A Polícia Federal vê "responsabilidade criminal" do ex-diretor da Dersa (Desenvolvimento Rodoviário S/A) e ex-secretário de Logística e Transportes do governo Alckmin em São Paulo, Laurence Casagrande em supostas fraudes nas obras do Trecho Norte do Rodoanel. Um relatório de 113 páginas, subscrito pelo delegado João Luiz Moraes Rosa, da Delegacia de Repressão à Corrupção e Crimes Financeiros da PF em São Paulo, aponta suposto envolvimento de Laurence em desvios e sobrepreços de até R$ 131 milhões no empreendimento.
O ex-secretário foi preso nesta quinta-feira (21), no âmbito da Operação Pedra no Caminho, braço da Lava-Jato em São Paulo. A investigação mira desvios em contratos do Rodoanel Trecho Norte, cujas obras foram iniciadas em 2013, quando Lourenço era presidente da Dersa.
Atualmente, Lourenço é o presidente da Companhia Energética de São Paulo. Ele foi secretário de Secretaria de Logística e Transportes entre maio de 2017 e abril de 2018, e chegou a presidir a Dersa — sociedade de economia mista responsável por administrar rodovias estaduais em São Paulo — entre janeiro de 2011 e maio de 2017. Também passou pela Fundação Casa e a Secretaria de Segurança Pública.
A PF atribui a Laurence papel central no "núcleo administrativo" do grupo que teria ligação com as irregularidades. A Justiça Federal decretou a prisão de 15 suspeitos, entre eles Laurence.
A reportagem está tentando contato com a defesa de Laurence. O espaço está aberto para manifestação.
O documento da PF diz que um engenheiro responsável pelo gerenciamento das obras do Trecho Norte, Emílio Urbano Squarcina, "vinculou os aditivos contratuais ao alto porcentual de desconto oferecido pelas empreiteiras, quando da celebração dos contratos, em relação ao valor do edital, cerca de 30 a 35%".
Segundo Emílio Squarcina, as empresas tiveram dificuldades para executar a obra pelo preço proposto, razão pela qual surgiram os aditivos. "As tratativas iniciais teriam partido dos diretores da empresa OAS S/A, Carlos Henrique e João Muniza, os quais negociavam diretamente com Laurence Casagrande, então diretor-presidente da Dersa, e Pedro Silva, diretor de Engenharia do órgão", diz a Polícia Federal.
As irregularidades, de acordo com Squarcina, "consistiam na alegação de suposta dificuldade, maior do que a inicialmente prevista, para a remoção de solo".
Ele destacou que, como a obra se desenvolve em trechos da Serra da Cantareira, há necessidade de remoção de material de 1ª categoria (terra), 2ª categoria (alteração) e 3ª categoria (rocha sã ou granito).
"Contudo, a presença desses materiais já estaria prevista no projeto do contrato, baseado em estudos do IPT - Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo, que estuda a Serra da Cantareira desde 1960", assinala o relatório da PF. Por isso, Emílio recusara-se a demandar o aditamento dos contratos, atitude que teria sido acompanhada pelo engenheiro Hélio, fiscal do Lote 5 da obra", segue o documento da PF.
"Por fim, Emílio disse que o procedimento de aditamento com base em tal justificativa, inicialmente aplicado aos contratos celebrados com a empreiteira OAS S/A, foi estendido aos demais lotes."
O que diz a defesa de Laurence Casagrande Lourenço
O criminalista Eduardo Carnelós, que defende o ex-secretário de Logística e Transportes Laurence Casagrande Lourenço, disse que a prisão do seu cliente é "injusta e ilegal".
— Por que o sr. Laurence não foi ouvido antes? Tem cabimento prender antes de ser ouvido? Ele teria prestado todos os esclarecimentos. Depois, eles poderiam confirmar ou não as informações dadas por ele. Hoje, em seu depoimento, o sr. Laurence respondeu a tudo o que lhe foi perguntado e que era de seu conhecimento, apesar de ter sido surpreendido com a prisão ilegal, injusta, desnecessária, desumana, sem que lhe tivesse sido permitido conhecer os autos antes — afirmou Carnelós.
De acordo com a defesa, Laurence é um "profissional exemplar", com uma vida patrimonial "absolutamente correta".
— É uma pessoa metódica, foi auditor da Kroll. Em seu depoimento na Polícia Federal nesta quinta-feira ele respondeu a todas as questões que lhe foram feitas pela Polícia Federal. E entregou documentos que demonstram não ter havido ilegalidade em seus atos — declarou.
Sobre as denúncias de desvios de verbas públicas nas obras do Rodoanel, Carnelós afirmou que "tudo que se refere ao Rodoanel tem que passar pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), que deve manifestar a sua não objeção".
— Tudo sempre foi realizado de acordo com as regras internacionais, as regras de contratação. De modo que quando há desentendimento entre as partes, o contratante pode fixar preço a título precário, porque as medições são provisórias. Só é definitivo no encerramento do contrato para não interromper a obra. As empreiteiras estavam ameaçando paralisar as obras, criou-se um impasse, por isso houve um momento em que se decidiu fazer aditamento. Isso tudo com o aval do BID, obrigatório passar pelo BID antes, e decidido pelo Conselho de Administração da Dersa — disse Carnelós.
Contraponto
"A Dersa - Desenvolvimento Rodoviário S/A e o Governo de São Paulo são os maiores interessados acerca do andamento do processo. Havendo qualquer eventual prejuízo ao erário público, o Estado adotará as medidas cabíveis, como já agiu em outras ocasiões", disse a empresa por meio de nota.
Também por meio de nota, a OAS informa que "agentes da Polícia Federal estiveram nesta manhã na sede da OAS em São Paulo, numa operação de busca e apreensão de documentos relativos a obras do Rodoanel paulista, das quais é responsável pelos Lotes 2 e 3 do trecho Norte. Um ex-executivo da empresa que esteve à frente do projeto - fora dos quadros da companhia desde 2016 - também teve prisão temporária decretada."