproximação dos rendimentos pagos pelo setor privado e avaliação de desempenho para avanços salariais e na carreira. A estimativa de economia com as ações, até 2030, chegaria a R$ 389 bilhões.
As mudanças em estudo
Para servidores que entrarem após reforma
- Servidores não teriam estabilidade nos cargos. Os contratos seriam parecidos com os assinados por trabalhadores da iniciativa privada, apesar da seleção por concurso público. Possibilidade de vínculos temporários e contratações através da CLT.
- Setores sensíveis a pressões políticas, como auditores fiscais e diplomatas, seriam poupados das novas regras.
- A seleção do servidor não ficaria restrita ao concurso público. O estágio probatório, hoje de três anos, iria avaliar na prática as competências do trabalhador, antes da efetivação.
- Salários menores no início da carreira e progressões mais lentas, com valores equiparados ao de empresas privadas.
- Tempo de serviço não definiria aumentos salariais.
- Redução do número de carreiras para algo entre 20 e 30. Atualmente, são 117.
- Critérios que permitam maior mobilidade de servidores na administração pública.
- Possibilidade de vínculos temporários e contratações via CLT, mesmo através de concursos.
Para quem já está no serviço público
- Criação de critérios de desempenho claros, com avaliação rigorosa, a partir da regulamentação do Artigo 41 da Constituição, que trata do serviço público
- Quem tiver baixa pontuação, terá que participar de programas de capacitação
- Se, após a “reciclagem”, o desempenho seguir baixo, poderá haver demissão
- Redução de benefícios financeiros nos vencimentos, como auxílio-moradia
- Regulamentação da lei de greve do serviço público, conforme prevê a Constituição
- Atualização do Código de Conduta do funcionalismo federal, elaborado em 1994
Governo projeta redução no número de servidores
Sem previsão para a abertura de concursos públicos, o governo projeta a redução gradual do número de servidores nos próximos anos. Atualmente, dos 705 mil trabalhadores do Executivo — sendo 35 mil no Rio Grande do Sul — 127 mil reúnem condições para a aposentadoria nos próximos cinco anos. O objetivo é fazer análises individuais para que novas contratações sejam realizadas somente em casos essenciais.
Uma das alternativas para a reposição em setores que carecem de mão de obra é a movimentação interna. Para isso, há a intenção de modificar leis e elaborar editais genéricos, quando houver a abertura de novas seleções. A ação evitaria que possíveis transferências entre órgãos acabem em discussões judiciais.
Caso seja aprovada, a redução no número de carreiras é mais um fator que poderá facilitar o trânsito entre os setores da administração.
O custo mensal médio de um servidor federal é de R$ 12,4 mil. O Orçamento para o próximo ano, que ainda não foi aprovado pelo Congresso, não inclui previsão de aumento nas remunerações.