Diante de um diagnóstico de compressão das contas do governo e distorções no serviço público, o Banco Mundial recomendou ao Brasil que promova uma reforma administrativa para levar os gastos com pessoal a um patamar sustentável. As sugestões contam em estudo, realizado a pedido do governo brasileiro e apresentado na quarta-feira (9).
Entre as medidas sugeridas constam a aplicação de ações como redução de rendimentos iniciais dos servidores, aproximação dos salários aos praticados pelo setor privado e aplicação efetiva de avaliação de desempenho para progressão de carreira. Se colocadas em prática, elas poderiam gerar uma economia acumulada de R$ 389 bilhões até 2030.
Na avaliação da entidade, o país está diante de uma janela de oportunidade que pode abrir caminho para maior eficiência no gasto público com pessoal, desde que seja feita uma reforma estrutural.
Há um pico no número de servidores que estão aptos à aposentadoria — dados disponibilizados pelo governo federal apontam que 26% do efetivo que está hoje na ativa deve se aposentar até 2022. Em 2030, o Banco Mundial estima que quase um quarto da folha de pagamentos do governo federal será composto por servidores contratados a partir deste ano.
"A racionalização do sistema de carreiras, aliada a reformas que reduzam salários iniciais e alinhem a progressão em carreira com desempenho e experiência, é capaz de aliar ganhos de eficiência e redução de gastos, com impacto já nos próximos anos", diz o documento.
De acordo com o banco, o total de servidores aumentou mais de 80% em 20 anos. No mesmo período, o crescimento da população brasileira foi de aproximadamente 30%.
Ainda assim, o número não é tão alto em relação a outros países. O maior problema, segundo o órgão, é o custo. No Brasil, o servidor público federal tem salário médio 96% mais alto que um trabalhador do setor privado com as mesmas características de qualificação, gênero e região.
De 2008 a 2018, o gasto do governo com pessoal ativo teve um crescimento médio de 2,5% ao ano acima da inflação — o percentual engloba a alta de despesas com reajustes salariais e com o aumento do número de servidores. Dados deste ano mostram que quase metade dos trabalhadores do serviço público federal tem salário superior a R$ 10 mil.
Na avaliação do Banco Mundial, uma combinação de fatores torna o gasto público nessa área ineficiente. Os salários iniciais são altos e o tempo médio para chegada ao topo da carreira é curto. Há ainda distorções nas progressões, já que os pagamentos que deveriam ser relacionados a desempenho normalmente são feitos de forma linear a todos os servidores da carreira.
"Os altos salários iniciais de alguns servidores limitam o espaço para reajustes, o que contrasta com o setor privado, onde os salários iniciais mais baixos são combinados com oportunidades de progressão salarial e bônus", afirma.
A entidade recomenda que os salários de entrada sejam menores e que haja redução na diferença entre os rendimentos dos profissionais do setor público em comparação com o privado. Se o rendimento inicial tiver um teto de R$ 5 mil, a economia prevista é de R$ 104 bilhões até 2030. Eventual redução mais suave, de 10% dos atuais salários iniciais, teria impacto de R$ 26 bilhões.
Caso a reposição dos quadros fosse de um novo contratado para cada aposentado, o gasto seria reduzido em R$ 52 bilhões. O alívio gerado com um congelamento de salários por três anos e posteriores reajustes apenas pela inflação seria de R$ 232,6 bilhões até 2030.
O estudo sugere ainda que a estrutura salarial permita pagamentos mais elevados com base no desempenho, além de aumento do intervalo para promoções e redução dos reajustes entre cada nível. O banco também considera importante uma redução no número de carreiras — hoje, são mais de 300 na administração federal. A ideia é tornar as funções mais genéricas e transversais, permitindo maior mobilidade de servidores.
Para os elaboradores do estudo, é necessária uma revisão dos benefícios concedidos. Hoje, existem 179 tipos de gratificações. Desse total, 105 são carregadas após a aposentadoria.
Com o objetivo de dar mais eficiência à gestão, o banco sugere que, por meio de concurso, seja possível acessar níveis mais elevados de uma carreira. Hoje, todo servidor entra no primeiro nível, o que dificulta a ida de profissionais mais experientes do mercado para o serviço público.
O governo Jair Bolosnaro finaliza um pacote de propostas de reforma administrativa. A maior parte das sugestões feitas pelo Banco Mundial estão em estudo pela equipe econômica e devem compor as medidas do governo.
O estudo apresentado nesta quarta também analisa a situação nos estados, que é ainda mais crítica. Doze entes já estouraram o limite de gastos com pessoal e sete declararam situação de calamidade financeira. Os problemas observados nos estados são semelhantes aos de nível federal. Até 2017, o aumento médio de salário dos servidores estaduais foi de 4% ao ano acima da inflação. O banco aponta o esforço que alguns estados deveriam fazer para retornar os gastos ao patamar autorizado por lei.