Em semana decisiva para as pretensões do governo no Congresso Nacional, Jair Bolsonaro oscilou entre ataques e afagos a deputados e senadores. Nos próximos dias, aliados têm nós a desatar dentro e fora do parlamento. Além de tentarem destravar propostas do Executivo, que sucumbem a obstáculos interpostos pelo centrão, terão que acalmar a diminuta base aliada, que vêm protagonizando embates públicos, tendo a convocação de manifestação em apoio ao presidente como pano de fundo.
Após sequência de derrotas na Câmara, a semana passada terminou com um tsunami causado por uma postagem de Bolsonaro em grupos no WhatsApp, compartilhando um texto anônimo que classificava o país como “ingovernável” sem conchavos. Nesta segunda-feira (20), em evento no Rio de Janeiro, voltou a disparar:
— O Brasil é um país maravilhoso, que tem tudo para dar certo. Mas o grande problema é a nossa classe política — disse.
A declaração ampliou o mal estar com caciques do Legislativo, que se diziam atônitos com a falta de “time” do presidente, que precisa do Congresso para aprovar 11 Medidas Provisórias nos próximos dias, entre elas, a que reduziu o número de ministérios de 29 para 22 pastas e que perderá a validade no dia 3 de junho. Na fila, ainda está um projeto que abre crédito extraordinário de R$ 248 bilhões para pagar aposentadorias e benefícios sociais, como o Bolsa Família.
— Nem sabemos como será a votação. Ninguém nos procurou para falar sobre os textos e como estão as negociações — relata o líder de um dos partidos que apoiam informalmente o governo.
Bolsonaro voltou à Brasília à tarde, onde participou do lançamento de nova etapa de campanha publicitária sobre a reforma da Previdência. No evento, adotou tom mais ameno, ao agradecer os presidentes da Câmara e do Senado e destacar que não recebe mais parlamentares no Palácio do Planalto “por falta de agenda”. Ainda assim, apelou ao “patriotismo” para aprovar o texto com “o menor número possível de emendas aprovadas”.
Também na segunda, o relator da proposta na Comissão Especial, Samuel Moreira (PSDB-SP), se reuniu com o ministro da Economia, Paulo Guedes, para tratar de pontos que poderão ser alterados com o aval da pasta. Entre eles, estão as aposentadorias de trabalhadores rurais e professores e do Benefício de Prestação Continuada (BPC).
Durante o final de semana, o líder do governo na Câmara, Major Vitor Hugo (PSL-GO) disse que o Planalto poderia encampar um eventual texto alternativo assinado pelos deputados, recuando em seguida. Ainda assim, o Executivo admite mudanças na proposta, desde que pontos considerados cruciais não sejam alterados, como idade mínima para trabalhadores em geral e a adoção de regras idênticas para os setores privado e público.
— Estamos perseguindo a meta. Se houver concessões, nós vamos tentar buscar no orçamento alguma compensação e recursos — disse Moreira.
Embora Guedes tenha ido ao encontro dos jornalistas, fez apenas um breve pronunciamento e evitou comentar a falta de apoio maciço do governo no Congresso. O ministro também se esquivou das perguntas sobre o mercado financeiro, com o dólar batendo na casa de R$ 4,12, mesmo após intervenção do Banco Central, situação que reflete a incerteza dos investidores quanto à aprovação da reforma.
Além de tentar conter os avanços do centrão, que barganha espaço no governo, aliados do Planalto precisam conter incêndios caseiros, atiçados pela própria base. O líder do PSL na Câmara, Delegado Waldir (GO), faz defesa enfática da agenda do Planalto, mas promete apresentar requerimento para convocar o chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, para sabatina no plenário. Em paralelo, parlamentares eleitos com expressiva votação, na esteira da onda conservadora da última eleição, trocam acusações públicas em redes sociais.
As confusões entre correligionários acenderam a luz de alerta no Planalto. Nos bastidores, a liderança de Vitor Hugo é contestada e sua saída não é descartada. Aliados chegaram a afirmar na segunda que ele poderia sair até o final da semana, enquanto outros garantiam sua permanência. Waldir e a líder do governo no Congresso, Joice Hasselmann (PSL-SP), são alvos do mesmo tipo de especulação.
Apesar dos avanços do centrão e da oposição, responsáveis por derrotas do governo nas últimas semanas, a leitura nos corredores do Legislativo é de que o fogo amigo ainda é o pior inimigo do Planalto.
Manifestações em apoio ao governo opõem aliados
Previstos para o próximo domingo, manifestações em apoio ao governo e a Jair Bolsonaro causam mal estar entre aliados do Planalto. Enquanto um grupo vê a convocação como resposta à série de derrotas do Executivo no Congresso e aos protestos contra cortes na educação na última semana, outro projeta prejuízos às discussões prioritárias no Legislativo, como a reforma da Previdência.
Em postagens em sua conta no Twitter durante o final de semana, a deputada estadual Janaína Paschoal (PSL-SP) afirmou que não teria sentido “quem está no poder convocar manifestações” e pediu para que a ação fosse interrompida. Ao ser atacada nas redes sociais e criticada por correligionários, ameaçou deixar o partido em mensagem ao grupo de WhatsApp da bancada da legenda na Assembleia paulista.
“Amigos, vocês estão sendo cegos. Estou saindo do grupo, vou ver como faço para sair da bancada. Acho que os ajudei na eleição, mas preciso pensar no País. Isso tudo é responsabilidade”.
Em sentido oposto, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) defendeu os atos, compartilhando o texto de um apoiador que afirma que o presidente é vítima de “chantagens e traições”.
Também na Câmara, duas deputadas do PSL trocaram acusações pelas redes sociais. A líder do governo no Congresso, Joice Hasselmann (PSL-SP) foi cobrada pela colega Carla Zambelli (PSL-SP) por não ter publicado nenhum convite para que seus seguidores compareçam aos atos. Ela disse que Joice estaria “casada com o centrão” e, em resposta, foi acusada de nepotismo.
Outro desentendimento ocorreu entre o líder do PSL no Senado, Major Olímpio (SP), favorável às manfestações pró-Bolsonaro, e o deputado Alexandre Frota (PSL-SP), contrário, que pediu ao senador não envolver o partido nos atos.
Líder do Movimento Brasil Livre (MBL), o deputado Kim Kataguiri (DEM-SP), afirmou que o grupo não irá participar das manifestações, devido à defesa do fechamento do Congresso e do Supremo Tribunal Federal, defendida por apoiadores do governo nas redes sociais. O Partido Novo, que apoia integralmente a reforma da Previdência, liberou os filiados para decidirem. No entanto, integrantes da legenda não aprovam as convocações, vistas como mero desagravo a Bolsonaro.
O presidente Jair Bolsonaro considera participar, mas não confirmou presença até o fechamento desta reportagem.