À frente de uma das mais ativas entidades ambientais do Estado, a Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan), o biológo Francisco Milanez está assustado com os rumos da política nacional para o ambiente. Milanez, contudo, diz que é possível preservar a Lagoa do Peixe e desenvolver produção primária ecologicamente correta na região. Ele defende a atualização do plano de manejo e a conclusão da regulamentação fundiária para por fim aos conflitos entre ruralistas e ambientalistas. Milanez opina sobre a nomeação da agrônoma Maira Santos de Souza, filha de um dos maiores produtores da região, para a chefia do parque.
— Se não for assim, todos vão perder. Perde sobretudo o planeta, porque estará sob ameaça uma zona importantíssima de migração de aves. Agora, não se pode destruir o parque porque a regularização não foi feita. O interesse econômico vai ao encontro do interesse da preservação.
Confira a entrevista:
Como o senhor recebeu a notícia da nomeção de uma ruralista para a chefia do Parque Nacional da Lagoa do Peixe?
É mais uma péssima notícia. Até agora, não conseguimos ter nenhuma boa notícia: é desrespeito à terra índigena, perdão de multas. O Ministério do Meio Ambiente está sendo administrado pelo agronegócio. Não conheço a moça, pode ser uma boa pessoa, mas não tem experiência nem formação. Como há uma disputa ali e ela representa parte dos interesses contrários ao parque, é muito ruim.
Qual é a importância do parque para os ecossistemas da região e para o fluxo das aves migratórias?
O parque é essencial para o fluxo migratório. É ainda referência internacional, inclusive um dos locais mais procurados por observadores de aves do mundo inteiro. O Rio Grande do Sul tem um dos sistemas lacunares mais preservados do mundo e essa riqueza pode ser explorada com inteligência um dia. Nesse contexto, a Lagoa do Peixe é um dos exemplares mais importantes.
Não é possível conciliar preservação e produção?
Agricultura não, pois acaba com as plantas locais que são base para a fauna. Mas a pecuária, se fosse feita de forma moderna, poderia ser compatível com a preservação do parque. A ovelha criada ali, por exemplo, é comparada às melhores do mundo, da costa francesa, pois a salinidade dá um sabor especial à carne. Uma APA (área de preservação ambiental) que mantivesse uma zona de preservação de aninhamento e pecuária orgânica poderia ser bem interessante.
O parque
- Criado em 1986, está localizado em uma extensa planície costeira arenosa, situada entre a Lagoa dos Patos e o Oceano Atlântico.
- A paisagem é composta por mata de restinga, banhados, campos de dunas, lagoas de água doce e salobra, além de praias e uma área marinha.
- Apesar da denominação, Lagoa do Peixe é, na verdade, uma laguna, por causa da comunicação com o mar. É relativamente rasa, com 60 centímetros de profundidade em média. Tem 35 quilômetros de comprimento e dois quilômetros de largura.
- É um berçário para o desenvolvimento de espécies marinhas, como camarão-rosa, tainha e linguado. Além disso, atrai variadas espécies de aves. Já foram catalogadas 275 espécies, das quais 35 são migratórias.