O desembargador Antonio Ivan Athié mandou soltar, na tarde desta segunda-feira (25), o ex-presidente da República Michel Temer. O habeas corpus foi concedido também aos demais presos na Operação Descontaminação, um desdobramento da Operação Lava-Jato, entre eles o ex-ministro e ex-governador do Rio de Janeiro Moreira Franco.
Na decisão que concedeu o hábeas, o desembargador afirma que "não cabe prisão preventiva por fatos antigos" .
"Expeçam-se alvarás de soltura, para imediata libertação dos pacientes, e dos demais que restarem presos pela mesma decisão de 1º grau, e que não impetraram habeas corpus, eis que a eles fica estendida a ordem", afirma na decisão.
Michel Temer foi detido na quinta-feira (21) e se encontra preso na Superintendência da Polícia Federal no Rio de Janeiro. Ele estava em São Paulo no momento da detenção. O Ministério Público Federal alega que o ex-presidente é chefe de uma "organização criminosa".
"Reafirmo, por fim, que sou a favor da operação chamada “Lava-Jato”. Reafirmo também que as investigações, as decisões, enfim tudo que, não só a ela concerne mas a todas sem exceção, devem observar as garantias constitucionais, e as leis, sob pena de não serem legitimadas", disse o desembargador Athié na sua decisão.
Na quinta-feira (21), a defesa de Temer protocolou no Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2) um habeas corpus com pedido de liminar, que foi submetido a Athié. Na ocasião, ele também oficiou o juiz Marcelo Bretas, responsável pela prisão, para que justificasse a decisão do mandado de prisão preventiva.
Bretas respondeu na sexta-feira. Ele manteve a prisão e criticou o documento protocolado pela defesa de Temer:
"Ao que parece, os impetrantes preferiram ajuizar açodadamente um habeas corpus padrão, que não faz referência aos documentos dos autos (que somam quase 5 mil páginas), para tentar uma liminar no calor do momento, sem se preocupar em analisar minimamente a decisão", escreveu Bretas na ocasião. "O ataque dos impetrantes é tão pueril que desmorona à mera leitura da decisão impugnada", completou o juiz.
Além do ex-ministro Moreira Franco, outras sete pessoas foram detidas: o amigo de Temer João Batista Lima Filho (coronel Lima), Maria Fratezi (mulher de coronel Lima), Carlos Alberto Costa e Carlos Alberto Costa Filho (sócios de coronel Lima), Rodrigo Castro Alves Neves (apontado como intermediador de propina), Carlos Jorge Zimmermann (que teria ajudado a fornecer propina), e Vanderlei de Natale, que teria colaborado com coronel Lima nas intermediações. A decisão de Athié vale também para eles.
Em nota, o MDB, partido de Michel Temer, disse que a decisão "reconstituiu a ordem e reconheceu a arbitrariedade" da prisão. Leia na íntegra:
O MDB entende que a decisão de hoje do desembargador Antonio Ivan Athié, do TRF 2 Região, reconstituiu a ordem, reconheceu a arbitrariedade e violação dos procedimentos tomados e restabeleceu as garantias constitucionais ao ex-presidente Michel Temer e ao ex-ministro Moreira Franco. O partido espera que, a partir de agora, o curso das investigações se dê dentro da legalidade, com direito a defesa, até que a verdade seja restabelecida.
A prisão
A prisão do ex-presidente Michel Temer e do ex-ministro Moreira Franco na quinta-feira (21) foi resultado do inquérito envolvendo a Operação Radioatividade, 16ª etapa da Lava-Jato desencadeada em julho de 2015.
A investigação apura contratos firmados por empresas envolvidas na Lava-Jato com a Eletronuclear, subsidiária da Eletrobras, para realizar obras na usina nuclear Angra 3. As suspeitas são de pagamentos de propina a funcionários da estatal e membros do MDB.
No despacho em que justifica a ordem de prisão, Bretas cita o "branqueamento de valores obtidos criminosamente" – que pode ser interpretado como lavagem de dinheiro, que é considerado pela lei como obstrução da Justiça – e recuperação do dinheiro desviado dos cofres públicos pela corrupção.
Temer é apontado como suposto chefe de "uma organização criminosa" que negociou propinas em troca de contratos de obras na usina nuclear. A investigação está calcada nas delações do operador do MDB Lúcio Funaro e do empresário José Antunes Sobrinho, sócio da Engevix, homologadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no ano passado.
Sobrinho disse ter pago propina de R$ 1,1 milhão em 2014, a pedido de João Baptista Lima Filho — o coronel Lima, amigo de Temer — e do então ministro Moreira Franco, com anuência do ex-presidente.
O que disse a defesa de Temer
O advogado do ex-presidente Michel Temer, Eduardo Carnelós, disse na quinta-feira (21), por meio de nota, que a prisão de Temer não tem fundamentos. Segundo o defensor, não existem provas de que ele teria participado do esquema de propinas nas obras da usina nuclear Angra 3, conforme afirma o Ministério Público Federal.
"Resta evidente a total falta de fundamento para a prisão decretada, a qual serve apenas à exibição do ex-presidente como troféu aos que, a pretexto de combater a corrupção, escarnecem das regras básicas inscritas na Constituição da República e na legislação ordinária", diz o comunicado.
Para Carnelós, a prisão está baseada apenas em depoimento de um delator, sem comprovação.
"Os fatos objeto da investigação foram relatados por delator, e remontam ao longínquo 1° semestre de 2014. Dos termos da própria decisão que determinou a prisão, extrai-se a inexistência de nenhum elemento de prova comprobatório da palavra do delator, sendo certo que este próprio nada apresentou que pudesse autorizar a ingerência de Temer naqueles fatos".
O defensor disse que a prisão é um dos "mais graves atentados ao Estado democrático e de direito no Brasil".
Temer havia se recusado a depor à Polícia Federal. O ex-presidente iria depor na sexta-feira (22), mas preferiu ficar em silêncio sob argumento de que não teve acesso às mais de 5 mil páginas dos autos da Operação Descontaminação, desdobramento da Lava-Jato que lhe atribui o papel de líder de organização criminosa há mais de 40 anos.
Mesmo preferindo ficar calado, o ex-presidente pediu ao delegado para consignar no termo da audiência que "não acha conveniente falar neste momento até porque a decisão judicial e a manifestação do Ministério Público Federal o colocaram como chefe de quadrilha, inclusive num período em que não exercia função pública".