As citações religiosas que têm marcado a maior parte dos discursos de posse do ministério montado pelo presidente Jair Bolsonaro ganharam força ainda maior no discurso de posse da ministra das Mulheres e Direitos Humanos, Damares Alves.
Aplaudida repetidamente por centenas de assessores e convidados, com frequentes comentários de "aleluia" e "graças a Deus", Damares, que é evangélica, chorou em diversos momentos de seu discurso, afirmou que foi perseguida pela imprensa por conta de sua fé e disse que sua filha adotiva, de origem indígena, não esteve presente na cerimônia por razões de segurança.
— Queriam nos matar. Minha filha foi ameaçada, junto com a mãe — disse Damares.
— Por recomendação, minha filha não está em Brasília. Deve estar de longe, assistindo à mãe.
Em uma fala de mais de 45 minutos, a ministra declarou que vai governar com "princípios cristãos", sempre priorizando a família.
— O Estado é laico, mas essa ministra é terrivelmente cristã — disse Damares.
— Acredito nos desígnio de Deus e propósitos de Deus.
A ministra também disse que vai lutar contra a "doutrinação ideológica", apesar de não ter detalhado o que esta seria.
— Vamos acabar com o abuso da doutrinação ideológica de crianças e adolescentes no Brasil. A revolução está apenas começando.
Ao anunciar seu secretariado, Damares disse que toda pasta vai aprender a linguagem de Libras em seis meses e que o ministério será marcado pela inclusão social. Sobre informações de que a área de questões ligadas à comunidade LGBT seria reduzida, Damares negou.
— A comunidade LGBT continua com a estrutura que tinha no ministério anterior. Vamos lutar pelo combate a todos os tipos de preconceitos e violência nessa nação, inclusive LGBTI — disse.
Damares reafirmou que o governo vai focar políticas públicas "que priorizem a vida desde a concepção", ou seja, desde a fecundação do óvulo, deixando clara a sua posição contra o aborto.
— No que depender do governo, sangue inocente não será derramado neste País. Esse é o ministério da vida — afirmou.
A ministra criticou ainda a violência contra as mulheres e defendeu tratamento igualitário.
— Somos o quinto país do mundo em feminicídio, que vergonha! Chega de violência, basta. Chega de violência contra a mulher nesta nação.
Sem citar detalhes, Damares afirmou que há necessidade de se rever a política atualmente aplicada pelo processo do Enem, que implica em estudantes se matricularem em faculdades que, por vezes, ficam localizadas fora de seus Estados.
— Muitos sofrem por tristeza, dor, depressão, por saudade, porque o filho se muda por causa do Enem. Parabéns ao Enem, mas nós não podemos mais pensar política pública que não fortaleça o vinculo familiar — disse.
Damares chamou a atenção ainda para a violência sexual contra crianças e adolescentes e disse que o governo vai ser "implacável" contra pedófilos e o turismo sexual no País.
— Atenção, pedófilos de plantão. Atenção, senhores, a brincadeira acabou no Brasil. Seremos implacáveis com abusadores — disse.
A ministra voltou a criticar práticas que ela classifica como infanticídio indígena e disse que as mães indígenas clamam por socorro.
— Nosso silêncio soa como hipocrisia do branco dominante. As mulheres indígenas estão pedindo socorro no Brasil — disse.
No fim de seu discurso, Damares lembrou que foi violentada quando era criança e a ocasião em que declarou ter visto Jesus Cristo em um pé de goiaba. Disse ter apanhado da polícia, em várias ocasiões, para defender meninos de rua. A ministra criticou a imprensa.
— Minha crença virou chacota. O abuso que sofri, algo íntimo, virou manchete de jornal. Não tenho orgulho nenhum em ter sido abusada, isso não é orgulho algum. Não fui respeitada como brasileira — comentou.
— Chorei, mas tenho meu consolador. E queiram vocês ou não, ele sobe num pé de goiaba — disse, aos prantos, sendo aplaudida de pé pelos presentes.
Damares prometeu ainda a regulamentação da Lei Brasileira de Inclusão nos próximos meses.
— Foi determinado por Bolsonaro. Será uma legislação que garanta acessibilidade em todos os níveis.
Após o fim do discurso, Damares recebia os cumprimentos no palco, mas deixou a cerimônia quando muita gente ainda aguardava para falar com ela. Um porta-voz declarou no microfone que, "por razões de segurança", Damares teve de deixar o local.